Tornar-se mãe e mudar de país: sempre em adaptação
Eu sempre tive uma certa dificuldade com mudanças. Quando era mais nova não imaginava um dia morar fora do Brasil sequer por um curto período, quem diria sem data para voltar? Ao fazer uma temporada em Londres e em Dublin (que durou mais de 2,5 anos) precisei sair um pouco da zona de conforto com a qual estava habituada, mas sempre tinha a certeza do retorno ao meu lar.
Ao fazer uma viagem ao Uruguai no início de 2012 o senhor cupido resolveu colocar um lindo italiano (que morava na Alemanha) no meu caminho. Logo eu, que nunca fui muito fã de grandes transformações, arranjei um amor à distância e um futuro incerto. Eis que no fim do ano, depois de muitos encontros e despedidas, veio a mudança para a Alemanha.
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Tive muito apoio da minha família para tomar essa decisão, se isso ia me fazer feliz. Eu sabia que a qualquer momento poderia voltar atrás. Minha mãe na época me falou: “Filha, vá, mas vá por você, e não por ele”. Demorei para entender essas sábias palavras, mas aos poucos compreendi que para dar esse passo de mudar de país e radicalmente de vida, tem que realmente partir de dentro, de uma vontade própria, pois caso algo não dê certo você nunca acabe por culpar o outro por ter tomado essa decisão por você. E assim fui. Foram 5 anos de Alemanha, de aprender 2 novas línguas e culturas (alemão e italiano, para me comunicar com a família), um novo rumo de carreira, novos amigos, casamento, e por fim, uma filha.
Mais uma mudança: Itália
Foi durante a gravidez que veio a proposta da empresa do meu marido de nos mudarmos no início de 2018 para a Itália. Aquilo de cara nos animou. O momento me parecia perfeito, já que eu estaria em licença-maternidade e com um bebê ocupando grande parte do meu tempo, enquanto eu pensaria em reconhecimento de diploma e afins. Já tendo passado por tantas mudanças de país me senti segura para aceitar mais essa aventura. E eu sabia que para o meu marido era um sonho voltar para a Itália, para perto de sua família. Claro que a fala da minha mãe voltou à minha cabeça: estaria eu fazendo isso por mim mesmo? Mas ao se tornar mãe você não faz uma escolha dessas só por você. Eu escolhi pensando na minha família, especialmente naquele bebê que estava por chegar: não seria muito melhor poder crescer perto de pelo menos uma das famílias?
Do nascimento da O. em outubro até a mudança definitiva no fim de janeiro eu mal vi o tempo passar. A maior mudança da minha vida tinha acontecido e eu estava imersa nesta nova jornada. Tornar-me mãe está sendo sem dúvida o maior desafio de adaptação até hoje (aqui falei sobre o puerpério longe da família). A O. chegou para me mostrar todos os dias que nem sempre a rotina vai funcionar e que nem tudo é possível planejar.
Em julho completamos 6 meses de Itália e 9 meses de O. e me sinto em constante adaptação. Apesar de ter vindo falando a língua e já com bastante contato com a cultura, não acho que isso tenha tornado os meses iniciais aqui mais fáceis. Afinal, essa é a primeira vez que imigrei no meu mais novo papel: virei mamãe. Talvez tenha sido mudança demais para uma resistente!
A adaptação: uma extero-gestação
Laura Gutman em seu livro “A maternidade e o encontro com a própria sombra” diz:
“O bebê humano nasce prematuramente em relação aos demais mamíferos. Podemos considerar que são nove meses de gestação intrauterina e depois nove meses de gestação extrauterina. Quer dizer, quando o bebê chegar aos 9 meses de idade, tem um desenvolvimento semelhante ao de outros mamíferos poucos dias depois do nascimento (possibilidade de locomoção, por exemplo).”
Pensando nisso e nos meus últimos 9 meses de vida como mãe e na nossa mudança, não pude deixar de refletir sobre esse tempo como uma analogia à gravidez.
