Meu filho ficou doente: o que devo fazer?
Faz parte da vida ficar doente. Todos ficamos doentes com certa frequência, mas nos extremos de vida (infância e velhice) essa frequência é maior. Se em condições de maior conforto nós mães nos assustamos com as doenças dos nossos filhos, o susto é maior quando estamos morando em outro país, algumas vezes com uma capacidade mais limitada de comunicação e sem compreender em termos mais profundos o sistema de saúde daquela comunidade.
Para enfrentar qualquer coisa nesse mundo, precisamos antes entender o que estamos enfrentando. Por isso esse texto, para entender a doença, o que ela significa e quando se preocupar. Enquanto estava escrevendo, percebi que o artigo estava ficando MUITO comprido (são tantas coisas para falar, tantos fatores para chamar a atenção!). Então decidi dividi-lo em duas partes. Essa primeira parte fala sobre os aspectos mais gerais e subjetivos da doença. A segunda parte vai explicar os pontos mais objetivos, clarificando as principais doenças na infância, quais são os sinais e sintomas de risco e como conduzir de maneira inicial um episódio de doença em seu filho.
Essa entidade chamada “doença”
Leavel e Clark, pesquisadores da área de epidemiologia e saúde pública, descreveram que todas as doenças têm uma história. Chamaram de “história natural da doença”, e é dividida em três fases: pré-patogênica, clínica e de incapacidade residual. Vou explicar cada uma delas, de modo conceitual e usando uma gripe como exemplo.
Fase pré-patogênica: nessa fase ainda não existem sintomas, não sabemos que vamos ficar doentes, mas o corpo já possui certas “alterações” que nos predispõem a determinadas doenças. No exemplo hipotético da gripe, podemos imaginar que trabalhamos diariamente em um ambiente fechado, com um grupo de pessoas. Uma delas um dia veio trabalhar gripada. Três dias depois, como consequência de ter entrado em contato com uma pessoa gripada em um ambiente fechado e por longas horas, muitos deste grupo estavam gripados, mas outros não. Isso evidencia que em algumas das pessoas deste grupo o sistema imunológico “não estava funcionando tão bem” e elas, entrando em contato com o vírus da gripe, não conseguiram “segurar” e o vírus “ganhou”. A fase pré-patogênica nesse exemplo é o período destes três dias, entre o contato e o início dos sintomas.
Fase clínica: aqui os sintomas se instalam definitivamente e fazemos o diagnóstico da doença. No exemplo, os sintomas da gripe definitivamente se apresentam, como febre, tosse, nariz escorrendo, cansaço, dor no corpo, falta de apetite, dentre outros.
Fase de incapacidade residual: essa é a última fase, em que sobram alguns poucos sintomas, decorrentes daquela doença. No caso da gripe pode ser aquela tosse chatinha que não nos deixa por duas semanas ou um emagrecimento que sobrou porque não comemos bem enquanto estávamos gripados.
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E qual o motivo de eu estar falando isso tudo? Porque como qualquer coisa nessa vida, a doença é um processo com começo, meio e fim. Independente do país, nessa sociedade acelerada, maluca, frenética em que vivemos, não nos permitimos entrar em contato com a doença, nutri-la, entendê-la. Temos tantas tarefas a desempenhar em um dia comum, quer sejamos mães, pais, donas de casa, diretores de empresas, que nos forçamos a executar nossas tarefas, mesmo que o corpo esteja pedindo tempo e calma.
Mas existe um outro paradigma a ser considerado. Segundo as linhas de medicina ditas “alternativas, vitais, ou energéticas”, as doenças vêm nos mostrar algo que está errado. E assim, enfrentando a doença, olhando e avaliando o que ela quer nos mostrar, o que precisamos enxergar, ela devagarinho vai embora porque perdeu o sentido, não precisa mais ficar.
