As primeiras férias no Brasil depois da mudança para a Holanda
Você se mudou do Brasil e, depois daquela primeira fase de empolgação com todas as novidades, começa a bater a saudade “de casa”. Sim, porque na maioria das vezes leva-se muito tempo para se sentir em casa no novo país. A aproximação do final de ano e toda a carga sentimental que as festas de Natal e Ano Novo carregam em si acrescentam ainda mais ingredientes a essa receita já batida. A vontade é de pegar o primeiro avião para cear com a família e virar o ano brindando com os amigos de sempre. E aí que, menos de seis meses depois de nos mudarmos, decidimos fazer exatamente isso – largar o frio e a chuva do inverno na Holanda para recarregar a vitamina D e o estoque de amor em umas férias no verão carioca.
O plano era esperar a mudança para a Holanda completar um ano e a saudade ficar incontrolável. Julho e agosto são os meses de férias escolares na Europa e poderíamos passar até seis semanas no Brasil, fazendo valer as horas de voo e o preço da passagem com muito mais tempo e tranquilidade para curtir a família, os amigos e até fazer uma viagem curta pra outro estado brasileiro. Ou seja, uma escolha lógica.
Havíamos nos programado para recebermos visitas do Rio no Réveillon em Rotterdam e isso aplacaria um pouco a saudade de todos. Mas as visitas não puderam vir. E meu coração de mãe não soube como dar a notícia para a menininha de sete anos que contava no calendário os dias para passear com seus primeiros hóspedes e mostrar todas as coisas legais da nova cidade. No calor da emoção, a solução para o dilema foi antecipar nossas férias no Brasil.
Compradas as passagens, começaram os questionamentos: será que estou fazendo o certo? Alice está adaptada na escola, fazendo amigos, aprendendo o holandês. É hora de tirá-la daqui? Voltar ao Brasil, rever a família, o clima, os amigos… ter tudo isso de volta para, três semanas depois, arrancá-la de novo do seu “habitat”? Muitas pessoas que já vivem fora há mais tempo me alertavam para as dores e delícias das tão esperadas férias no Brasil: “a volta será ainda mais difícil do que quando vocês vieram a primeira vez de mudança”, diziam. Meu coração titubeou.
Já de volta aos Países Baixos posso atestar: no nosso caso, ir tão cedo de férias para o Brasil foi a decisão mais acertada que tomamos!
Os estágios de bem-estar da vida de quem mora no exterior
Vários estudos demonstram um gráfico de bem-estar das fases por que todo expatriado e imigrante passam até atingir uma estabilidade emocional e se adaptar. Prometo falar melhor disso em um texto futuro. Mas, resumidamente, há um primeiro estado de euforia, quando se toma a decisão da mudança de país. Ele, geralmente, é seguido por um pânico temporário que antecede a partida – o que, diabos, eu estou fazendo largando “tudo” para trás? Chegando ao novo país, sobretudo se você tem um tempo para conhecer e curtir o lugar antes de cair na rotina “da vida como ela é”, você volta àquele estágio de alegria que podemos chamar de lua de mel com a sua escolha: seus olhos estão voltados para as maravilhas e diferenças positivas que seu novo país oferece em relação ao Brasil. É como se você estivesse de férias e tudo é lindo.
Só que, infelizmente, férias ou lua de mel acabam. E elas dão lugar a um período de choque cultural que faz seu coração rejeitar, inclusive, a racionalidade. Você começa a enxergar somente os defeitos do novo país, da nova cidade, da nova vida e até do povo e da cultura daquele lugar. De repente, tudo é melhor no Brasil. Dizem os especialistas, essa é uma fase em que você deve se cercar de pessoas com quem desafar e se sentir mais próximo de sua cultura ou de seu estado emocional (ou seja, brasileiros e expatriados de forma geral) e evitar uma decisão radical de voltar ao seu país.
É claro que aqui estou fazendo uma generalização. Para cada indivíduo esse processo pode tomar contornos diferentes. Além disso, cada pessoa tem um tempo próprio. As pesquisas indicam que esses altos e baixos podem levar de algumas semanas até muitos anos para que cada pessoa enfrente o processo de aculturação até chegar a uma estabilidade.
Voltar de férias para mudar de verdade

Arquivo pessoal
Precisávamos de sol, calor, família, amigos e de nos sentirmos donos daquele ambiente. Organizei os dias no Brasil para nos proporcionar o máximo que o calendário permitisse. Marquei compromissos com antecedência, ainda na Holanda, para que a Alice pudesse encontrar todos os seus amiguinhos e também passar tempo com os avós, tios e padrinhos. Tentei encontrar meus amigos em grupos, já que o tempo era curto para encontros individuais. E busquei conciliar esses encontros com os lugares onde eu queria ir – praias, bares, cinema, restaurantes.
