O nascimento de um brasileirinho de parto natural domiciliar na Holanda
No sábado, dia 10 de novembro de 2018, depois de uma noite de ansiedade e preocupação, Noah veio ao mundo. No seu tempo, do seu jeito. E quase do jeito que sua mãe, a paraibana Nathalee Martin, sonhou. Aos 35 anos, a administradora de empresas – que hoje trabalha com fotografia e mora desde 2015 em Rotterdam, na Holanda – deu à luz ao seu segundo filho. Como da primeira vez, ainda no Brasil, o parto aconteceu em casa. Mas aqui, diferente de lá, isso já estava nos planos.
Olívia, a primeira filha de Nathalee, hoje com quase 4 anos, nasceu inesperadamente assim que completou o tempo mínimo regular (38 semanas). Noah, ao contrário, deixou para o “último dia” do aceitável pela maioria dos médicos e midwifes (parteiras): nasceu com 41 semanas e seis dias de gestação. Eu conversei com Nathalee e pedi que ela me contasse como foi a sua experiência de gravidez e parto na Holanda, onde 30% dos nascimentos acontecem dentro de casa – o maior índice do mundo.
Quando e com quem foi a sua primeira consulta de pré-natal?
Eu descobri que estava grávida antes de viajar pro Brasil de férias, em fevereiro. Como estava no Brasil, fiz as primeiras consultas lá, assim como as duas primeiras ultras (8 e 13 semanas). Ao voltar pra Holanda, logo agendei o pré-natal na Clínica de Parteiras (Verloskundige Centrum), que é o procedimento inicial padrão aqui. Na primeira consulta, refizeram a ultra e os exames de sangues e de fator Rh.
Quantas vezes você foi ao ginecologista na Holanda durante a gravidez?
Nenhuma até as 41 semanas, porque não precisei. Quando há qualquer problema, a midwife encaminha para obstetra e deixa de acompanhar a gestante. Como a minha gestação não apresentava risco fora do habitual, meu pré-natal foi todo na Verloskundige Centrum. Lá, fazem o acompanhamento padrão exatamente como no Brasil: ultras, exames de sangue, pressão, escuta do coração do bebê, peso da gestante. Tive uma alteração hormonal que não foi acompanhada lá, mas pelo médico de família (clínico geral), com exames de sangue rotineiros. Ao passar das 41 semanas, precisei ver um obstetra para ter certeza de que estava tudo bem. Estava chegando às 42 semanas e, nesse caso, a maioria das midwifes não faz mais o acompanhamento, passando para o obstetra que atende no hospital.
Qual a principal diferença entre o pré-natal da sua primeira filha (feito no Brasil) e o do segundo filho, feito aqui?
Acho que a maior diferença é a tranquilidade. Aqui, senti que gravidez é vista realmente como algo natural e não como uma doença. Fui bem assistida na clínica que escolhi, fiz todos os exames que precisava e não havia nenhum tipo de terrorismo emocional sobre a condição de estar grávida. Minhas gestações são bem tranquilas, o que ajuda bastante.
Você me contou que Olívia, sua primeira filha, nasceu em casa de surpresa.
Sim! Meu desejo sempre foi parir em casa, mas não encontrei uma equipe alinhada com os meus pensamentos em João Pessoa, onde eu morava, então decidimos pelo parto sem intervenção (natural) no hospital. Com 38 semanas, Olívia resolveu vir ao mundo. Tinha sido um dia normal: almoço na minha avó e depois TV em casa. Às 18h, a bolsa estourou. Eu não estava sentido NADA e não liguei para médica. Achei que ainda tinha muito tempo. Nessa hora você não pensa. Eu estava na partolândia e não sabia! Não deu tempo nem de a doula chegar! As contrações evoluíram rápido. Olívia coroou. Foi uma mistura de susto e encantamento. Nessa hora eu só disse pro marido: “Amor, ela vai nascer aqui!” Rafael perguntou o que faria e eu falei: “Segura ela quando ela sair. Só isso!” E assim, no chão de nosso quarto, às 19h50, Rafael, eu e Olívia fizemos o seu parto. [Leia aqui o relato completo e emocionante do parto de Olívia.]
Qual foi o momento mais difícil da gravidez de Noah?
A minha gestação correu com muita normalidade. Tivemos um pré-natal atencioso e humanizado. Mas a semana anterior ao parto foi difícil justamente porque eu estava com mais de 41 semanas. Alguns profissionais começaram o discurso da bomba relógio. Houve uma pressão quando fui fazer o cardiotoco de rotina no hospital para realizar uma indução, como se o bebê fosse morrer no exato momento que cruzasse a barreira para a 42a semana.
Foi uma prova de fogo. Na sexta, dia 9, eu não estava tranquila e passei a noite em claro. Algo me dizia que era desnecessário induzir, não era o certo. Levantei no dia seguinte decidida a falar com uma parteira que topava acompanhar gestações saudáveis para além de 42 semanas num parto domiciliar. Eu, no auge das 41 semanas, queria trocar de equipe! Ela me acalmou, explicou que eu tinha inúmeras opções e jamais precisaria fazer uma indução indesejada. Ela me aconselhou a conversar novamente com as minhas parteiras e foi aí que tudo mudou!
