Gravidez em Israel é normal, muito normal
Gravidez é aquele papo universal que todo mundo conhece: enjoo no primeiro trimestre, bem estar no segundo trimestre e para o terceiro trimestre sobra o peso da barriga, as costas que doem, a azia, a falta de posição para dormir e por aí vai.
Nada mais humano, nada mais normal do que todos os sintomas e perrengues da gravidez. Da China ao Peru, deveria ser tudo igual – um óvulo e um espermatozoide que depois de uns 8 meses se transformam numa melancia na sua barriga que te impede de até mesmo escovar os dentes normalmente, sem que a barriga fique relando na pia.
Mas não é. Apesar do processo interno ser obviamente igual e universal, fato é que a gravidez para a sociedade pode ser muito diferente em cada país.
Me mudei para Israel grávida de 2 meses. Logo comecei a procurar emprego, e na etapa final de uma entrevista assumi que estava grávida para o entrevistador, logo pensando que por essa razão eu perderia a vaga.
“Não é problema meu” – foi a resposta que ouvi. Como assim não é problema seu meu amigo? É problema seu sim, se me contratar jaja vai ter que aturar minha ausência por seis meses e ficar segurando minha vaga. “Tem certeza?” – perguntei, totalmente incrédula por não ter acendido aquela luzinha inerente aos recrutadores brasileiros de MULHER – FÉRTIL – LICENÇA MATERNIDADE – NÃÃÃÃO.
“Ué, sou eu quem vai trocar as fraldas? Não, então não é problema meu”. E logo em seguida, recebi a ligação com a resposta positiva e a contratação. Um tapa na cara – só que ao contrário – de quem vem de uma cultura brasileira onde gravidez e carreira são excludentes.
Gravidez aqui é normal. (E não, não é normal no Brasil. Infelizmente ainda há muito o que se evoluir em termos de sociedade para que a gravidez não seja tratada como um tabu profissional no Brasil, fazendo com que muitas mulheres tenham de fazer a escolha de Sofia entre maternidade e carreira, já que os currículos de mulheres na idade fértil – e principalmente recém casadas – são recebidas pelos recrutadores brasileiros com o mesmo pavor que uma mãe de um recém-nascido o coloca no berço após horas ninando o ser e temendo ouvir aquele “hééé…” de quem encostou no colchão e logo acordou).
São muitos os fatores que tornam a gravidez algo muito mais trivial à realidade israelense. A começar pelo fato de que no âmbito profissional a licença maternidade pode ser estendida em até um ano – no entanto, sem remuneração após o 3o mês – o que não onera o empregador, evitando assim qualquer preterição à contratação de geradoras de seres humaninhos.
Não somente, aqui qualquer auxílio nas tarefas domésticas é algo que apenas uma pequena parcela da população pode se dar ao luxo – digno de um país de primeiro mundo, onde todo emprego é valorizado e, portanto, custa caro. Isso não significa apenas que no nono mês de gravidez a faxina fica sim apenas ao alcance das mãos, já que abaixar não está no portfólio.
Significa também que se a criança fica doente e não pode ir à escola, é totalmente normal que os pais (tanto o pai quanto a mãe) o levem para o trabalho, o que corrobora para que todo o processo de mater-paternidade, inserido em todas as esferas da sociedade se torne cotidiano, e assim, normal.
E o termo normal não se aplica apenas à trivialidade com que a gravidez é encarada por aqui. Parto, em Israel, tem que ser sinônimo de normal. Procure falar “cesárea” perto de algum profissional da área da saúde. O cara pode ter enfrentado guerras e confrontos mil, mas fica de cabelos em pé quando ouve esse termo.
A cesárea, em Israel, é vista como aquela opção depois da última. Para a realização de uma cesárea programada – ou seja, não emergencial, é necessário passar por um comitê médico que possa conceder um aval. O obstetra que acompanha o neonatal, sozinho, não é suficiente para que a gestante opte pela césarea, é necessária a concessão deste comitê, motivada e com justificativas maiores do que simplesmente a preferência.
E de tão apegados ao estilo natural, a anestesia aqui que virou “anormal”. Quando num curso de parto – que é recomendado às mães de primeira viagem uma vez que o parto não é realizado por médicos, e sim por parteiras, que exigem a sua colaboração e entendimento do processo – o que acreditem, é prato cheio para o próximo texto – a questão colocada não é se é preferível um parto normal ou cesarea – pois como dito, essa escolha não cabe à gestante, mas sim sobre a aplicação ou não da epidural. Sim, isso mesmo que você leu – mais da metade das israelenses prefere não ser anestesiadas de nenhuma forma para dar à luz, e isso ainda é motivo de extremo orgulho na sociedade. É tipo o “parabéns pelo nascimento do seu filho” – “obrigada, foi sem epidural”.
Por fim, a sociedade tratar a gravidez assim com tanta normalidade, também tem seu lado negativo. Perde-se o caráter de situação especial, que faz toda a diferença naquele ônibus lotado no horário do rush. Preferência para sentar em restaurante, pagar uma conta no banco ou poder descansar as bisnagonas que não entendo porque continuam chamando de “pés” nessa fase, já que há uma completa desconfiguração do membro, acreditem, não é nada óbvio por aqui.
Outro dia, dentro de um ônibus lotado e ante a negligência da maioria em ceder o assento às grávidas, me vi no meio de um jogo de super trunfo com outras duas mulheres: “eu estou de 30 semanas” – “ah mas eu tenho hemorroidas” – “beleza, senta aí”. Garanto que se eu andasse com um cartaz: “se eu não sentar vou ter que fazer cesárea”. Acho que não teria uma pobre alma que não cederia à esse super hiper mega trunfo.
Gravidez é normal, o parto é normal. A pater-maternidade é muito mais normal do que tudo que já havia vivido no Brasil. O que nunca vou achar normal é essa história de não cederem lugar para as portadoras de melancia sentarem no o ônibus…
9 Comentários
A biggest fã da Isabella não podia ser outra senão sua “ídiche mame”
Amo seu bom humor expresso nos textos.
Sucesso!!!!
Excelente
Isabella, adorei seu texto! E que baita coincidencia, sou libriana e advogada morando fora do pais tb!
Na minha coluna desse mes, janeiro, tambem falarei um pouco sobre o panico que os ingleses sentem ao ouvir a palavra Cesariana. A unica diferenca e que aqui todos levantam no onibus e metro, mas nada de fila preferencial para gestantes em bancos ou supermercados como no Brasil. Sucesso pra vc e sua familia em Israel. Abs.
Isa, que texto maravilhoso!!! Meus pais estão morando em Israel e cada dia tem uma história. Essa terra é demais! Aliás, se precisar de qualquer coisa pode falar com eles 🙂
Acho que se os homens dessem à luz esse tratamento “ao gestante” seria bem diferente…
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Olá Isabella.
E como é a nível de seguro? Você tinha um seguro normal de residente ? E como foi a escolha do hospital, alguma indicação de alguém conhecido ou teve que pesquisar ?