Nós tínhamos a ideia de morar fora do Brasil por acreditar que viver em um outro país é uma excelente experiência de vida e de muito aprendizado. Bom, este é assunto para um outro texto.
Decidimos, em família, que tinha chegado o momento do nosso período sabático para fazermos um intercâmbio de um semestre na Itália. Eu estava adorando a oportunidade de ter um tempo, em casa, para curtir as crianças. O plano era: eu pediria uma licença de três anos no meu emprego. No primeiro ano me dedicaria a vida da família na Itália, nos outros dois anos a um projeto de consultoria para empresas familiares no Rio de Janeiro, onde morávamos.
Sobre a minha formação e vida profissional
Sempre trabalhei e posso dizer que minha vida já foi bastante agitada. Costumo me apresentar como “psicóloga, terapeuta de família e especialista em empresas familiares”. Mas na verdade sou mais um monte de coisas. Acredito que somos produto das nossas escolhas, das nossas experiências e dos encontros que tivemos.
Já fui professora universitária e coordenadora acadêmica de curso, supervisora de estágio e orientadora de monografia na pós-graduação na PUC-Rio. Passei em um concurso público, e trabalhei no RH do IBGE, onde aprendi muito sobre gestão de pessoas, administração pública e até um pouquinho de estatísticas. Já fiz palestras, já organizei eventos e, no ano passado, me formei em “mental coach”(preparador mental de atletas).
Adoro estudar, adoro aprender coisas novas. Escolhi uma trajetória que me trouxe muita satisfação pessoal e profissional. Aprendi muito em todos os lugares por onde passei e tenho certeza de ter contribuído bastante com os meus pares.
Parte do meu texto está escrito no passado e vou explicar. No final de 2017 tirei uma licença – sem vencimentos (salário) no meu emprego público e embarcamos para a nossa aventura. Hoje moro num cidade linda, bem pertinho de Veneza e deve ter gente pensando que morar na Itália é puro glamour, vide a foto que escolhi para o artigo – mas não é bem assim e não vou entrar nesse assunto. O foco de hoje é o trabalho.
Trabalhar fora ou ser mãe em tempo integral?
De acordo com os planos iniciais, seriam apenas alguns meses me dedicando ao projeto de ser mãe e dona de casa em tempo integral. Preciso admitir, trabalhar fora é muito mais fácil, ainda mais quando a gente tem uma rede de apoio por perto.
O serviço de casa nunca acaba. Às vezes ainda estamos almoçando e o meu filho já quer saber qual vai ser o jantar! Isso me dá um certo desespero… Eu até que me animo em cozinhar, mas é difícil acertar na batata, no bife e nos bolos como aqueles que comiam no Brasil por três razões: (1) Os ingredientes são diferentes, (2) eu não tenho muita experiência prévia e (3) acho que existe um componente sentimental “Não é o bife da Bibila”, “Não é o bolo da vovó Maria” e “Não é a comida da Sonia”. Sou eu tentando fazer o meu melhor. Até hoje é difícil, mas o início foi dificílimo!
Soma-se a isso tudo que entre uma tarefa e outra da casa, às vezes ajudo as crianças com as tarefas da escola. Certa vez minha filha mais velha tinha que estudar 120 páginas de História, de uma matéria que ela nunca tinha visto nem em português. Eu lia o livro e resumia em português – tínhamos um grupo no Whatsapp para os “áudios de história”.
Adiamos o plano de voltar para o Brasil
O tempo voou. As crianças se adaptaram muito bem e optamos por adiar o nosso retorno. Nós nos organizamos para ficar mais um ano, e depois outro. Apesar de ter sido uma decisão em família, eu perdi o chão com essa mudança de planos.
Leia também: Da carreira bem-sucedida no Brasil ao papel de mãe em tempo integral nos EUA e Carreira profissional x Ser mãe em tempo integral
Os dilemas por trás de uma decisão de família
Foi uma escolha, mas ainda não estou muito feliz com ela. Sofri muito, chorei muito, fiquei muito triste e precisei de tempo e de ajuda para me reanimar novamente.
