Ser feminista é para mim?
Há uns três anos, comecei a ouvir muito sobre empoderamento feminino, luta pela igualdade, feminismo, carga mental e muitos outros termos semelhantes. Eu, até então, tocava minha vida, tentando trabalhar, ganhar o meu dinheiro, criar meus filhos. Era casada, tinha minha família e isso me bastava.
Em momentos do dia ou em certas fases da vida algumas coisas me incomodavam, como: ter que lidar com toda a gestão da casa, com os afazeres domésticos, ser responsável pelos deveres da escola das crianças, passar noites em claro sozinha com o filho doente e ouvir que a maior renda da casa era do meu marido e, por isso, ele não poderia faltar para ficar com as crianças.
Durante muito tempo chorei sozinha e quieta quando nas infinitas discussões sobre a minha carga mental, o machismo dele falava mais alto e eu pensava estar certo. Comecei a me perguntar se eu teria contribuído com isso de alguma forma. Conforme fui ouvindo e lendo, percebi que o preconceito e o machismo estavam dentro de mim também e muito enraizados. Aos poucos fui me dando conta que muitas das crenças e valores que eu acreditava poderiam ser olhadas por outro ângulo.
Enquanto psicóloga, atendia muitas mulheres e ouvia muitas queixas parecidas e um sofrimento que era comum entre cada uma delas e a minha história de vida também.
O cansaço, a falta de ânimo depois de algum tempo de casamento, brigas por colaboração, maridos que se transformavam em filhos, pouca divisão de tarefas, culpa por tentar ser quem elas de fato queriam ser, mulheres que abriam mão de seus sonhos e do seu espaço, perda da autoconfiança e muito mais. Tudo isso em nome do amor, da família ou do relacionamento.
Quando o incômodo apareceu
Quando me mudei para os EUA ampliei não só meus horizontes, mas também a minha visão de mundo. Lá o que mais me saltou aos olhos foi ver que existia a tal divisão de tarefas e uma harmonia em partilhar a vida. Homens saindo com seus filhos sozinhos, trocando fralda, olhando e brincando com crianças no parque era algo muito comum. E as mulheres em rodas de amigas à noite nos bares, sentadas conversando e se divertindo como lhes era de direito.
Estou contando aqui o meu recorte da história, pois como essa era a minha dor, meus olhos ficaram aguçados para aquele novo mundo e maneira de viver que se descortinava na minha frente. Sei que pode não ser o seu caso e pode ser uma tremenda bobeira o que eu estou falando para você. E que você pode até já viver isso dentro do seu lar, mas ainda assim acredito que existe por aí um grande número de mulheres que se sentem dessa forma.

arquivo pessoal
Você se sente assim ou não?
Aos poucos todo aquele papo de feminismo começou a soar de uma maneira diferente nos meus ouvidos. Enquanto me envolvia com o tema ia fazendo pequenos ajustes na minha vida e na minha rotina.
Eu conscientemente usei o fato de que não sabia falar inglês para ficar em uma zona de conforto e passar para ele todas as responsabilidades que antes eram minhas. A partir daquele momento ele ia nas reuniões da escola, fazia lições, levava ao médico, marcava encontros com os amiguinhos de classe, participava dos grupos de Whatsapp das mães e precisava ser o meu intérprete para as reuniões sociais.
Enquanto isso ia acontecendo, eu ia experimentando um novo lugar para mim e descobria que a vida poderia ser mais leve e com tempo para mim. Me cuidar, assistir televisão, estudar, fazer exercício, dormir no meio da tarde entre outras coisas, começaram a fazer parte da minha rotina.
Percebia que era possível e que por trás de todas as desculpas que eu colocava, dizendo que seria impossível realizar tal mudança, eu agora sabia que não era. Bastou mudar o meu olhar, ampliar os meus horizontes, sair do lugar de conforto e dar voz ao que eu sentia que aos poucos tudo foi se modificando.
O que é o feminismo?
Segundo o dicionário, feminismo é um conjunto de movimentos políticos, sociais, ideologias e filosofias que têm como objetivo comum: direitos equânimes (iguais) e uma vivência humana por meio do empoderamento feminino e da libertação de padrões patriarcais, baseados em normas de gênero.
Ao meu ver, hoje, é a possibilidade de a mulher poder ocupar um lugar que já era dela e que foi tirado. É uma luta por direitos iguais entre homens e mulheres, ou seja, direitos iguais para qualquer pessoa. O movimento feminista quer nos ajudar a se libertar de padrões patriarcais e arcaicos que fizeram parte de um outro momento histórico. Estamos em 2020 e ainda nos comportamos como se estivéssemos na década de 1930.
Infelizmente tem ainda muitos equívocos e muita gente que, assim como eu, estão desinformadas e partem de uma ideia pré-formada sobre o assunto. Muitas mulheres ainda não sabem do que se trata e acreditam que é uma briga entre homens e mulheres para ver quem ganha ou quem está certo.
Você concorda? Acha que o machismo está dentro de nós?
Eu só sei que depois que eu consegui abrir meus olhos para ocupar um outro lugar, entender que posso e tenho direitos como outro qualquer ser humano e que não preciso me sentir culpada porque quero fazer de um jeito diferente, tudo mudou.
Mudou tanto que mudei totalmente o foco do meu trabalho para ajudar mulheres a olharem quais os traumas e raízes que essa cultura patriarcal coloca que a impedem de olhar de fato para a sua verdadeira essência. Eu quero que muitas mulheres, assim como eu, possam ter a liberdade de tomarem decisões baseadas na sua vontade e sem interferências de padrões pré-estabelecidos.
E você, vem comigo?