O primeiro trimestre:
Tanto a gravidez quanto o primeiro trimestre do bebê podem ser vistos da mesma forma, é um período de um turbilhão de emoções: uma grande alegria de estar gerando/ganhando um filho, mas ao mesmo tempo muito medo e certa incerteza do que está por vir, se está correndo tudo bem. É um momento de introspecção e cuidados, além de muitos planos.
Os primeiros 3 meses vida da O. também coincidiram com a preparação para a mudança para a Itália, ou seja, uma grande alegria de poder ir para perto da família, mas muito medo e incerteza do que estava por vir. E estando no pós-parto e com um bebezinho totalmente dependente, não rolaram festas de despedidas ou um grande alvoroço, uma grande transição estava por acontecer, mas a preparação acontecia só entre família.
O segundo trimestre:
Na gravidez foi aquele momento em que estava me sentindo bem, a barriga começando a aparecer, o apetite voltando a mil, uma grande disposição para fazer muitas coisas. Comecei a fazer ioga para gestantes, natação, socializar com outras grávidas, ou seja, criar uma rede. Na vida de um bebê e uma mãe este período também é de mais abertura para o mundo, de mais desprendimento, as coisas estão fluindo melhor.
No nosso caso, porém, esse período aconteceu em meio ao caos da mudança. De repente estávamos nós três em um apartamento cheio de caixas e em uma cidade que eu pouco conhecia: era claro finalmente que estávamos em um novo país e começando uma nova etapa, era preciso muita disposição para arrumar tudo. Mas acho que foi um certo baque perceber que aquela era a minha nova vida, onde não conhecia ninguém e nem sabia direito o caminho para o supermercado mais próximo. Precisava formar minha rede, encontrar grupos de mães, que na Alemanha eram tão difundidos, e me deparei com Il Melograno – Centro Informazione Maternità e Nascita, que oferece vários tipos de cursos e encontros relacionados à maternidade e nascimento. Inscrevi-me no curso de massagem para bebês, participei de encontros para puérperas e comecei a me entrosar com outras mamães. Para mim essa foi sem dúvida a melhor maneira de começar a me sentir mais parte deste novo ambiente e desta nova vida.
O terceiro trimestre:
Na gravidez é quando a mulher já começa a se sentir mais cansada, o ritmo diminui e a ansiedade para a chegada do rebento cresce, assim como a preparação para recebê-lo se intensifica. O bebê de 6-9 meses e a mãe nesta altura também se preparam para serem capazes de se separar, quando o pequeno começa a se locomover mais livremente sem ajuda, o que é ao mesmo tempo prazeroso e assustador. Como mamãe certamente me sinto mais cansada com uma bebê que se arrasta pela casa toda, se levanta, além da angústia da separação estar no auge, fazendo dela um grudinho. Mas me sinto mais à vontade no papel de mãe, mesmo me julgando muitas vezes um fracasso (quem nunca?).
Quanto à aclimatação ao novo lar, já consigo me locomover bem e sei onde achar o que preciso, já fiz alguns amigos, além de me sentir mais confiante. No texto de junho de Luciana Reis Carpanez ela compara de forma muito poética a imigração à lagarta que vira pupa, que vira borboleta. Estou ansiosamente buscando meu momento de virar borboleta nesses novos papéis, mas por enquanto lidando com as transformações que a vida me proporcionou.
O que me faz acreditar que foi a melhor escolha? A alegria de ver minha pequena crescendo perto de uma família. É uma verdadeira satisfação vê-la sorrir com entusiasmo e esticar os bracinhos quando vê os familiares.
4 Comentários
Oi Amanda! Li hoje sua postagem! Obrigada por compartilhar a sua experiência! Me identifiquei muito, pois estou na mesma situação.. bebê a caminho, mudança de país antes (Brasil-Londres) e durante a gravidez (Londres-Bruxelas) e outra mudança de país prevista para em seguida que a bebê nascer (Bruxelas-Espanha ou Portugal).. como lidar com tantas mudanças, adaptações e transformações , sendo que a mais desafiante delas é tornar-se “mãe”! Desejo muita saúde e luz para vocês e muita coragem e amor para enfrentar todos os desafios! Abraços, Gitana!
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