E nesse mesmo dia o Noah nasceu. Como as coisas evoluíram tão rápido?

Noah: “Incrível como a mamãe”
A parteira veio para uma visita, desabafei e ela me acolheu. Pediu desculpas pelo mal entendido com a equipe da clínica, cancelou a indução que o hospital havia marcado forçadamente e, após debatermos bastante, realizou o descolamento de membranas – que só pode ser feito quando há algum tipo de dilatação. Eu já estava com 4cm e não sentia nada. Ela até se espantou.
Isso foi ao meio-dia. Ela foi embora me deixando serena e garantindo que até domingo o bebê nasceria. Fui ao supermercado e comecei a sentir dores na lombar. Liguei para uma amiga para lembrar das fases do trabalho de parto (TP) e depois de 10 minutos de conversa ela me disse: ligue pra sua midwife que você já está em TP ativo. A minha bolsa estourou antes que eu desligasse o telefone.
Três contrações a cada 10 minutos. Eram 16h30h. A parteira achou que ainda ia demorar pelo menos mais uma hora. Ela estava terminando uma visita e viria em seguida. Só que as contrações aceleraram loucamente e, quando eu vi o aplicativo de acompanhamento, um aviso ENORME dizia “VÁ PARA O HOSPITAL OU CHAME SUA PARTEIRA, O BEBÊ VAI NASCER IMEDIATAMENTE!” Eu e Rafael só dizíamos: DE NOVO NÃO!
Ele ligou novamente pra parteira. Eu já sentia Noah indo e vindo no canal. Eis que a parteira chega correndo pelas escadas! Foram quatro puxos. Quarenta minutos depois que a bolsa rompeu, Noah nasceu com 4 quilos, mais de 50cm, Apgar 9/10 e de 41 semana e 6 dias!
Olívia, que estava na sala com a vovó, subiu correndo e viu a exata hora que o irmão estava vindo pros meu braços! Suas primeiras palavras foram “Oi, neném! Tem creminho em você.”
E a piscina, que já estava montada no quarto, não deu tempo de ser usada. Mas a parteira, sabendo da nossa vontade, encheu e preparou tudo pra que eu pudesse usufruir daquele desejo junto dos meus dois filhos!
Você pensou em mudar de decisão sobre o tipo de parto que queria?
Sim, se fosse realmente necessário. Jamais arriscaria a minha vida ou do meu bebê por um desejo. Mas dentro do quadro normal da minha gestação, não. O plano sempre foi um parto domiciliar assistido pela equipe de parteiras e seguimos com ele até o fim, justamente porque era possível.
Como foram as 48 horas seguintes ao parto?
Assim que Noah nasceu ele veio pros meus braços! Esperamos o cordão parar de pulsar e o pai cortou. Noah ficou comigo por uma hora sem interrupção. Depois ele foi pesado, examinado e então fomos pra piscina morna juntos. A recuperação de parto normal é incrível, meia hora depois de parir você tá novinha, tem até que se controlar porque o útero ainda está sofrido, né? Na segunda-feira, a parteira veio fazer a primeira visita pós-parto. Tomei a injeção de fator RH que ela mesma aplicou em casa. Conversamos bastante. Depois dessa, houve mais duas visitas domiciliares, uma delas pra fazer o teste do pezinho, que aqui é feito com 72 horas de vida, também em casa.
Quais os pontos positivos e os negativos de engravidar e dar à luz fora do seu país?
O negativo eu acredito que seja a falta de rede de apoio. Tenho uma filha de quase 4 anos e não tinha com quem revezar nos dias de mais cansaço e sono durante a gravidez. Agora no pós-parto minha mãe está aqui, mas é provisório. Não ter essa rede de apoio nos primeiros meses do bebê deixa o processo mais cansativo e desgastante emocionalmente.
Pontos positivos pra mim são os mesmos de morar fora – qualidade e estilo de vida. No meu caso, que sempre quis parto natural domiciliar, estar na Holanda foi uma mão na roda. No Brasil, quando grávida de Olívia, visitei seis obstetras pra achar uma que topasse acompanhar um parto normal de forma humanizada. A luta foi grande.
O que você diria para as brasileiras que estão grávidas ou pensam em engravidar e já moram ou estão de mudança para a Holanda?
Você é a dona do seu corpo. Ninguém pode te obrigar a nada. Então se informe e lute pra ter a sua vontade respeitada. Tenha conhecimento do seu corpo, do processo de gestar e dar à luz. Procure ajuda se estiver insegura, faça os cursos que os centros de parteiras oferecem. Acima de tudo, confie em você e no seu corpo!
8 Comentários
Linda história e lindo texto! Ops! Caiu uma lágrima aqui. 😍
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