Eu queria que meus filhos vivessem em um outro país, mas não queria que eles lembrassem deste como “o período em que a mamãe vivia triste e irritada”.
Ao mesmo tempo em que estava sendo muito difícil pra mim, consegui ver que para as crianças, mudar de país, mudar de escola ou simplesmente ter a mãe mais presente fez muita diferença. O pequeno se mostrou um excelente aluno na escola, uma criança extremamente curiosa, sensível e preocupada com os outros. A mais velha estava crescendo em uma cidade segura, estava feliz, vencendo uma serie de desafios e ganhando autonomia. Nunca vamos saber o que ocasionou tais mudanças, mas percebemos que elas aconteceram.
É hora de fazer diferente e aproveitar as oportunidades
Decidi que é hora de fazer diferente. Continuo testando receitas e fico muito feliz quando dá certo. Quando dá errado, continuo tentando. Criei uma rotina para facilitar com as tarefas domésticas e não sou tão rigorosa com a organização da casa.
Já que gosto de estudar, eu me inscrevi em um Master de mental coach, quer dizer, em um curso com a duração de um ano para o psicólogo poder trabalhar como preparador mental de atletas, que concluí no ano passado e me inscrevi em um curso de “Family Business” na faculdade de Economia da Universidade de Padova.
Não foram escolhas aleatórias. Meus filhos são atletas federados do tênis, um esporte que exige muito controle mental e, com o curso, eu pude aprender na teoria o que eu já via acontecer em campo. E, por já ter feito um doutorado no tema das empresas familiares, eu me inscrevi “na modalidade curso avulso” na faculdade com o objetivo de conhecer pessoas que trabalham com esse tema (os professores) e o universo acadêmico daqui.
Foram ótimas experiências para me tirar da rotina do dia a dia e para eu perceber que sinto muita falta do meu trabalho, da liberdade que ter um salário todos os meses me proporciona, de fazer coisas que me dão prazer e me realizam profissionalmente.
A vida em outro país nem sempre é fácil e se ficarmos presos ao que ficou pra trás, será praticamente impossível termos um futuro feliz. Penso muito em me reinventar.
É preciso fazer acontecer
Uma coisa é certa, não dá pra esperar que as coisas aconteçam, é preciso fazer acontecer. Neste ano decidi empreender em duas frentes: 1) comecei a escrever um projeto de “pós doc” – sempre gostei de estudar e tenho tempo para fazer um pós doutorado e (2) comecei a estruturar aquele projeto que eu queria tocar quando voltássemos para o Brasil, nos outros dois anos da minha licença.
Comecei, mas não sei se vou concluir alguma dessas coisas. O ano de 2020 está meio estranho, cheio de incertezas. Independente do que acontecer, tenho dois lemas que me guiam: “o importante é tentar fazer sempre o nosso melhor” e “nunca é tarde para recomeçarmos, seja de onde paramos ou de um outro ponto qualquer”.
6 Comentários
Carla que currículo maravilhoso você tem, parabéns, tenho certeza que foi com muito trabalho! Me anima saber que com os filhos maiores conseguimos nos dedicar a outras coisas. E tenho certeza que sua comida é ótima!!! Estou torcendo aqui de pertinho para que seu projeto de certo e pode sempre contar comigo. Tati Paiva
Oi Tatiane, obrigada! Sim, os filhos crescem, continuam dando trabalho e preocupações (sem querer desanimar ninguém!) Conforme as crianças ganham autonomia e independência, precisam cada vez menos dos pais e, assim, nos sobra bastante tempo. Bom, quanto às comidinhas, acho que depois de 2 anos aprendi a fazer algumas coisas bem gostosas!
Adorei o texto!
Vc é muito estudiosa e tem talento! Tenho certeza que seus projetos irão para frente! Desejo muito sucesso! Tati Buzzi
Obrigada pelas palavras! Dedos cruzados, na torcida!
Amei Carla!! É exatamente assim q nos sentimos!! Estou no mesmo momento de me reinventar!!! Bjs
Que legal que você gostou. As vezes temos que nos reinventar e o processo até se dar conta disso pode ser difícil e solitário. Se precisar de algo, sabes onde me encontrar! bjs