Criando filhos em Nova Iorque
A maioria dos nossos amigos e familiares reagiu positivamente quando recebeu a notícia da nossa mudança pra Nova Iorque. Lembro-me, no entanto, como se fosse hoje, um amigo dizendo: “Nova Iorque não é um bom lugar para criar filhos”. Ele falou isso porque estava triste com a nossa partida e tentava nos convencer a ficar. Na época, nós já estávamos decididos e não demos muita atenção a esse comentário. Mas enquanto a mudança não se concretizava, às vezes essas palavras voltavam a minha cabeça como uma espécie de fantasma.
Poucos dias depois do episódio com o nosso amigo, eu fui assistir um espetáculo sobre a vida do cantor Renato Russo. Fiquei super entusiasmada num determinado momento da peça em que ele falava com a irmã sobre o tempo em que moraram em Nova Iorque. Ele se mudou com oito anos (a mesma idade que a minha filha tinha) e guardava excelentes lembranças desse período da infância. Quando ouvi o relato, logo pensei: será que a minha pequena vai ter a mesma sorte do líder do Legião Urbana?
Hoje, depois de mais de um ano e meio vivendo em Nova Iorque com a minha família, sinto-me capaz de fazer um balanço da minha experiência na cidade. Meu testemunho é o de alguém que chegou com uma filha de 8 anos (e que agora já tem 10).
Como vivi a maior parte da minha vida em duas grandes cidades brasileiras, é inevitável que a minha análise sobre a vida em Nova Iorque parta de uma comparação com essa vivências anteriores. Comentarei a seguir os pontos que considero relevantes para avaliar se uma cidade é ou não um bom lugar para as crianças.
Segurança
Sinto-me muito segura em Nova Iorque. No Brasil, vivíamos estressados com medo da violência. Quando a minha filha era pequena, eu evitava ao máximo andar no transporte público com ela. Nos ônibus, eu tinha medo de assaltos e também da forma agressiva e mal educada de dirigir da maior parte dos motoristas. No carro, a regra era sempre andar com os vidros fechados. Quando estacionávamos na rua, era aquela tensão na hora de entrar no veículo e dar a partida. Aqui em Nova Iorque é muito diferente. Eu e a minha filha caminhamos muito tranquilas pelas ruas. Todo mundo anda com os seus celulares, computadores e tablets nas mãos sem nenhum problema. Eu nunca vi ninguém ser assaltado. A segurança é um dos principais pontos positivos da cidade.
Transporte
O transporte público funciona muito bem. O metrô te leva para “todos os cantos” de forma rápida e barata, embora algumas linhas estejam saturadas e os trens fiquem bem cheios em horários de pico. As estações de metrô em geral são feias. As mais novas são exceções à regra. Os vagões costumam ser razoavelmente limpos e bem conservados. O cartão utilizado no metrô é o mesmo utilizado nos ônibus (metrocard). Eu gosto muito de andar de ônibus porque os motoristas são educados e eu posso ir observando a rua pela janela. O ônibus, no entanto, não é indicado para trajetos longos (com exceção dos limited). Eles são bem mais lentos, pois há pontos muito próximos uns dos outros. Tanto o metrô quanto o ônibus possuem sistema de ar condicionado e calefação eficientes, mas no metrô isso funciona apenas dentro dos vagões (na maior parte dos casos). O trânsito em Manhattan é bem pesado como os das grandes cidades brasileiras. Muitas pessoas que moram aqui não tem carro e algumas só o utilizam nos fins de semana.
Educação e saúde
Eu não posso falar com muita propriedade sobre a educação pública, mas pelo que leio e converso com as pessoas, em Manhattan existe um número reduzido de vagas em escolas de alto nível. Na rede privada, há escolas excelentes, mas existe o problema do número limitado de vagas em algumas delas, assim como o preço alto das mensalidades.
Há algumas escolas privadas em que as crianças precisam passar por um longo processo seletivo. Isso me parece um exagero para crianças pequenas. Não gosto do ambiente altamente competitivo que existe em algumas dessas escolas. Minha filha estuda em uma escola francesa (privada) e estamos bem satisfeitos. Ela tem acesso à educação de qualidade, em um ambiente harmonioso, de pouca competitividade e zero bullying. Clique aqui para ler o meu texto sobre a escola francesa em Nova Iorque.
A saúde pública praticamente não existe nos Estados Unidos. Na minha concepção, esse é o “pé de barro” do modelo americano. Pra nós que temos planos de saúde, as coisas funcionam bem. Alguns médicos são muito rápidos e objetivos em suas consultas. Acho que isso também acontece um pouco no Brasil, mas aqui me parece ser mais a regra do que a exceção, infelizmente.
Vida cultural/opções de lazer
Essa cidade tem uma vida cultural incrível. Tem muitos museus, bibliotecas, livrarias, shows, exposições, cinemas, etc. Há museus totalmente voltados para o público infantil, como por exemplo, o Museu das Crianças de Manhattan e o Museu da Matemática. Clique aqui para ler o meu texto sobre esses museus. Nova Iorque oferece uma programação cultural intensa para o público infantil, inclusive com algumas atrações gratuitas.
As crianças também podem desfrutar de inúmeros espaços públicos ao ar livre. Há parquinhos (playgrounds) em bom estado de conservação espalhados por toda a cidade. No verão, a maior parte deles liga fontes de água e a criançada adora. Para acessar o meu texto sobre esse tema basta clicar aqui. O Central Park e o Randall’s Island Park são dois exemplos de grandes espaços verdes maravilhosos onde os pequenos podem desfrutar da natureza.
Custo de vida
O principal ponto negativo é o alto custo de vida, que faz com que a maioria das pessoas more em imóveis pequenos. Essa falta de espaço em casa e muitas vezes também nas escolas é certamente prejudicial aos pequenos. Por isso é preciso levar as crianças sempre para espaços abertos, onde possam correr e brincar livremente. Muitas escolas, como a da minha filha, levam as crianças diariamente para parquinhos próximos.
Cosmopolitismo/diversidade cultural
Assim como a segurança, outro ponto muito positivo de criar filhos nessa cidade é a oportunidade que eles têm de viver em um ambiente multicultural. Aqui há gente do mundo todo e as crianças crescem escutando diferentes línguas e observando distintos hábitos culturais. Isso faz com que eles naturalizem essas diferenças. Em geral, as crianças usufruem muito dos espaços públicos, como praças e parques, e se locomovem majoritariamente a pé ou no transporte público. Dessa forma se habituam desde pequenos a conviver com pessoas de diferentes nacionalidades, culturas e classes sociais.
Felizmente, hoje posso afirmar com segurança que nosso amigo estava errado. Minha filha está tendo uma experiência muito rica crescendo e se desenvolvendo em Nova Iorque. Ela fez amizades com crianças de diferentes nacionalidades e é muito feliz vivendo aqui.
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