Alguns meses depois que chegamos à Inglaterra, uma amiga me recomendou um grupo de ioga e meditação na universidade da nossa cidade. Eram aulas gratuitas na hora do almoço. Incerta do que iria encontrar, arrisquei e fui conferir. A aula, dividida em duas partes, terminava com uma meditação guiada pelo professor. Deitada no tapetinho, sem sapatos e com a cabeça apoiada em uma almofada, fechei os olhos e fui ouvindo o que ele dizia e tentando estabelecer uma conexão.
Finalmente conseguia respirar fundo desde a minha chegada aqui. Entre inspirações e expirações, o professor disse: “imagine que você está flutuando sobre esta sala, sobre a universidade, o bairro, a cidade, o país. Sinta-se voando por cima das fronteiras de todos os países, e se conectando com outros lugares, que já não estão mais distantes.”. Em um daqueles momentos em que esquecemos onde estamos, experimentei a sensação de não estar assim tão longe de amigos e familiares no Brasil. Carrego até hoje comigo esta ideia de que se eu fechar os olhos e respirar, posso me conectar com o que está longe fisicamente, mas perto do meu coração.
Para saber mais sobre como a meditação pode trazer mais calma e qualidade de vida, leia esta reportagem.
Conexões virtuais e suas limitações
Desde o início da pandemia do Coronavírus, passamos a usar de forma mais intensa o WhatsApp, Zoom e outros recursos. É uma forma de conexão com quem não podemos ver fisicamente, especialmente com os que estão no Brasil. Apesar das limitações da tecnologia – que cansa e frustra por não conter a possibilidade, de um abraço ou do olho no olho – encontramos conforto nos encontros semanais com familiares espalhados em quatro países diferentes.
Há jogos que as crianças podem fazer com os primos, independente do fuso horário, e com o confinamento, há sempre grandes chances de encontrar as pessoas em casa para um bate-papo. É uma forma de driblar a saudade.
Mas também temos que preservar nossos contatos reais com a natureza, para que a gente se sinta também conectado com a realidade física do mundo e com os pés na terra. Lembro da frase de Albert Einstein que fala sobre o ser humano como parte de um todo chamado universo, mas que costuma experienciar a si mesmo como algo separado do resto. Nossa tarefa seria, portanto, segundo ele, nos libertar desta prisão e alargar nossos círculos para envolver todas as criaturas vivas e toda a natureza. E todos os países, eu acrescento mentalmente, pensando no mundo sem fronteiras sugerido pelo professor de ioga.
Conexões da vida cotidiana
As tarefas do dia a dia nos conectam com pessoas as mais variadas. Há trocas de receitas que testamos na nossa cozinha, a aula on-line que minha filha está fazendo junto com sua melhor amiga que ficou no Brasil, e a nova professora que parece agora tão próxima de nós. A festa junina promovida pelo curso de português on-line que a caçula está fazendo nos leva para outro lugar, quando as meninas dançam quadrilha dentro da sala da nossa casa.
E também conseguimos fazer uma conexão entre nós mesmos, como família, em meio ao isolamento social. É comum ouvir a pergunta: como é possível se conectar melhor com os filhos? E a quarentena traz uma chance de rever tudo isso, de forma intensa, desafiante, mas também reveladora.
Não existe uma fórmula pronta, mas vejo as crianças tendo maior participação nas tarefas da casa e da vida. E, o que antes era chamado de “tempo de qualidade”, agora é só tempo, e estamos juntos o tempo todo. Não é preciso, e muitas vezes não é possível, criar uma atividade dirigida, inventar jogos e brincadeiras elaborados, apenas viver a vida e as decisões lado a lado, com cumplicidade e parceria.
A saudade do imigrante
Volta e meia me perguntam se não é muito difícil migrar, deixar para trás avós, amigos e todas as suas antigas referências. Se você é imigrante, já deve ter se questionado ou ouvido essa mesma perguntaum milhão de vezes. Se você pensa em migrar, certamente esta é uma questão que paira sobre sua cabeça.
No início, esta parecia uma grande barreira e, de fato, é mesmo. Mas com o tempo, aprendemos a encontrar alívio em outras formas de conexão. As relações familiares mudam, mas, de certa forma, se intensificam. As visitas e encontros tomam novas proporções também. Clarice Lispector escreveu que “amar é não morrer” e é assim que podemos receber o mundo sem receio, já que há uma conexão entre nosso mistério e o mistério do mundo. Não é uma conexão clara que possa ser entendida apenas com a mente, mas que pode ser sentida, às vezes com os olhos fechados, inspirando e expirando durante a aula de meditação.
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