As quatro estações: um balanço após um ano morando na Espanha
Com as estações do ano bem marcadas, a chegada do meu segundo verão na Espanha me lembrou que já estou aqui há um ano. Acredito que esses marcos sejam um bom momento para repensar se a escolha de criar um filho tão longe de “casa” é a mais acertada.
Mudar de país é uma escolha difícil e complexa. No meu caso foram três grandes mudanças ao mesmo tempo: mudança de país, nascimento do meu primeiro filho e pausa na carreira, com o pedido de desligamento de um trabalho de quase duas décadas que eu gostava muito.
A forma de encarar as mudanças é algo muito particular, mas, pelo o que leio de outras mães em situação similar, muitos medos e sentimentos são parecidos. Acredito que muito vá depender de como queremos enfrentar as coisas. Certamente tudo será mais fácil se as mudanças foram motivadas por decisões maduras e bem pensadas.
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Cada pessoa prefere uma estação do ano diferente. Sempre gostei do frio do inverno, das flores da primavera, das cores do outono. E, se existe uma estação que não gosto de verdade é o verão. E, minha mudança coincidiu justamente com a chegada dele, o verão escaldante espanhol. Não bastassem todas as dificuldades, como aprender a lidar com um bebê e as burocracias da mudança, o sol forte me fazia reclusa no meu apartamento.
Para os espanhóis em geral o verão é um tempo de alegria, piscina, praia, dias muito longos, férias. Com toda essa energia boa eu optei por aproveitar o verão de algum jeito. E conseguimos fazer isso à noite, quando o sol se punha. Eu e meu marido fazíamos longas caminhas com o bebê e o cachorro, compartilhávamos o aprendizado e as descobertas do dia, do idioma, da cultura do pueblo que vivíamos. Foi nessa época que recebemos nossas primeiras visitas e pudemos desfrutar de um ótimo momento com elas. E, assim, consigo me lembrar com saudade desse primeiro verão um tanto caótico que passei por aqui.

Noites de verão em Barcelona
Aos poucos o calor foi dando espaço para os dias frescos do outono, as cores das árvores foram se transformando lindamente, o bebê foi crescendo e o puerpério ficou para trás, as burocracias foram vencidas e aos poucos as coisas entravam nos eixos.

As cores do outono em San Cugat del Vallès
E eis que chegou o inverno. Aquele frio delicioso, vontade de passear, viajar. Mas, como aproveitar aquela estação que eu tanto gosto com o bebê? Camadas de roupa, gorro, cachecol, creme para proteger rosto e lábios. Bebê pronto para sair. E também pronto para as primeiras viroses, febre, reações a vacinas. Como esses lindos dias de frio podem trazer tanta complicação para a saúde dos pequenos?
Nesse período também fizemos a primeira viagem ao Brasil, para as festas de final de ano. Ao mesmo tempo que sentia muita saudade da família e dos amigos e estava feliz por rever a todos, sabia que teria que passar por uma nova despedida. E as despedidas são doídas demais. Acredito que sempre serão. Felizmente a tecnologia nos ajuda muito. Podemos ver as pessoas todos os dias pelo celular, mas, não é a mesma coisa. Claro.
Voltei do verão do Brasil – verão no sentido de alegria, de ver meu bebê desfrutando com os primos, tios e avós – para o inverno espanhol, mas mais um “inverno interior”, questionando se seria justo com o meu filho privá-lo desse contato próximo com a família.

Inverno em San Cugat del Vallès
Contudo, logo chegou a primavera. Todos os dias eu buscava nas árvores os primeiros sinais desse renascimento (sim, a vida aqui me proporciona esse maior contato com a natureza, posso apreciar as árvores, as flores, as fases da lua). Uma folha, depois outra e as árvores já estavam cheias como se nunca tivessem passado pelo inverno. E o frio foi dando espaço para temperaturas mais amenas, as viroses ficaram para trás, os dias ficaram mais longos, eu já podia entender bem o catalão.
No início da primavera meu marido recebeu uma nova proposta de trabalho e nos mudamos de Barcelona para Madri. Essa mudança me fez ver que com menos de um ano vivendo em Barcelona eu já havia me apegado muito ao local e à minha nova vida. Apesar das dificuldades – muito mais do primeiro ano da maternidade do que da mudança em si, o balanço era muito positivo. E eu vou guardar sempre com muito carinho esse tempo que pude viver lá.
Mudei para Madri ansiosa por desbravar a cidade, com bastante expectativa para a nova vida, para a nova escola do meu filho, para retornar ao mercado de trabalho, para receber novas visitas. Porém, a mudança foi bem turbulenta e pude sentir na pele a falta que a rede de apoio faz. Quando vim do Brasil para cá meu marido estava aqui e já havia preparado tudo para a nossa chegada. Meus pais me acompanharam na viagem, pois eu trazia o bebê, bagagem e o nosso cachorro. Pude contar com toda a família na arrumação das malas e ida ao aeroporto. Aqui tivemos que fazer tudo sozinhos.
Pedimos indicação de empresa para fazer a mudança e escolhemos a empresa referência da cidade. O valor foi bem alto, totalmente desproporcional a qualquer empatia da equipe. Eles estavam lá para levar as coisas, pouco importado se para isso tivessem que tirar a comida do meu filho da geladeira e largar na pia (horas antes do que eles haviam combinado).
Eu cheguei antes a Madri com o bebê e meu marido viria alguns dias depois com o cachorro. Nesse intervalo meu filho começou a passar mal e tive que levá-lo ao PS. Novamente senti a falta que a rede de apoio faz. Apoio para as coisas práticas, como dar uma carona, cuidar do bebê enquanto eu tomava banho, levar o cachorro para passear, mas também o suporte emocional.

Primavera em Madrid
Retomando à questão inicial – criar um filho tão longe de “casa” é a decisão mais acertada? – posso concluir que essa resposta vai depender de cada família. Como expus acima há momentos maravilhosos e há momentos difíceis, de muita solidão. Porém, assim é a vida de todos, não? Estando longe perdemos algo muito valioso, que é esse contato diário com as pessoas queridas. Mas, por outro lado, posso oferecer uma infância mais tranquila para o meu filho, estando mais presente, sem medo de sair na rua, aprendendo a conviver e a respeitar várias culturas.
Não há vida perfeita. Não há estação do ano perfeita. Acredito que o importante seja priorizar nossos momentos de refrigério mesmo durante um verão escaldante.
3 Comentários
Thais você é maravilhosa! Que experiência linda a sua de viver tantas mudanças incríveis… sou fã e torço sempre daqui =]
Querida Lais, que alegria ler sua mensagem. Fiquei muito tocada e muito grata! Também sigo torcendo por aqui! Um grande beijo
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