O Sistema de saúde no Canadá
Em tempos de Coronavírus, nada mais justo que dedicarmos um post a um tema que sempre preocupa os imigrantes, que é o sistema de saúde do país para o qual planejam mudar-se. Vale lembrar que, em resumo, se você é um cidadão canadense, residente permanente e imigrante você tem direito ao OHIP (explico o que é isso adiante).
Se você possui visto de estudante você não tem direito ao OHIP. Se você tem visto de trabalho você só terá direito ao OHIP se você tiver um emprego full-time de no mínimo três meses, com um contrato de pelo menos seis meses (caso este emprego seja temporário) e estar fisicamente presente em Ontário por um determinado número de dias por ano. Turistas e visitantes não possuem direito a usar o sistema de saúde daqui gratuitamente.
Características do sistema de saúde
Antes de mais nada, acho interessante que vocês saibam de algumas características do sistema de saúde canadense – lembrando que moramos em Toronto, na província de Ontário, e é sobre aqui que vou escrever, uma vez que cada província possui seu próprio sistema, organização e condições de uso. O sistema de saúde canadense foi construído em torno do princípio de equidade, no qual todos os cidadãos recebem os serviços médicos e hospitalares necessários (universalidade) e são atendidos igualmente (equidade).
Você sabia que esse princípio é o mesmo que norteia a ideia do SUS, o sistema de saúde do Brasil? E, na prática, aqui é exatamente dessa forma que ele funciona. Não perguntam quanto você tem em sua conta bancária, não interessa se você nasceu aqui ou em qualquer outro país, saiba que você será atendido igualmente, sem distinções.
Saúde é algo levado tão a sério por aqui que um dos primeiros documentos que um recém nascido recebe é a sua carteirinha de uso do sistema de saúde local. OHIP é o plano de saúde da província de Ontario. Através dele, a província paga muitos dos serviços de saúde que você pode precisar.
Sim, porque alguns serviços não são cobertos, como os odontológicos, por exemplo. Algumas empresas, inclusive, oferecem planos de saúde particulares, e esses sim, cobrem os demais serviços que por ventura o OHIP não cubra (lembrando que a cobertura e a forma de pagamento dos serviços através dos planos particulares varia de operadora para operadora).
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As províncias e territórios fornecem cobertura para grupos específicos, como idosos, crianças e residentes de baixa renda de serviços de saúde que geralmente não são cobertos pelo sistema de saúde financiado publicamente. Esses benefícios de saúde suplementares geralmente incluem medicamentos prescritos fora dos hospitais, cuidados dentários, cuidados com a visão, equipamentos médicos e aparelhos (como próteses e cadeiras de rodas) e os serviços de outros profissionais de saúde, como fisioterapeutas.
Para os casos daqueles que não se qualificam para estes benefícios complementares sob planos governamentais pagam por esses serviços diretamente ou através de planos de seguro de saúde privados, como expliquei mais acima. Muitos canadenses, através de seus empregadores, ou por conta própria, estão cobertos por seguro de saúde privado.
Um acidente e nossa primeira experiência em solo canadense
Vivemos uma experiência bem marcante logo que nos mudamos para cá. Tínhamos cerca de quatro meses de residência, e nosso filho caçula, Levi, na época com 22 meses, sofreu um grave acidente doméstico. Ele prendeu o dedão da mão direita na porta do banheiro do meu quarto e por muito pouco não decepou. O dedo ficou preso pela parte interna, onde temos nossa digital. Realmente algo extremamente assustador, principalmente para uma família de imigrantes, longe o bastante de sua zona de conforto e da sua rede de apoio.
Entramos em contato com o canal de emergência – 911 – e os paramédicos chegaram em menos de 10 minutos. Subiram, fizeram uma pré análise, deram algumas informações (inclusive a de que ele poderia perder aquela parte do dedo), e levaram de ambulância Levi e meu marido para um hospital público chamado SICK KIDS. O Hospital em questão é exclusivo para pediatria.
Eu fui em nosso carro, e ao chegar eles já haviam passado pela triagem, e estavam instalados em um quarto particular, na emergência. Esse primeiro atendimento foi rápido, mas depois de estarmos lá dentro, esperamos muito – ainda mais levando em consideração nosso estado emocional – para que um médico viesse avaliá-lo.
Entre esse atendimento, exames e a cirurgia plástica a qual ele foi submetido, foram pouco mais de 5 horas no hospital. Levi teve o dedinho reconstruído, alta no mesmo dia, e uma mínima cicatriz. A cirurgia além de eficiente, por ter recuperado o dedo, foi muito bem realizada. Tirando o tempo de espera, realmente nossa primeira experiência foi excelente. Pagamos, disso tudo, o valor aproximado de $90 dólares canadenses, pelo uso da ambulância, o que foi cobrado em casa, através de uma especíe de boleto. Nada mais. Todo o resto coberto pelo OHIP.
Os médicos de família e a forma como funcionam
Por aqui, outra coisa bem diferente daquela que estamos acostumados no Brasil – usuários de planos de saúde, principalmente – são os chamados médicos de família. Médico de Família é o profissional sem uma especialidade definida, mas que irá te atender, com dia e horário marcado, conhecerá todo o seu histórico, vai fazer e solicitar check-ups, exames de toda natureza, e que poderá te direcionar aos especialistas, de acordo com a sua necessidade.
Ele precisa ser seu melhor amigo, conhecedor de tudo o que estiver acontecendo contigo, e é com ele que você irá tirar absolutamente todas as dúvidas, e apresentará com veracidade, tudo o que estiver sentindo, inclusive emocionalmente.
Nossa experiência como o médico de família também foi incrivel, mas sei que isso também pode ser considerado uma grande sorte dentro do sistema. Inclusive, encontrar um médico de família não foi fácil. Muitos já não têm mais vaga. Nós utilizamos um site, do próprio governo, em que você se inscreve, e, surgindo vaga para profissionais perto dos locais que indicar, eles enviam o contato e você faz o primeiro agendamento.
Inclusive, já durante esse período de quarentena, fomos atendidos online por nosso médico de família, muito solícito e cordial, perguntando sobre os dias de distanciamento social, demonstrando preocupação não apenas com a nossa saúde física mas também com a saúde mental.
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Enfim, nesse pouco tempo que moramos aqui em Toronto, conheço algumas pessoas que tiveram experiências não tão boas quanto às nossas, e passaram por alguns perrengues dignos de hospitais públicos no Brasil, como longas filas de espera para agendamento de consultas ou exames, atendimentos lentos, emergências lotadas, médicos grosseiros.
Eu vejo isso como relativamente normal em hospitais de rede pública, ainda que em países desenvolvidos como o Canadá. São situações que por vezes fogem do controle, mas, no geral, temos excelentes hospitais e atendimento/equipamentos dignos de primeiro mundo.
No mais, cada caso é um caso, e como em qualquer área de atuação, vemos profissionais dedicados, que muitas vezes esbarram no sistema, como também vemos profissionais que não demonstram nenhum tipo de empatia ou zelo com o paciente. Por tudo o que vivemos até hoje, posso afirmar que o sistema de saúde em Ontario é de excelência, com alguns problemas que, como o mínimo de esforço, poderiam ser sanados.