Um fato que me chamou a atenção quando cheguei na Itália foi o respeito com a doença. Costumamos desde o primeiro mês comprar pão em uma panetteria vizinha à nossa casa. Mas um dia demos de cara com as portas fechadas e um cartaz com a frase “Chiuso per l’influenza” (fechado por gripe). A panetteria ficou fechada por 3 dias e depois reabriu normalmente, com sua dona visivelmente falando ainda anasalado, mas se recuperando da sua gripe. Inimaginável, não?
Fiquei pensando durante uns bons dias naquele fato e me dei conta de que, mesmo sendo profissional da saúde, mesmo estudando há mais de 20 anos o processo saúde-doença, inúmeras vezes eu desrespeitei meu corpo que pedia, com gripe, para estar deitada, quietinha, repousando. Não escutei, mandei o corpo ficar quieto tomando medicações que só escondiam meus sintomas e fui trabalhar. E na maioria das vezes a doença só piorou. Pois é, doença é como calo, quanto mais tentamos esconder no sapato apertado, mais dói.
E as crianças com isso?
A maioria das doenças infantis são infecciosas. Raras são as doenças crônicas, oncológicas ou advindas de malformações intrauterinas. Criança fica doentinha por gripe, amigdalite, otite e raramente alguma doença infecciosa mais “chata”. Mas quando doente, criança precisa de colo, de acolhimento, de calma, da mãe lendo uma historinha para ela, de boa comida, de suco de fruta de verdade, de muita água, de chazinho e de sopinha.
Criança, em qualquer situação de maior necessidade, precisa de pai e/ou mãe disponíveis. Confesso que ainda não descobri a fórmula mágica de como equilibrar todas as tarefas “de adulto” com um filho que precisa ainda mais de nós, em dias de doença. Se tivesse descoberto, estava rica e sofreria muito menos ao ver meus filhos doentes. Mas baixando as minhas expectativas aprendi a viver melhor. E imigrar nos ensina muito como baixar as expectativas. O chão não precisa estar maravilhosamente limpo, aquele trabalho urgente pode ser entregue amanhã ao invés de hoje, se eu não tenho todos os legumes que eu quero para fazer a sopa do filho doente, uma sopinha de batata, cenoura e cebola vai ficar bem gostosa, se feita com muito amor.
E, repito, é disso que criança doente precisa: amor, acolhimento e pai e/ou mãe disponíveis de verdade. Olhando para ela nos olhos, vendo de verdade suas necessidades, entendendo nas entrelinhas o que ela precisa naquele momento. Nós pais muitas vezes traduzimos para a criança o que ela precisa e nem sabe que precisa. E criança aprende por exemplo, não pelo raciocínio. Se ensinamos aos nossos filhos que, quando doentes, não podemos parar, escutar o corpo que conversa conosco e temos que mandar o “corpo ficar quieto”, é assim que eles vão se comportar em muitas outras situações da vida: mandando o corpo, a alma, as emoções ficarem quietas, não escutando o que se tem que escutar, não se abrindo ao que se tem que se abrir. E é só nos abrindo, saindo das nossas “caixinhas” que crescemos. Em TODOS os textos do Brasileirinhos pelo Mundo as colunistas escrevem o quanto imigrar, se abrir a um outro país, a uma outra cultura, a uma outra língua, as fez crescer e evoluir.
Se seu filho ficou doente, não o leve para a escola, mesmo que ele esteja melhor depois que você deu a medicação antitérmica. Se ele está doente, ajuste suas tarefas, seu dia, para caber dentro da doença dele, dentro das necessidades dele. Pergunte com calma e amor quais são as suas angústias, o que o está incomodando, o que dói na alma e no corpo (porque foi por isso que a doença veio). As crianças nos ensinam que, ao se dar conta daquela situação, ao falar, ao verbalizar o que não está legal, a maior parte se resolve. E aí a doença não tem mais necessidade de ficar e pode ir embora devagarinho.
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