A maternidade vira nossa vida do avesso. É uma mudança de 180 graus, nosso centro do universo muda, assim como mudam as nossas amizades quando temos filhos. Vejo na minha experiência de vida que várias amizades são passageiras. As pessoas fazem parte da nossa vida em um momento, são muito importantes e marcam nossas histórias. Poucas ficam com o tempo.
Quando eu era solteira eu tinha muitos amigos. Vivia rodeada de pessoas, tinha várias turmas diferentes e vivia cheia de compromissos. Quando comecei a namorar, os programas continuaram intensos mas foram aos poucos mudando. Baladas foram ficando menos frequentes e com o tempo os jantares e programas que eram relacionados com comida cada vez mais frequentemente. Bem, comida e bebida.
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Mudamos de país e recém chegados na Austrália os programas mudaram de novo. Chamávamos de “fome zero”. Todo mundo era duro, trabalhando com o que podíamos para pagar as contas.
Além disso, nosso estilo de vida mudou. Aqui em Perth, tudo é cedo e de dia. Os bares fecham cedo, as baladas também. Nossos programas com os amigos eram ou piquenique na praia ou em parques. Também almoços na casa de alguém, sempre dividindo comes e bebes, algo bem comum aqui. Até em casamento as pessoas dividem comes e bebes (imagina?!).
Então engravidei e quando minha filha nasceu os programas mudaram mais uma vez. E com os programas, as amizades.
Quando temos filhos pequenos, os programas que fazemos giram em torno da rotina do bebê. Claro que tem gente que diz que o bebê tem que seguir a sua rotina, mas eu não sou uma delas. Na verdade, eu até cheguei acreditar que eu poderia ser, mas não fui.
Adaptando à nova rotina
Como muitas pessoas, a Aline sem filhos chegou a dizer “quando eu tiver filho, meu filho terá que se adaptar à rotina da minha família”. Você está rindo por aí lendo minha afirmação? Eu também.
Em pouco tempo percebi que não, não valia a pena quebrar a rotina da minha filha. Ela não dormia, eu não aproveitava, meu marido também não e nosso dia seguinte era um caos. Começamos a recusar convites para fazer qualquer coisa à noite, pois por mais flexível que ela fosse com as sonecas de dia, à noite era outra história.
Depois de um tempo de recusar, vários amigos se afastaram e nós nos afastamos também. Muita gente sem filho não entendia que eu não tinha forças para responder as mensagens ou porque nunca conseguia ir nos encontros.
Para ser sincera, eu acho a maternidade bem solitária. A maternidade mudou cada célula do meu corpo e impactou muito minha vida social também.
Quando meus filhos eram bebês, era a questão da rotina. Quando eles começam a andar, querem pegar tudo e isso limita onde vamos. E aí eles fazem dois anos e entram na fase de ignorar nossos pedidos e só fazerem o que eles querem. Ou quando pessoas nos convidam para ir nas suas casas e a criança quer mexer em tudo. Se tem escada então, não vemos ninguém.
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Cada criança é atraída por um perigo, para o meu filho é a rua. Um dia o levamos à praia aqui onde moro. Estava tendo um show de MPB com uma artista brasileira. Música, mar, areia e a criança não parava de correr para a rua. Ele tem dois anos e meio e é aquela idade. Para não passar tanto stress, acabamos saindo menos porque ninguém aproveita. Então fazemos programas em casa, ou em lugar cercado. Quantos convites recusei de piquenique no parque porque o parque não era cercado…
Muitas coisas impactam as amizades quando temos filho. A falta de empatia é uma delas, talvez a maior de todas. Cada pai e mãe sabe como é seu filho. Cada criança tem uma necessidade e cuidado diferente. Aqui neste artigo têm algumas histórias sobre o assunto.
Porém nem todo mundo pensa assim. E aí o “ah, mas como assim você não vai conosco para praia porque está vento”? O Dani (meu filho que nasceu prematuro extremo de 29 semanas e tem doença crônica dos pulmões, sendo que o vento é um dos piores venenos para ele) precisa se acostumar. “Se você não o levar, como ele vai criar imunidade?”.
Já ouvi isso tantas vezes que perdi as contas. É claro que quando o Dani fica doente porque o vento é um dos grandes venenos para ele (e aqui conta ar condicionado mega gelado também) e precisar ir para o hospital, não é a pessoa que disse que a imunidade dele precisa ser fortalecida que ficará lá por dias.
Fora que, gente, como é difícil concluir um assunto quando temos filho! Ou conversar com adultos em geral. As crianças são exploradoras. E onde tem uma criança exploradora, tem um pai ou mãe atrás.
Amizade entre mães também é difícil?
Também tem a questão do estilo de educação. Nem sempre é fácil conviver com pessoas que têm estilo de educação tão diferentes. Por exemplo, encontrei uma amiga um dia que tem um filho que bate nas outras crianças. Veja bem, eu como educadora infantil sei que é fase. Mas como mãe, não vou deixar meus filhos baterem em outra criança sem fazer nada. E essa mãe leu em algum artigo que tinha que ignorar o filho batendo na minha filha. Eu fui conversar com minha filha e disse a ela que ela tinha que falar para ele parar, mas ele não parava. Fomos embora e nunca mais vi essa mãe.
Em outra ocasião, fui na casa de uma amiga que tinha um bebê pequeno e na hora que ele foi dormir, ela queria silêncio absoluto. Crianças normalmente falam alto, e tanto meus dois filhos quanto o mais velho dela não ficavam quietos. Antes de eu decidir ir embora, ela me mandou embora da casa dela dizendo que meus filhos não deixavam o dela ficar quieto. Ela nunca mais nos convidou para nada.
Fora os amigos sem filhos que marcam de se ver no bar à noite.
E mesmo quando achamos a nossa tribo, a rotina da maternidade é tão louca que sinto que somos amigas, mas é diferente. Raras vezes abrimos nossos corações com outra pessoa sobre como fazíamos sem filho, por mil razões: medo de ser julgada, incompreendida ou de começar e nunca mais parar e as lágrimas virem junto e não pararem também. Às vezes não falamos porque não queremos escutar a nossa voz falando coisas escondidas na nossa alma.
As amizades mudam com as fases da nossa vida e espero que um dia elas voltem a ser mais profundas e íntimas como já foram. Hoje… bem, hoje eu só espero conseguir terminar um assunto.
2 Comentários
Querida Aline, adorei o seu texto. A minha vida se transformou depois do nascimento dos meus filhos! Amizades que ficaram, são as verdadeiras. Obrigada por compartilhar a sua história e ponto de vista.
Oi Rachel, obrigada pelo comentário.
Muda muito ne?