Maternidade no Brasil e na França: Choques Culturais.
Comecei a falar um pouco de choques culturais entre hábitos brasileiros e franceses relacionados à maternidade aqui. Escolhi continuar a compartilhar minhas experiências lá e cá porque realmente foi isto: um choque.
Choques relacionados à alimentação
O pediatra francês que orientou a introdução alimentar do meu bebê não ditou regras rígidas sobre o modo de dar as verduras/legumes e frutas, e responde sempre às nossas perguntas. Até agora, as orientações dele têm sido muito úteis, embora o fato de ter um papai francês em casa, acostumado desde pequeno a comer uma alimentação saudável e equilibrada, ajude muito também. Por isso, seguimos as orientações médicas e adaptamos às necessidades do nosso filho. E, quando temos dúvidas, podemos pedir igualmente conselhos a uma amiga francesa que é pediatra aqui. Vou dar alguns exemplos abaixo23:
A quantidade de comidinha foi indicada pelo pediatra e devíamos oferecer gradativamente, segundo o apetite do bebê, começando com uma fruta e uma verdura de cada vez durante um tempo, antes de fazer as combinações. Na França, é muito fácil saber a quantidade. Além de pequenas balanças de cozinha e potes de conservação para bebês com indicadores em mililitros (ml), o próprio pediatra dá uma ideia de medição com uma colher simples, por exemplo. Isso para quem cozinha as refeições do bebê em ca00sa.
Apesar de não ser bem-visto dar comidas industrializadas para bebês na França, há uma variedade enorme de marcas de alimentos para eles nos supermercados. Pessoalmente, já usei algumas vezes quando preciso (em viagens, por exemplo). E essa é uma diferença nítida em relação ao Brasil. Não há quase nada de comidas (papinhas e afins) nas prateleiras brasileiras, o que pode levar a uma falsa dedução de que a alimentação francesa é menos saudável do que a brasileira. A prova de que isso não é verdade pode ser lida neste artigo que fala da preocupação com a crescente má alimentação de crianças no Brasil.
O número é chocante: Mais de 32% delas tomam refrigerante ou suco artificial. Um dos problemas decorrentes disso é a obesidade infantil. Ou seja, muitos brasileiros não dão papinhas industrializadas para os filhos, mas também não dão (exclusivamente) frutas e verduras/legumes aos bebês. E o pior é que, segundo os médicos brasileiros, os pais estão dando salgadinhos, refrigerantes, sucos, doces e outras “comidas” de adultos para os bebês.
Leia também sobre os desafios e descobertas na introdução alimentar na França
No Brasil, continuei a fazer as papinhas caseiras do meu filho e ouvi de pessoas lá que é muito difícil ver um bebê comer verduras como ele, pois o comum é comer besteiras. Já na França, as besteiras estão totalmente fora de cogitação na grande maioria dos lares. Por isso, fiquei chocada quando ofereceram batata-frita, coxinha e afins para o meu filho na minha terra natal.
Também não vi iogurtes para bebês no Brasil, item típico das refeições francesas desde a infância. O meu filho não sentiu falta, mas tive que adaptar a refeição dele sem iogurte (substituí por leite). Apesar da discussão em torno do iogurte, vale notar que a França não sofre com o problema de obesidade infantil, diabetes, etc. — bem diferente do Brasil.
Pelo que ouvi de brasileiros (inclusive médicos abordando o assunto da alimentação no Brasil), é preciso muito esforço para ir contra essa onda de má alimentação das crianças. Há, claro, pais brasileiros firmes e fortes nessa luta. Infelizmente, diferente da França, a falta de informação contribui para esse problema.
Outra curiosidade é que as pessoas do meu convívio no Brasil se chocaram com o fato de eu cozinhar as frutas e as verduras, e sem colocar açúcar e sal, como se faz geralmente na França.
No BPM, é possível conhecer um pouco sobre essas diferenças alimentares em vários países, como Israel e o México. Vale lembrar que as nossas experiências e modos de ver o mundo são tão diversos quanto os hábitos dentro de um mesmo país.
Choque cultural relacionado ao uso de celular para crianças
O meu marido e eu escolhemos não dar celular/tablet para o nosso bebê. Na França, não tive nenhum problema em manter a nossa escolha. Nunca fomos questionados. A pergunta do uso dessas tecnologias nem é feita de tão natural que ainda é (por enquanto) um bebê não usar celular. Digo “por enquanto” porque os especialistas franceses da área médica e da educação estão preocupados com o aumento do uso dessas tecnologias por crianças.
Até hoje, onde moro, não vejo bebês nem crianças pequenas com celulares nas ruas. Quando vamos visitar parentes e há outras crianças (várias, de bebês até crianças de oito anos, por exemplo), não vejo ninguém brincando com celular – nem os adultos, para falar a verdade. As crianças brincam juntas e se divertem o dia todo sem usar celular/tablet. O único caso delicado que conheço é quando as crianças francesas têm babás, pois as cuidadoras podem acabar não respeitando a vontade dos pais nessa questão.
No Brasil, fui questionada sobre a minha escolha, deram celular/tablet na mão do meu filho e, quando havia outras crianças, o meu filho ficou brincando sozinho porque as outras estavam na Internet. Acabei em situações delicadas, sem querer ser a chata, mas incomodada com o que estava acontecendo. Acredito que cada pai e mãe sabe o que é melhor para os filhos, por isso, não vou entrar na questão de quem está certo ou errado. O fato é que foi muito mais difícil para mim manter a minha escolha no Brasil do que na França e, depois dessa experiência, admiro ainda mais os meus amigos brasileiros que conseguem manter a escolha de não dar celular/tablet para os filhos no Brasil.
Além disso, o uso de celular por pequeninos brasileiros já faz parte do cotidiano de um jeito que até um dos programas infantis brasileiros, com uma garotinha de uns oito anos, estrela ela com o amiguinho tablet – e os dois dormem agarradinhos, como se o tablet fosse uma pelúcia. Não sei se existe programa infantil assim na França; eu ainda não vi. Não posso negar que assim fica mais difícil manter a escolha de não usar celular/tablet.
Por falar nesse assunto, vou deixar aqui o link com a nova lei francesa que, se votada antes de setembro de 2018, vai começar a valer nas escolas: Uma regulamentação mais rígida do uso de celulares nas escolas, antes permitidos no recreio.
1 Comentário
Hola Helena,
Uma vez mais te parabenizo pelo texto e aproveito para parabenizar também toda a familia BPM (da qual me sinto parte). Meu nome é Maira, sou hispano-brasileira e atualmente moro no Brasil com minha familia. No ano que vem nos mudarmos a Lyon. Seria possível “trocar figurinhas” com você sobre a cidade e dúvidas de mãe para mãe? Desde já te agradeço conterrânea.