Olá, eu me chamo Aline Sanseverino e neste texto irei contar um pouco sobre mim e como cheguei até a cidade onde moro atualmente. Neste primeiro texto, desejo que você viaje através das palavras e possa conhecer um pouco da minha história. Talvez ela não seja tão diferente das demais, mas traz as particularidades da minha vivência sob o meu olhar. Então, vamos lá e a partir de agora, eu te convido a vir comigo e descobrir como foi parar uma carioca na Alemanha.
Uma infância na Cidade Maravilhosa
Nasci no Rio de Janeiro e fui criada entre os bairros adjacentes de Irajá, Vicente de Carvalho e Madureira, subúrbio carioca. Para mim, nesses bairros o sol brilhava diferente. Os entardeceres quentes de verão convidavam os vizinhos a sentar nas calçadas e jogar conversa fora. Enquanto isso, ali mesmo, as crianças se deliciavam com um sacolé de sabores variados de quase todas as frutas. Esse cenário emoldurava nossas brincadeiras e até hoje embalam as minhas mais doces memórias.
Nessas tardes os “piques” e o “queimado”, pique-esconde, pique-bandeira, pique-tá e por aí vai, sem falar em pular elástico ou corda, estavam sempre presentes. Nessas horas brincávamos com todos os colegas que moravam na rua e, quando faltava mais alguém para completar um time, podíamos sempre contar com um primo ou prima que estava nos visitando.
Naquela época, eu reclamava do calor, do sol quente e do Rio 40 graus – quanta inocência! Eu mal sabia que acabaria morando em um país com temperaturas bem baixas e em alguns momentos sentiria falta do calor. Hoje, sinto uma gostosa nostalgia daquela correria no sol quente que queimava meu pé, quando eu corria desesperadamente para achar um amigo escondido.
Uma boa mistura
Sou filha de uma professora do Ensino Fundamental (de ascendência portuguesa) e um bancário (que, segundo histórias familiares, tem ascendência alemã). E sou neta de uma violinista (de ascendência italiana) que integrava, em sua juventude, a Orquestra Sinfônica da Cidade de Campos – no interior do RJ.
Como não poderia ser diferente dos demais brasileiros, eu me resumo em uma boa mistura. Mistura essa que me possibilitava escutar belas histórias por parte dos meus pais e avó a respeito de seus familiares europeus.
Meu avô materno, português do Porto, era um dos que me fazia viajar por entre as margens do Rio Douro através das suas histórias. Seu jeito de falar “enrolado”, pois era essa a minha visão infantil, era o que mais me atraía e me entusiasmava a conhecer o país de onde ele viera. Isso sem contar com as visitas das tias e dos primos portugueses que atravessavam o oceano para estarem conosco.
E assim, em meio a essa miscelânea, a tantas histórias, sentimentos, amores e narrativas, eu fui crescendo. E a cada dia ia sendo despertado em mim o desejo de conhecer todas as línguas e culturas que me fossem possível aprender. Mas quero aqui destacar especialmente a influência de minha mãe e avó na construção da minha identidade profissional e intelectual.
A escolha de uma formação
Mesmo meu pai tendo tentado muito me levar para o mundo da matemática, meu coração nunca conseguiu ser dos números. Com elas, minha mãe e avó, pude aprender a estar em qualquer lugar do mundo, por meio da fantasia e do aguçar dos sentimentos que a literatura nos proporciona. Foi dessa forma que pude compor todo o conhecimento que eu desejava ter. Pude também entender que para cada momento da vida há uma trilha sonora peculiar. Pude perceber que cada etapa vivida, faz parte de uma linda e audaciosa sinfonia que construímos diariamente, sendo a sua completude um eterno desafio.
Como eu me encantei desde muito cedo por um caminho que era construído através das palavras, decidi cursar a Faculdade de Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Trajetória profissional: por qual área o meu coração bate mais forte?
Após me formar, trabalhei com tradução e versão, como professora de Língua Italiana, em cursos de idiomas, e de Língua Portuguesa, em ONGs e projetos educacionais. Atuei diretamente com alfabetização de jovens e adultos e no reforço escolar para crianças em situação de risco social. E essas últimas funções que exerci, arrebataram em definitivo meu coração. Pude entender, de fato, qual era o objeto norteador da minha formação profissional.
Trabalhando com jovens e adultos, pude organizar uma Biblioteca Comunitária para aqueles que, assim como eu, eram apaixonados pelo mundo da leitura. Como muitos estavam em fase de alfabetização, tive contato com as mais diversas formas de leitura de mundo. Foi um trabalho muito gratificante, pois por estarem expostos diariamente a situações de violência urbana, os livros alimentavam as esperanças e a fome de ampliar conhecimento. A partir dessas experiências, ganhei uma bolsa de estudos na Università per Stranieri di Siena, na Itália, para aprofundar o que eu havia aprendido na Universidade.
Entre o Rio de Janeiro e Kaiserslautern
Alguns anos se passaram, eu me casei com outro carioca, tijucano, que também desejava conhecer novas culturas e aprender novos idiomas e nos tornamos pais de um lindo casal de filhos. Em Outubro de 2015, devido ao doutorado do meu esposo, saímos de um ensolarado calor de 40 graus à sombra no Rio de Janeiro e viemos para Alemanha. Era pleno outono cinzento alemão e nos lançamos de cabeça nesta enorme aventura!
Neste ano de 2019 completamos quatro anos na cidade de Kaiserslautern, uma tranquila e gostosa cidade universitária. Neste lugar, onde escolhi para ser chamado de meu, cumpro a doce tarefa de ser mãe brasileira em contexto alemão. Aprendo com os desafios que me são impostos diariamente, desafios estes de ser mãe e estar fora do nosso país de origem. E também continuo na área de tradução, aliando a tudo isso a alfabetização dos meus filhos em Língua Portuguesa, além de me aperfeiçoar na língua alemã.
Português como Língua de Herança
Aqui, em minha cidade, tenho o desejo de começar a desenvolver o mesmo trabalho que realizo com meus filhos. Penso em sensibilizar as demais famílias brasileiras quanto à importância do ensino da Língua Portuguesa e da nossa cultura, como herança, aos pequenos que aqui nasceram ou foram expatriados. Entendo o quão importante é, para além de manter os laços com os parentes que ficaram no Brasil, resgatar a sensação de pertencimento, de história e de origem que o contato com a cultura brasileira e com a língua proporciona. Não tenho dúvidas que gera um benefício psicossocial à criança ao harmonizar a sua própria construção do EU diante de uma sociedade multicultural.
Esta foi uma breve parte da minha história contada a vocês. Assim como muitas mães, desejo compartilhar o meu olhar e minhas percepções adquiridas através das minhas experiências aqui na Alemanha. Pretendo com meus artigos somar a esta rede de apoio tão especial que é esta plataforma familiar e aconchegante. É um prazer estar aqui e até o próximo texto! Bis später!
3 Comentários
Oi Aline, super legal seu texto, parabéns! Eu noro em Munique e vi que existe um projeto super interessante chamado Mala de Herança, associado a Casa do Brasil. Fica a sugestão de uma possivel parceria, eles fazem um trabalho incrível com as crianças!
Olá, Marcia! Obrigada pela sugestão!
[…] eu já havia escrito no texto da minha apresentação aqui no time Mães Mundo Afora (sou colunista aqui e tenho a honra de fazer parte desta plataforma […]