Dez Natais longe do Brasil
Quando eu olho pra trás e vejo que o tempo passou, eu começo a contar quantos Natais e Anos Novos eu passei longe do Brasil. E me pego realmente assustada, porque foi uma década, and still counting (ainda contando)…
Se fossem anos intercalados, eu nem me surpreenderia tanto. Mas foi uma sequência de dez anos. Dez anos. E você pode me perguntar se faz muita diferença em ser dez anos, e não cinco. Olha, te digo que, depois do terceiro ano sem pisar nas areias de Cabo Frio, sem colocar roupa branca e chinelos Havaianas, e sem pular sete ondinhas ou jogar flores no mar, a gente nem percebe mais.
Parece que ficamos meio anestesiados com relação a esse sentimento de vazio, de algo faltando, de ninho não preenchido por completo. Porque a nossa casa, aquela lá, não essa daqui, vai ser sempre o nosso ninho, e o ninho dos nossos filhos. Por mais que eu fique mais uma década sem comer farofa com peru, quindim e pudim, salada de frutas e rabanada, a nossa morada estará sempre habitando dentro de nós.
E por que todo esse tempo passado longe de casa? Não sei ao certo explicar, mas foram vários contratempos. Como eu trabalhava em navios, o último reveillon que passei no Brasil foi a bordo do navio, e foi a única e exclusiva vez que vi os fogos de Copacabana: de dentro de um transatlântico ancorado na baía de Guanabara. Que pegadinha do destino! E depois disso, em 2010, nunca mais pisei em terras brasilis para celebrar essa festa de alegria e calor humano.
Leia também: Natal, momento de expressar o amor em português
No ano seguinte, eu vim morar aqui na Croácia, e como novidade passei o tempo inteiro aproveitando o frio. Aquela empolgação toda com o inverno foi legal, não cheguei a ver neve porque aqui no litoral raramente neva, mas tive aquela real sensação de quando vemos o Natal nos filmes e séries americanas. Todo mundo encasacado e vestindo preto, uma verdadeira mudança de cenário!
Nada de ceia farta, nada de esperar o Papai Noel chegar à meia-noite, poucos fogos de artifício que duraram uns cinco minutos. Tudo muito simples e diferente daquela festa que sempre estive habituada e esperava ansiosamente com minha família. Mas, como foi a primeira vez, consegui aproveitar da maneira como os croatas celebram as festividades por aqui.
Já no ano seguinte, embarquei pro navio junto com o marido e foi bem marcante, pois conheci países nunca imaginados antes, como Austrália e Nova Zelândia. Foi realmente indescritível! Nos anos seguintes, como o marido estava desembarcado e em casa, passamos essas épocas de festas e férias por aqui, já que pra levar um croata pro Brasil no meio das férias dele é quase missão impossível.
2020, o ano que não será como imaginava
Enfim, onde quero chegar com toda essa história? No ano de 2020, esse ano louco que estamos vivendo e que, até então, era o ano escolhido para levar Gabriel pra pisar na areia da praia, ver os fogos e correr sem sapatos. Era o ano programado para meus pais passarem seu primeiro Natal e Ano Novo com o neto, na casa preparada para nos receber, no nosso ninho. Era o ano em que mais um membro se juntou à nossa família, o meu sobrinho Miguel, priminho do Gabriel, e eu estaria lá para segurá-lo e tirar fotos vestido com uma roupa fofa de Papai Noel. Era.
Infelizmente, tudo virou de pernas para o ar. O marido ficou 8 meses embarcado, as férias vieram agora, no fim do ano, e as dificuldades para se locomover pro Brasil durante toda essa pandemia surgiram. Não será esse ano. Não será esse ano que mostrarei a Gabriel as casas dos vizinhos enfeitadas, não será esse ano que darei aquele abraço apertado nos vizinhos que aguardam a contagem regressiva acordados junto conosco para bater no seu portão pra dizer “Feliz Ano Novo”. Não será esse ano que comerei as rabanadas e bacalhau de verdade feitos pela minha mãe. Não será.
Mas o que podemos, de fato, tirar desse ano que não será? Posso estar alegre pois todos estão com saúde. Posso me alegrar em ver, mais uma vez pelas chamadas de vídeo, o rosto deles me desejando Feliz Natal e cantando pra Gabriel. Posso me alegrar por desejar “Boas Festas” duas vezes (no horário daqui e de lá). Posso me alegrar por ter esperanças de que ano que vem será melhor para todos. Tenho fé.
Que tenhamos um abençoado e próspero Natal!
2 Comentários
Oi Débora, acabei de ler seu texto e me fez lembrar que eu já estou há 17 anos, sem viver estas emoções. O tempo passa rápido demais e acabamos nem nos dando conta disso.
Um ótimo Natal para você e sua família.
😘🙋🏾♀️
Débora, amei o texto.
Me emocionou muito.
Quantas saudades