Expresso Oriente: vida nova em Singapura
Por: Viviane Florencio
Quando estava, digamos assim, começando a me sentir relativamente integrada a Rotterdam, depois de longos nove meses morando na Holanda, foi confirmada a nossa mudança para Singapura. Meus sentimentos eram confusos e contraditórios.
“Poxa vida…”, eu pensava. Agora que minha filha de 7 anos parece ter se adaptado à escola. Que meu filho de 1 ano e meio parecia ter finalmente passado a fase de pegar todas as viroses dos coleguinhas de creche. Que eu e meu marido superávamos a fase em que parecíamos apenas colegas de quarto, quando ele chegava sempre monossilábico e exausto do novo trabalho e depois de jantar assistia futebol ou coisa do gênero no sofá da sala; e eu era abduzida pela tela do computador entretida com séries da Netflix no quarto… literalmente cada um vivia no seu quadrado!
Depois de meses, havíamos enfim encontrado uma babá, que uma ou duas vezes por mês ficava com os pequenos para que nos pudéssemos beber nosso vinhote, namorar e falar de outras coisas além de crianças, contas e reclamar do frio e da chuva… Por último, e não menos importante, eu havia conseguido recriar aquela base que toda mulher precisa para sentir-se em casa e com paz de espírito, como: qual supermercado ir de acordo com o bolso no final do mês; roupas para as crianças (em especial kit inverno); cabeleireiro decente (sim, temos cabelos brancos e, por favor, mechas verdes e laranjas deprimem!); depiladora (artigo de luxo na Europa – no meu caso, só virilha); médicos (convencê-los que tudo tem limite, inclusive o paracetamol); e o que faria me sentir menos “de fora” – criar um círculo de amizades com pessoas afins, da mesma “enfermaria” que a minha, sabe?
Posso garantir, e jurar de pés juntos, que um bom círculo de amizades faz toda diferença na vida de uma expatriada!
Uma decisão temporária e confortável

Foto: Unsplash
Entretanto, a ideia de ir para Ásia e morar em Singapura, e ter a possibilidade de conhecer outra(s) cultura(s), viajar para países do sul asiático, ter um esquema em que eu poderia ter mais tempo para mim mesma (já que não precisaria levar e buscar a minha filha na escola, pois haveria o serviço de ônibus escolar), além de um condomínio que oferece serviço de faxina três vezes na semana e o elevador do prédio que já desceria diretamente no supermercado (dentro de um shopping center)… Eu estava que nem o Sidney Magal: “Me chama que eu voooou”. E fui!
Ha três meses, estamos nós quatro aqui em Singapura.
Desde que chegamos, senti muita familiaridade com a natureza tropical daqui. É uma cidade muito verde. Me lembrou muito o meu Rio de Janeiro.
Aqui em Singapura, os bairros próximos ao centro da cidade são dominados por condomínios luxuosos, o que também me lembrou o Rio dos privilegiados, como o bairro da Barra da Tijuca e São Conrado, porém sem a favela da Rocinha. Obviamente, aqui não há a desigualdade social vergonhosa que há no Brasil, mas, com o passar do tempo, explorando mais a cidade, ficou claro que os expatriados vivem concentrados, em sua maioria, nessa Singapura “bolha” com tudo de ocidental à disposição – e tudo muito mais caro, numa cidade que já é caríssima, pois é uma ilha onde tudo é importado.
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Alias, vir para cá só vale a pena se a família vier muito bem empregada e com benefícios, tais como um bom plano de saúde e escola paga pela empresa. As vagas em escolas públicas são poucas e raras, uma vez que a prioridade é dos locais e pessoas com residência permanente. A opção que resta são as escolas internacionais (em geral modernas, com muito espaço verde, piscina, quadras de esportes e várias atividades extracurriculares), que custam cerca de 27 mil dólares de Singapura por ano (mais ou menos 20 mil dólares americanos). A minha filha, que já estudava numa escola internacional na Holanda, adaptou-se sem problemas com a educação daqui e vai feliz pra escola, onde as aulas são em inglês e ela aprende mandarim!

