Literatura infantil inglesa x brasileira
Minha filha já estava totalmente adaptada na escola primária e parecia feliz. Mas na minha cabeça, algumas coisas sobre a educação dela e a perda da identidade brasileira me preocupavam. A medida que o tempo ia passando, minha filha se aproximava mais e mais da cultura britânica que, cá entre nós, nada mais era do que o esperado. Mas e o Pedro Álvares Cabral? E a Emília e a Narizinho? E a Turma da Mônica? Acho que já estava na hora do Willy Wonka visitar o Sítio do Pica Pau Amarelo!
Minha filha tem o cabelo loiro escuro, é clarinha, e se você não souber de onde ela vem, pode achar que ela é inglesa. Mas ela jamais gostou que achassem que ela era qualquer coisa que não fosse brasileira. Aliás, sempre que pudesse, deixava claro que era brasileira e que falava português.
O “R” que soa como “H”
O nome dela, Rafaella, nunca deixou dúvidas de que ela era estrangeira e desde cedo aprendeu a explicar o motivo pelo qual a chamávamos de Rafa (nunca quis mudar a pronúncia do nome dela, sempre foi chamada de Rafa do jeito que pronunciamos no Brasil. Não é porque mudamos para a Inglaterra que agora a chamaríamos de Rafa com o R de red (cor vermelha em inglês). Ainda pequena, ela aprendeu que em português o som do R era o mesmo que o do H em inglês e era assim que explicava a escrita e a pronúncia do seu nome a quem perguntasse. Mas é óbvio que isso não impediu que os convites para festas viessem muitas vezes endereçados a Haffa.
No nosso primeiro ano aqui não insisti muito em ler histórias em português, pois apesar de falarmos a língua em casa, ela precisava aprender inglês rápido e de maneira eficiente. Mas depois chegou a momento de estabelecer um equilíbrio entre as duas culturas.
A introdução aos clássicos da língua inglesa
Na escola ela foi apresentada aos grandes autores infantis da língua inglesa: Roal Dahl, Dr. Seuss, Beatrix Potter, Lewis Carroll. Mergulhamos juntas nos clássicos “A Fantástica Fábrica de Chocolate”, “Matilda”, “Alice no País das Maravilhas”, “Peter Rabbit”, “O Gato da Cartola”. Descobrimos outros também muito divertidos como “The Very Hungry Caterpillar”, “The Gruffallo”, “The Tiger Who Came to Tea”, “The Adventures of Captain Underpants”, “Gangsta Granny” e a coleção favorita da minha filha “ Mog Time Treasure”, que conta as peripécias de uma gata muito simpática. Para explorar mais livros que toda criança deve ler antes de deixar a escola primária, acesse este link.
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Pra mim essa aventura foi super interessante. Foi diferente ler alguns desses livros com ela num outro ambiente, imersa numa outra cultura. A rotina de contar histórias na hora de dormir era uma delícia! Mas tinha chegado a vez de contar histórias em português, falar das lendas e dos folclores brasileiros, saber direito quem eram a Mônica, o Cebolinha, o Cascão e a Magali.
A revanche da cultura brasileira
Mais uma vez o bloco “Família Unida” entrou em ação e em pouco tempo começamos a receber as encomendas. O pai da Rafa mandou vários livros do Monteiro Lobato e gibis da turma da Mônica, minha mãe mandou Cecília Meirelles, Ziraldo, Ruth Rocha e Maria Clara Machado. Minha irmã mandou filmes como Tainá e O Castelo Rá-Tim-Bum. E eu já tinha trazido o CD de Os Saltimbancos e A Arca de Noé I e II. A munição estava pronta!
Com a leitura dos livros em português o vocabulário dela expandiu, nos duas nos divertimos e eu sosseguei. Tinha certeza que o Brasil, de uma forma ou de outra, nunca ia sair de dentro da gente. Mas e o Pedro Álvares Cabral e a descoberta do Brasil? E o hino nacional?
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Na primeira oportunidade que as crianças tiveram de escolher um país para fazer e apresentar um trabalho a respeito dele, a Rafa logicamente escolheu o Brasil. Aprendeu direitinho sobre a capital do país, soube justificar as cores na bandeira nacional e outras coisas relevantes que explicou aos colegas. Fizemos brigadeiro e a super mãe aqui foi atrás de guaraná para levar no dia da apresentação. Sucesso total!
Tivemos muita sorte durante a escola primária, pois num ano a escola organizou uma apresentação de capoeira, num outro ano resolveram fazer um bloco de carnaval e a copa do mundo no Brasil foi exatamente durante o último ano da Rafa lá. Parecia que o universo estava a nosso favor, qualquer desculpa servia para falar do Brasil e isso foi super útil para nós duas. Ser brasileira estava em alta!
Minha experiência mostrou que mesmo morando fora do Brasil, ainda dá para manter a brasileirice das nossas crianças. A gente tem que dar um empurrão, mas lá na frente percebe que tudo valeu a pena. Ok, sei que vai ser difícil minha filha saber de cor o hino nacional, mas hoje, quando vejo minha filha adolescente ouvindo música brasileira que eu apresentei pra ela, meu coração se aquece.
4 Comentários
Oi Andrea tudo bem?! Quantos anos tinha sua filha quando chegaram na Inglaterra? Cheguei na Escócia tem 10 dias, vamos morar aqui, tenho uma filha de 8 anos, estamos vendo a casa e a escola, muito em breve ela começará a estudar e estou bem aflita com o primeiro dia de aula, apesar da empolgação dela imagino que esse início seja meio complicado né? Alguma dica pra mãe com o coração na mão aqui? Rs
Oi Debora, minha filha tinha 4 anos quando chegamos. Que otimo que sua filha esta empolgada, isso ja e meio caminho andado. Com a sua ajuda, mesmo sendo dificil o comeco, ela vai conseguir – e voce tambem. A melhor dica e levar um dia de cada vez e manter a mente aberta a nova cultura. Claro que a saudade vai bater mas tem muita coisa boa esperando pra ser descoberta por voces ai na Escocia! Boa sorte para voces!
Eu fico emocionada ao ler seus relatos. Me vejo em breve nestas mesmas situações. Obrigada por compartilhar.
Bruna,
Muito obrigada pelo seu comentario tao bacana. Me sinto honrada de poder dividir meus artigos com pessoas como voce.
Boa sorte pra voce ness mudanca, vai dar tudo certo!
Andrea