Sistema de saúde italiano: a burocracia que te respeita
Já comentei em textos anteriores que eu e meu marido somos advogados e trabalhamos com assessoria para obter cidadania italiana diretamente na Itália. Então, hoje a minha passagem aqui pelo Mães Mundo Afora vai ser um pouquinho diferente. Não vou contar mais um caso nosso, como de costume. Ao invés disso gostaria de passar para vocês um breve, mas interessantíssimo, relato de uma cliente brasileira que esteve de quarentena conosco durante a pandemia do Covid-19 na Itália.
A história da Marcella
Há algumas semanas, em meio à pandemia de Covid-19, obtive o meu tão esperado reconhecimento da cidadania italiana por origem. Meu bisavô nasceu em Sassari, na Sardegna, e emigrou para o Brasil, assim como milhares de outros, em busca de uma vida mais justa e melhor para sua família. Foi no Brasil que teve seus filhos e viveu a maior parte de sua vida.
Hoje eu, com 28 anos, busco a mesma coisa que meu bisavô, porém, no caminho contrário.
Passaram-se mais de 100 anos de sua imigração para o Brasil. Muitas coisas mudaram. O mundo viu duas grandes guerras, a Europa mudou, o Brasil mudou. Hoje, o ciclo da economia e geopolítica me levam à percepção de que o melhor caminho para mim, talvez, seja fora do Brasil, lugar onde nasci e que amo. A decisão não é fácil, mas segui firme e em frente, em busca desse objetivo.
Por isso, juntei as certidões de minha família e fiz o que tinha que ser feito para buscar o meu direito ao reconhecimento à cidadania. Por indicação de uma amiga, contratei os serviços da Famiglia Buzzi – Cidadania Italiana Familiar para cuidar da burocracia e infraestrutura necessária para que meu objetivo fosse alcançado. Tudo correu da melhor maneira possível.
Eis que, no meio do processo, veio essa pandemia. Eu aqui na Itália, centro da atenção do mundo, me vi a ter que refazer ou aguardar o tempo correto para concluir meus planos, uma vez que me encontrava, agora, na quarentena emergencial. Mundo parado.
O trabalho interno dos órgãos competentes, todavia, não cessou. E, para minha feliz surpresa, em 10/04 (pedido protocolado em meados de fevereiro) recebi a notícia de que o processo estava concluído com êxito positivo. A partir de então eu era cidadã italiana!
Como falei, precisei rever meus planos, pois me encontrava no meio da quarentena emergencial. Algumas coisas que não estavam planejadas precisaram ser ajustadas. Uma delas envolvia uma questão logística de remédios que preciso tomar para controlar a minha diabetes. Vim com um estoque seguro de insulina para não ter nenhum problema.
Passado o tempo, me vi na necessidade de buscar mais do medicamento. E agora? Como proceder num país novo em meio a uma crise emergencial justamente na área de saúde? Estávamos (ainda estamos) com limitações de atendimento em órgãos públicos, regras de convivência social, horários diferentes, muitos detalhes para que tudo desse errado, certo? Errado!
No horário permitido (num sábado), nos dirigimos (eu e o Sergio Buzzi) ao centro de atendimento da saúde para fazer meu cadastro no Servizio Sanitario Nazionale (algo tipo o SUS). Deixamos toda minha documentação com a simpática atendente que precisaria verificar, junto ao comune (prefeitura), meus novos cadastros de cidadã italiana.
Conforme prometido, na manhã de segunda-feira a mesma atendente ligou para o Sergio confirmando a minha inscrição e prontamente enviou todos os documentos via e-mail. Isso porque o contato e atendimento pessoal estava ainda sendo evitado ao máximo.
Já em posse dos documentos (carteira sanitária) de saúde, entramos em contato com a clínica que faria o meu atendimento específico (diabetes) para agendar uma consulta a fim de que o médico pudesse prescrever a receita para a insulina necessária. Tudo foi resolvido em poucas horas, via telefone e e-mail. A Tatiana Buzzi ligou para a clínica para sabermos como se daria o atendimento, uma vez que estamos em período de restrições. A secretária da clínica pediu para enviar os documentos e todas as informações relevantes à minha diabetes por email. Feito isso, em poucas horas recebemos uma resposta da clínica já com a receita para retirar o medicamento em qualquer farmácia, livre de qualquer custo. Todo cidadão italiano e residente legal no país tem direito a receber esse tipo de remédio gratuitamente.
Foi aí que a ficha caiu! Nesse momento que eu me senti respeitada como cidadã de um país que me acolheu de forma justa e correta. Em nenhum momento recebi tratamento diferente. Sou cidadã italiana, nascida no Brasil. Tenho os mesmos direitos e deveres de qualquer outro cidadão.
A humanidade do sistema de saúde italiano
A minha intenção em divulgar esse relato é mostrar que apesar de existir, sim, burocracias no sistema de saúde italiano, ele é ainda um sistema amigável, de atendimento humanizado, que não irá te deixar na mão. Gostaria de acrescentar ainda que já vi espalhado em diversos hospitais por aqui que mesmo quem não é cidadão tem direito a atendimento médico, não importando a situação legal no país. O juramento médico e o respeito ao ser humano prevalece.
Hoje a história foi da Marcella, ítalo-brasileira de 28 anos, que veio em busca de um sonho. Mas tenho uma minha, brasileira de 40 anos, a qual já comentei por aqui, de quando com cinco meses de “vida nova” com a família na Itália, fiquei internada por 5 dias e tive que operar. Vocês querem que eu conte?!
1 Comentário
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