Acesso à leitura para crianças na França.
Leitura, música, cinema, teatro. Entrar em contato com esse universo desde pequeno é algo que sempre quis para meus filhos. Aqui na França, me surpreendi com a facilidade e incentivo que dão à cultura para as crianças.
Desde que aqui cheguei, há 2 anos, fico encantada com algumas cenas que presencio. Dá gosto de ver uma criança em alfabetização ouvindo música clássica no seu quarto enquanto lê uma coleção para alfabetizando. Outra que pega um livro novo numa tarde de domingo e senta no sofá por horas com ele. Ou ainda uma que ganha um novo exemplar de uma história em quadrinhos e na mesma tarde o lê inteiro. Também é muito comum vê-las com seus livros em estações de trem, restaurantes, salas de espera e mesmo em shoppings enquanto acompanham seus pais.
Uma pesquisa realizada em 2016, pelo Instituto Ipsos, encomendada pelo Centro Nacional do Livro (Centre National du livre), com 1500 crianças e jovens de 7 a 19 anos, mostrou que a leitura faz parte do cotidiano de 89% deles.
A revista Bubble, distribuída gratuitamente em lojas infantis, entrevistou o responsável pelo estudo, Armelle Vincent Gérard, que conta:
8 de cada 10 entrevistados pelo estudo leem por prazer, reservam pelo menos 3 horas por semana para isso e leem 4 livros por trimestre.
Segundo ele, o ambiente influencia totalmente no hábito, principalmente em casa. Os pais são exemplo. Se associar a uma biblioteca e participar de eventos de leitura é importante. E possuir um computador, televisão ou celular pessoal, no caso das crianças, afeta negativamente o tempo destinado aos livros. Acesso maior que 12 horas semanais à internet também contribui para uma frequência menor de leitura.
Investir desde pequeno
Livros são minha paixão e algo que me preocupo muito em passar para frente. Por isso, minha filha de 2 anos tem vários. Eu compro, mas a família também a presenteia bastante com eles. Todo natal, aniversário e até na páscoa chegam livrinhos.
Eu adoro ir até a seção infantil das livrarias e sinto que as publicações para os pequenos aqui têm uma variedade maior que no Brasil, pelo menos em exposição. Há uma gama enorme de livros sensoriais ou interativos para bebês, e outros com textos muito sensíveis, daqueles que nos deixam de olhos marejados. os preços variam de 5 a 10 euros para a maioria deles, mas podem chegar até a 20 euros dependendo do exemplar (estes geralmente são grandes, com pop-ups que saem das páginas quando são abertas).
As malas do Brasil também voltam com diversos exemplares, pois acredito na importância de estar sempre em contato com o português e amo a sua sonoridade. Agora que minha filha já sabe manipular os livros de papel simples, as opções são bem maiores na nossa língua.
Alternativas à compra e biblioteca de bairro
Mas não é apenas comprando ou ganhando que os pequenos têm esse contato. Nós descobrimos há um tempo a pequena biblioteca associativa do nosso bairro. Os adultos pagam 15 euros por ano para terem direito a empréstimos de livros. Menores de 18 anos não pagam, é necessário apenas fazer a inscrição, que dá direito a levar 6 exemplares para casa por 3 semanas.
Foi lá também que começamos a frequentar, de 15 em 15 dias, gratuitamente, a contação de histórias para bebês de 18 meses a 3 anos. Aberta mesmo para aqueles que não são associados. Quando fomos pela primeira vez, fiquei na dúvida se haveria pouca gente. Que nada! A sala lotou e algumas crianças não puderam entrar. A procura é realmente grande. Das vezes seguintes, a mesma coisa.
Durante a sessão, a contadora abre sua maleta e tira uma a uma as histórias selecionadas, que são “contadas” pela “madame grenouille” (senhora sapa), uma sapa de madeira, ou pela “madame la pluie” (senhora chuva), um instrumento musical rústico que faz o som da chuva caindo. Em alguma ocasião, pode haver uma criança mais velha recitando versos ou um pai tocando algum instrumento musical, como o saxofone. É um momento em que adultos e crianças ficam encantados.
A biblioteca também tem sessões quinzenais de contos e cantigas para as crianças de 4 a 7; para as de 9 a 14, há manhãs para trocar experiências de suas leituras.
Leia também: 6 livros infantis para iniciar o hábito da leitura em português
Além disso, em feiras de usados, muito comum aqui na França nas trocas de estações, dá para comprar livros por 1 ou 2 euros. Algumas pessoas vendem por lotes e a unidade pode chegar a poucos centavos apenas. Uma ótima oportunidade!
Parceria com escolas e creches
Uma vez por mês, as crianças maiores da creche da minha filha saem para fazer uma visita à biblioteca, onde assistem à contação de histórias exclusivamente. Também são organizados dias do livro, nos quais pais e responsáveis são convidados a lerem para seus filhos em um espaço montado para isso. Você pode ir com seu pequeno e passar algumas horas lá, ou apenas quando for buscá-lo, reservar uns minutinhos para a leitura.
A música também ganha ocasiões como esta. Algumas vezes, as crianças assistem a apresentações exclusivas, em outras, a família também é chamada para descobrir o som de diversos instrumentos com os pequenos. Na associação do bairro, há ainda atividades de musicalização e aulas para os maiores de 3 anos.
Nantes é uma cidade com muitas opções culturais, incluindo festival de cinema para crianças a partir de 3 anos, algo que me deixou bem perplexa. A edição que aconteceu em 2017 teve uma semana destinada a programação para os pequenos: filmes principalmente, mas também leitura, jogos e apresentações durante o período de férias de outubro.
O mercado das histórias em quadrinhos
Que criança não gosta de histórias em quadrinhos? Com muitas imagens e dinamismo, elas logo ganham um espaço especial na vida de muitos dos pequenos. Eu me lembro que cada gibi da Turma da Mônica era devorado por mim quando criança. E esse é o formato que sempre pensei ser os das HQ.
Foi uma surpresa descobrir que aqui esse segmento possui uma variedade enorme de publicações, em formatos de livros, com papéis agradáveis ao tato e assuntos, temas e faixa-etária diversas. A França se consolida como referência nesse setor.
Descobri ainda que um dos meus desenhos animados preferidos da infância, Tin Tin, era uma delas. E mais chocada fiquei em saber que as aventuras do jornalista, em papel, fizeram parte da juventude da minha sogra e da infância do meu marido.
As livrarias possuem uma grande seção destinadas a essas publicações, que nem de longe são apenas para crianças e adolescentes. Recentemente comprei uma sobre mulheres durante a Segunda Guerra Mundial. Mas para os mais jovens, valem títulos como Garfield, Boule et Bill, Mortelle Adèlle, Asterix entre muitos outros.
Com um mercado tão variado e atraente, e atividades incentivadoras de acesso gratuito e fácil fica bem mais simples tornar a leitura um hábito e um prazer desde pequeno.
3 Comentários
[…] toda parte. Minha filha tem muitos. Já contei como a leitura é incentivada na França neste texto aqui. Hoje, quero aproveitar para falar um pouco de alguns livros em francês para ler com crianças […]
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