O que aprendi na Califórnia em 2018
O que venho aprendendo, neste ano de 2018, com minha filha mais nova? Já te contei parte da nossa história, sobre como vimos a cara do bullying de perto. Mas ainda não relatei quase nada sobre a grande, master reviravolta que provocamos em nossa vida familiar como um todo.
Porém, o fim do ano está chegando e por essa razão venho te trazer, neste último mês, algumas ideias que podem ser interessantes para qualquer mãe nesse mundão afora, uma vez que é difícil encontrar alguém que esteja plenamente contente e realizada com o trabalho que a escola (me refiro ao sistema escolar em si) vem provendo para os nossos filhos. E mesmo aqui nos EUA, são poucas ainda as famílias que adotaram o Unschooling ou Educação Autodirigida como meta de vida, portanto sei que posso ter poucas parceiras nessa jornada.
Por ter escrito muito sobre a experiência escolar das minhas filhas aqui na Califórnia ultimamente, posso te dizer que hoje vejo a escola como sendo esse organismo estranho e esmagador que a maioria das mães brasileiras — eu inclusa — não entendeu muito bem, mas que, pelo fato de ter vivido em algum momento no Brasil, aprendeu a jogar o jogo ou foi obrigada a engolí-lo por inteiro, sem mastigar.
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Por outro lado, sou otimista e acredito que toda grande dor traz consigo miraculosas estratégias de crescimento pessoal e/ou relacional enormemente vantajosas. Sabe aqueles ditados que afirmam “a blessing in disguise” ou “Deus escreve certo por linhas tortas”? É bem por aí.
Assim, no afã de comemorar cada lágrima bem chorada, cada angústia sofrida, cada noite insone, venho aqui te oferecer duas pequenas sugestões para que você as considere quando tiver vontade, ou quando for aquele dia especial e perfeito para pensar sobre a vida e aprender propositadamente coisas novas. Ou simplesmente não considere nada e vá curtir o ano que se aproxima! Também está valendo.
Mas vamos lá.
Sugestão número UM: leia bons livros sobre o assunto
Os melhores autores sobre o assunto Educação Autodirigida são John Taylor Gatto, que acabou de falecer em outubro passado, com 83 anos, e John Holt, falecido em 1985 com 62 anos, mas cujas ideias são consideradas revolucionárias até os dias de hoje.
Como eu vou falar sobre o Gatto no próximo post, deixa eu me estender um pouco mais sobre a obra e as ideias do John Holt, pra você ver que espetáculo!
A primeira máxima de Holt que você encontra no melhor dos livros dele até agora, na minha opinião (ainda não li todos), intitulado How Children Learn (Como as Crianças Aprendem) é a mais simples, porém bem desafiadora. Ele diz simplesmente: confie nas crianças.
É intimidante porque, para sermos capazes de confiar nas nossas crianças, temos que confiar em nós mesmos, em primeiro lugar. Mas como fazer isso, se aprendemos, quando crianças, que os adultos não podem confiar em nós, crianças? Percebe a pegadinha?
Por isso reproduzimos esse comportamento pela vida afora, tratando os pequeninos como fomos tratados e achando que é assim mesmo.
Esse livro do Holt faz com que nos maravilhemos com a sua sagacidade e nos entristeçamos tremendamente pela veracidade das suas afirmações com base nas suas experiências práticas. O pesar aumenta quando vemos ser confirmado diariamente o fato de que ainda são poucas as pessoas que conseguem ver o desserviço que o sistema escolar tem prestado às crianças em várias partes do mundo.
Certamente falo do sistema escolar americano, mas, por experiência própria, posso estender minhas considerações ao sistema escolar brasileiro que, assim como o sistema americano, foi baseado no sistema prussiano de ensino implementado por Frederico, O Grande, lá nos idos de 1763.
Mais um ponto a ressaltar dessa obra é que todo o trabalho do autor se concentra na descrição de aprendizagens práticas efetivas por parte das crianças, não se atendo a explicações psicológicas ou a teorias de funcionamento sobre o cérebro infantil. Ele fala para adultos que pretendem, verdadeiramente, permitir que a aprendizagem das crianças modo Open Source aconteça, ou seja, aquela forma de conhecimento que se dá a partir do contato direto com a fonte de interesse, sem a intermediação do professor/funcionário escolar.
Outras ideias que você pode aprender com o livro:
- as crianças têm interesse em aprender o que acontece em seu mundo presente; elas não aprendem para realizar algo/ser alguém no futuro (o futuro é um efeito colateral da aprendizagem presente);
- as crianças raciocinam de forma a considerar o todo em sua aprendizagem e não as partes; elas passam a considerar as partes fazendo uso da compreensão do todo;
- as crianças aprendem errando; é ao procurar corrigir o erro que se dá a aprendizagem nas situações;
- as crianças podem aprender mais observando outras crianças, e não os adultos;
- o mundo da fantasia fornece às crianças os meios de ela tanto realizar, quanto aprender sobre ações/atitudes que ela ainda não consegue na vida ‘real’.
Sugestão número DOIS: o mundo é mesmo a melhor escola
Quando se trata de aprendizagem Open Source, como é outra expressão usada para designar a Educação Autodirigida pelas crianças, toda literatura e toda comunidade que implementa a não-escolarização (Unschooling) das suas crianças é unânime em indicar fortemente — assim, tipo forçando mesmo a barra — o uso do mundo como fonte de aprendizagem, pois as mais significativas reflexões acontecem em lugares e situações fora de casa.
Por exemplo, levar a criança para o mercado local pode ser interessante, pois ali abre-se um leque de vivências e linguagens, especialmente se existirem produtos de outros países a serem considerados. A criança pode se preparar antes, se ela se interessar em saber de antemão algumas informações básicas sobre o local, como, por exemplo, se o mercado aceita dinheiro ou cartão de crédito — eis aí o sistema financeiro, que pode ser conversado, por exemplo — e toda a operação de escolha, pesquisa de produtos, que pode ser extremamente ilustrativa em inúmeros aspectos.
Isso vale simplesmente para todo local e toda ação social que você realiza. Por isso, tenho dito que a opção pelo unschooling é uma mudança de paradigma de vida, pois toda situação vivida é situação de aprendizagem empírica, cotidianamente.
Sempre foi e sempre será assim: as crianças aprendem coisas significativas para elas através do exemplo dados pelos pais/ pessoas próximas e pela convivência com os outros nas mais variadas situações sociais.
Certamente você tem inúmeras dúvidas quanto às formas de explorar melhor, junto ao seu filho e filha, essa aprendizagem contínua, como eu também as tenho. Mas de uma coisa eu tenho certeza: o sistema escolar americano se provou ser extremamente prejudicial para a nossa saúde familiar.
Finalmente, despeço-me neste ano, agradecendo de coração a sua leitura. Desejo a você e à sua família Boas Festas, muitas bênçãos e uma excelente vida, cheia de prazeres e descobertas maravilhosas junto aos seus queridos pimpolhos!
Nos vemos no ano que vem!