A difícil missão de voltar a trabalhar.
Ser mãe tem sido a melhor e mais abençoada tarefa que a vida me concedeu até hoje. Justamente por isso, é tão difícil mudar a minha rotina e voltar ao trabalho. Justo eu que sempre me preocupei com a minha carreira, hoje, tendo em vista a realidade da sociedade americana, me pego pensando se talvez não fosse melhor ficar em casa cuidando do meu pequeno. Esse dilema fez e ainda faz parte da realidade de muitas mamães que moram nos EUA e, comigo, não foi diferente.
Independente do país em que você more, todas nós mamães concordamos com uma coisa: a maternidade traz consigo novos desafios e uma rotina completamente diferente. Noites mal dormidas, horário certo para sair e voltar de casa e planejamento das atividades diárias para que o seu bebê tenha horários específicos para mamar, dormir e brincar são apenas alguns dos tópicos que passam a fazer parte do nosso dia a dia. Pra mim, entre os pensamentos “será que ele mamou o suficiente” e “caramba, que sono!”, o maior desafio até agora tem sido encontrar a resposta para o dilema “volto a trabalhar ou fico em casa com ele?”
Obviamente, não morar no Brasil faz muita diferença durante esse processo e não é preciso pensar muito para entender o porquê. Meus pais sempre trabalharam full-time e enquanto isso, meu irmão e eu ficávamos com a minha avó materna.
Em alguns momentos, lembro que meus pais contaram com a ajuda de algumas babás, mas a maior parte dos anos 90 nós passamos mesmo na casa da nossa avó, comendo bolinho de chuva, balançando na rede e brincando com os gatinhos que ela tinha. E essa foi também a realidade de muitos dos meus amigos.
Como moro hoje nos EUA, a opção de “deixar na casa da avó” não existe (mas acho que se morássemos no Brasil, meus pais pediriam demissão só pra ficar cuidando do netinho). Além disso, a família do meu marido não mora na mesma cidade que a nossa, o que limita ainda mais as nossas opções para childcare.
Sei, porém, que compartilho este dilema com praticamente todas as mamães que também não moram no Brasil (e até mesmo mamães que estão no Brasil) e que isso é só mais uma das inúmeras decisões que a maternidade traz. A principal razão pela qual decidi escrever sobre este tema é por que tenho aprendido muito sobre a cultura americana e acho importante compartilhar este aprendizado aqui.
Licença-maternidade no EUA
Apesar da qualidade de vida que se tem nos EUA, o país ainda há muito o que se desenvolver em termos de direitos trabalhistas. Por exemplo, a licença-maternidade americana é regulada pelo chamado Family and Medical Leave Act 1993 (FMLA) – (Família e Licença Médica, Ato 1993) – que garante 12 semanas de licença maternidade por ano não pagas para mães de recém-nascidos ou crianças adotadas.
Você leu certo: o empregador não é obrigado pela lei trabalhista a continuar pagando a mãe que sai de licença-maternidade. As empresas são obrigadas, porém, a garantirem que, após 12 semanas, a mãe terá o mesmo trabalho de volta.
Vale lembrar que, de acordo com a FMLA, a mãe precisa cumprir alguns pré-requisitos para ter direito às 12 semanas de licença-maternidade, como por exemplo estar trabalhando na empresa por mais de 12 meses e ter acumulado mais de 1.250 horas de trabalho.
Além disso, é preciso que a empresa tenha mais de 50 funcionários. Dentre os países que fazem parte da OCDE (Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento), os EUA é o único que ainda não possui uma lei que garante a licença-maternidade paga.
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A intenção da FMLA é oferecer à mãe a oportunidade de se recuperar do processo de nascimento e, ao mesmo tempo, facilitar a conexão entre a nova mamãe e o seu bebê. Porém, sejamos sinceras: 12 semanas estão longe (muito longe) de serem suficientes. Os dias com um recém-nascido em casa voam e quando você menos percebe, os 3 meses terminam e você ainda está tentando se adaptar à sua nova rotina e, ao mesmo tempo, organizar a rotina do seu bebê.
Já o fato de a lei não garantir licença maternidade paga dispensa qualquer comentário e mostra que, apesar de todo o desenvolvimento americano, ainda existe um longo caminho a ser percorrido pelo país para que, de fato, o balanço saudável entre vida profissional e pessoal seja oferecido.
Felizmente, existem exceções à regra e apesar de a lei federal não garantir licença-maternidade paga, algumas empresas optam por oferecer políticas mais generosas como parte de seus benefícios, como por exemplo, 12 semanas de licença-maternidade pagas. O valor pago à mãe varia e pode não ser exatamente o correspondente a 100% do seu salário. Califórnia, New Jersey, New York e Rhode Island são estados que garantem à mãe o direito de continuar recebendo durante a licença-maternidade.
Voltar ao trabalho ou ficar em casa?
Passada a licença-maternidade, é hora de voltar à trabalhar. Sem dúvidas, esta é uma decisão difícil para todas as mamães, independentes do país em que moram. Confiar os cuidados do seu bebê à uma outra pessoa é um desafio enorme e um processo que pode se tornar emocionalmente desgastante. Aqui nos EUA, além do desafio emocional, o fator financeiro também pesa muito nesta decisão: os custos associados ao childcare não são baratos e, por isso, muitas mães decidem não voltar ao trabalho.
Os custos de uma nanny (babá) ou daycare (creche) variam de acordo com cada cidade. Para exemplificar, citarei a realidade de Chicago: por aqui paga-se uma média de $15 dólares por hora para uma nanny que, ao final do mês, recebe cerca de $2400 dólares por 40h de trabalhos semanais ($15 x 40 x 4). Já as daycares possuem políticas diferentes.
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Alguns lugares oferecem programas específicos onde a criança precisa, necessariamente, estar presente os 5 dias da semana (segunda à sexta). Outros, são mais flexíveis e fica à critério dos pais escolher a quantidade de dias. Em Chicago, dependendo do setor, o valor de uma daycare para 5 dias na semana pode chegar à $2100 dólares. Carinho, né? Vale lembrar ainda que algumas creches possuem listas de esperas, ou seja, as crianças não são aceitas imediatamente.
Dá pra ver como fator financeiro acaba pesando na decisão de muitas famílias? Muitas vezes, financeiramente e emocionalmente falando, é bem mais viável que um dos pais fique em casa para cuidar dos filhos. Como mencionei anteriormente, a decisão de voltar ou não a trabalhar não é fácil e o desafio se torna ainda maior para as famílias que, por não morarem no Brasil, não possuem outra opção de childcare que não sejam pagas (nannies ou daycares). Obviamente, a decisão fica a critério de cada família, mas tendo em vista a realidade dos EUA, é sem dúvida um dilema para muitas mamães.