É claro que não dá para fazer tudo e encontrar a todos em apenas três semanas, com Natal e Ano Novo no meio. E rapidamente a gente lembra que nós estamos de férias, mas a maioria de nossos amigos e parentes, não. A vida segue seu curso e as pessoas têm as suas rotinas. Mas algo que você também rapidamente aprende é que quem gosta de você vai se esforçar para estar contigo naquele pouco tempo que tem. E, ao mesmo tempo, vai entender que o tempo não é suficiente para fazer tudo que você, de coração, gostaria – colocar todo o papo em dia, matar toda a saudade, recuperar aqueles meses de ausência, viver um dia como se você nunca tivesse saído dali. Então aproveitamos tudo que havia para viver e foi revigorante e maravilhoso. Nada substitui estar com quem se ama e quer bem.
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Mas voltar à cidade que eu amo me fez entender e reconhecer que, hoje, ali não é mais a minha casa. Amo o Rio de Janeiro e o Brasil e meus laços com essa cidade e esse país, essa cultura e com todas as pessoas que me fazem pertencer a esse lugar são inquebráveis. Mas a vida tomou um outro rumo e, pelo menos nesse momento, ali não é mais o meu lar. Eu estava de passagem. De férias. E precisaria retornar. Mas, para voltar, preciso ter um lugar para ir. Um lar para onde eu queira voltar. E, ao sentir essa necessidade, eu percebi que preciso fincar o pé no novo país e na nova cidade e criar ali, na nova vida que eu escolhi, um lar para onde eu queira voltar.
Para mim, particularmente, não ter esperado tanto para voltar ao Brasil teve um efeito curativo e, ao mesmo tempo, foi um divisor de águas. Em agosto de 2017 eu finalizei um processo de mudança física do Rio para Rotterdam que incluiu vender todos os móveis e o carro, alugar nosso apartamento, transferir a Alice de escola, fazer inúmeras despedidas para ela (incluindo uma festa de aniversário ao ar livre que durou 10 horas) e garantir que ela tivesse a mais tranquila transição possível num cenário de mudança de país, língua, clima e cultura.
Mas foi em janeiro de 2018, depois de três semanas de férias no Rio, que eu me mudei de verdade para a Holanda. Consegui trazer não só o meu corpo e poucos pertences, mas também a alma, mente e coração e fiz a minha mudança integral para esse novo país e novo tempo da minha vida. E foi assim que, na viagem de férias que eu pensava estar fazendo sobretudo em benefício da minha filha, eu me mudei de verdade para a Holanda.
A Alice? Ela amou estar com sua família e dormir na casa dos amigos, o calor e a piscina, tomar açaí e ouvir português em todos os cantos. E, como sempre, surpreendeu ao encarar com tranquilidade a volta para Holanda. Porque tenho a impressão de que ela entendeu bem antes de mim que, por hoje, a nossa casa é aqui. E tudo bem.
12 Comentários
Carol, estou adorando os seus textos! Temos perspectiva de expatriar para a Holanda no próximo ano com uma filha quase da idade da sua. Continue compartilhando conosco a sua experiência!!!
Oi, Priscilla! Fico feliz que esteja gostando e que, através de minha experiência, possa ajudar outras mães que estão ou irão enfrentar desafios parecidos. Quando chegar, entre em contato!
Carol querida, adorei!! Me identifiquei! Passei por varias fases no meu processo de adaptacao que ja dura cinco anos. Indo para o Rio no final do mes. Vamos ver como voltarei dessa vez. Parabens pelo texto!!!
Que bom que gostou, Mônica! Sei que você entende bem o que é isso…
Gostei Carol. Também mudamos em agosto de 2017 para a Suíça. Estamos planejando ir ao Brasil nas férias mas estou em dúvida se vai fazer bem para os meninos. Para você fez bem ir ao Brasil. Mas e para sua filha, ela voltou feliz para a Holanda?
Oi, Rubia! Resolvi até incluir um último parágrafo resumindo como foi para a Alice: ela está bem, feliz e adaptada. Usei como estratégia para reduzir o risco de uma tristeza marcar a viagem de volta para a chegada num domingo, com início da aulas já na segunda. Assim não daria a ela muito tempo para pensar na mudança. Ela entraria na rotina novamente. E deu certo! É claro que criança tem um processo diferente e quase nunca verbalizam os sentimentos, porque têm dificuldade de entendê-los. Mas eu pensei: bom, essa é a nossa vida agora. Somos expatriados, vivemos longe do nosso país e famílias e vamos ter que ir e vir sempre. Faz parte da nossa vida agora. Então, não adianta muito adiar, sabe? E, como eu disse no texto: não deixar com que a saudade ficasse insuportável ajudou muito a viagem, fazendo com que ela fosse tranquila, divertida, leve. Eu aconselho!
Oi Carol. Excelente texto. Muitas outras fases nesse processo de adaptação ainda estão por vir, que vc já deve conhecer pois já viveu no exterior antes. Também sou carioca e vivo em Roterdã, precisando de qualquer coisa entre em contato por e-mail. Boa sorte!
Eu imagino! E fico tentando me preparar e fortalecer para o que ainda está por vir! Adoraria te encontrar!!! Me mande seus contatos! beijos e obrigada pela leitura!
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Adorei ler sua experiência, Carol . Como entendo seu relato…adotei no coração a Inglaterra há muitos anos atrás, meu pai inclusive apelidou o país de second country.. .bjs, best of luck
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