Foto: Alaric Sim, Unsplash
Em relação ao sistema de saúde, não tive experiência nos hospitais públicos, mas ouvi dizer que são muito bons, porem não 100% gratuitos e o tempo de espera pode ser de dias/ semanas, para se conseguir uma consulta. Posso então falar da minha experiência com a rede particular (utilizada pela grande maioria dos expatriados daqui por se tratar de uma ambiente mais internacional, cujos médicos estão habituados a atender famílias estrangeiras, e a marcação de consultas e exames é fácil e rápida).
Diferentemente da Holanda e do Reino Unido, onde já vivi e chegar até um especialista e conseguir convencer o medico de família a solicitar exames de check-up é uma tarefa para um estrategista de guerras… Em Singapura é o extremo inverso – e não posso negar que o que justifica essa “facilidade” no acesso a especialistas e marcação de exames seja o quanto essa rede particular de saúde fatura com os expatriados e seus respectivos planos.
Só para ilustrar, logo que cheguei fui em uma consulta com o oftalmologista (direto, sem passar pelo clínico) para uma avaliação de rotina. Eu me queixei de dor de cabeça e, de repente, me vi fazendo uma tomografia do cérebro e sendo atendida no mesmo dia por um neurologista! Graças a Deus, não havia nada de errado com a minha cabecinha, eu só precisava mesmo aumentar o grau dos óculos de leitura. Vou confessar que aquelas primeiras semanas indo a todos especialistas que sempre quis ir, fazendo todos os exames possíveis e imagináveis, me fez ir às forras desses 12 anos de Europa (antes da Holanda e depois do Reino Unido, vivi por seis anos na Itália). Que fique claro: todas as conta foram pagas pelo plano de saúde.
O clima dos trópicos e o Singlish
Ahhh, o calor… Minhas amigas de Rotterdam queriam me excluir do grupo delas quando tive a ousadia de reclamar do calor insuportável! Logo eu, que xingava o frio e o vento de Rotterdam. No início, sofri muito com o clima, que é muito úmido, com aquele calor abafado, a pele brilhando de tanto óleo, e os cabelos?!? Leão da montanha, indomados, rebeldes.
Nas horas piores, sigo fugindo para o primeiro shopping que encontro, o que não é muito difícil. Em cada esquina se encontra dois ou mais! E todos te oferecem o maravilhoso serviço de ar condicionado com temperaturas de outono europeu! Aliás, se vier para cá a passeio, traga um bom casaquinho para poder passear no shopping e ir ao cinema, porque é Frozen total, com Elsa virada no Jiraya, palavra de honra!
Embora a língua oficial seja o inglês, muitos aqui ainda têm como base da comunicação o chinês, e quando eles falam o inglês parece realmente que estão falando chinês. Segundo os próprios singapurianos, o inglês é também conhecido como Singlish, porque eles misturam ao inglês palavras de origem chinesa e malaia. Toda vez que entro em um táxi, tento dar essa musicalidade chinesa ao inglês para poder ser compreendida e chegar no destino certo.
Uma outra característica que considero muito positiva aqui é essa fusão de culturas/etnias (chineses, indianos, malaios) e expatriados de todas as partes do mundo; assim como as religiões que convivem em harmonia, pois não há uma crença que prevaleça a outra.
Os singapurianos são, em geral, educados, gentis e muito receptivos. A segurança, a infraestrutura, a organização são indiscutíveis. O transporte público é excelente, sem contar a quantidade de opções de lazer voltadas para as crianças e para nós adultos também. Isso me faz gostar mais e mais de viver aqui.
Ainda temos alguns meses pela frente, e há muito a descobrir até o nosso retorno a Rotterdam. Mas, definitivamente, Singapura ja ganhou nossos corações.
Viviane Florencio é carioca, atriz, formada em Letras pela UFRJ e com mestrado em Comunicação pela Robert Gordon University. Mora fora do Brasil desde de 2005, viveu na Escócia por 6 anos onde conheceu seu marido, mudou-se para Itália onde nasceram seus dois filhos, depois de 5 anos mudaram-se para Rotterdam, onde viveram por um ano. Atualmente mora em Singapura.
2 Comentários
Texto maravilhoso! Ele informa tudo que precisamos saber sobre Cingapura de uma forma divertida. Adorei! Queria ler mais textos de Viviane Florencio!!
Obrigada amiga amada!!!!!