Antes de chegarmos aqui, quando ainda estávamos na fase de planejamento e pesquisas, escutamos várias pessoas falando sobre a educação em Portugal, todas com a mesma opinião que o ensino aqui seria mais rígido. Já sabíamos disso e nossa decisão de vir morar em outro país também passava por oferecer algo a mais para nosso filho. Entretanto, escutar algo de alguém e observar de certa distância não é a mesma coisa de vivenciar. Quando o contexto muda totalmente, existem muitas coisas envolvidas. Uma adaptação em outro país nos convida a sermos resilientes, a respeitar todas culturas e a testar nossa superação.
O sistema de ensino em Portugal
O sistema educacional português está dividido em diferentes níveis de ensino, essencialmente sequenciais. Tem início na educação pré-escolar, com um ciclo de frequência opcional dos 3 aos 6 anos de idade. Esta fase se chama Infantário, para nós brasileiros corresponde ao infantil. Continua com o ensino básico, que compreende três ciclos sequenciais: O 1.º ciclo de 4 anos (dos 6 aos 10 anos de idade); o 2.º ciclo de 2 anos ( dos 10 anos aos 12 anos de idade), correspondendo ao CITE 1; e um 3.º ciclo com uma duração de 3 anos (dos 12 anos aos 15 anos de idade), correspondendo ao CITE 2. Segue-se o ensino secundário, que corresponde a um ciclo de três anos, dos 15 aos 18 anos de idade, correspondendo ao CITE 3, e que inclui sete tipos de cursos: Cursos Científico-Humanísticos, Cursos Profissionais, Cursos Artísticos Especializados, Cursos com planos próprios (Cursos Científico-Tecnológicos), Cursos de Ensino e Formação de jovens.
Nossos desafios
Aqui já observamos muitas mudanças nestas sequências. Se você optar por colocar seu filho em escola pública, nem sempre ele ficará na mesma escola todas as fases. É o que está acontecendo com o Pedro. Outra coisa é o tipo de educação que se pratica nas escolas. Pedro sempre estudou em uma escola com programa de Inteligência Emocional no Brasil. Quando chegamos em Portugal, é muito difícil encontrar uma escola com algo que seja parecido, são poucas e são mais as particulares.
Ele chegou com 5 anos, logo conseguimos matricular em um Infantário. Quando iniciou, percebi uma certa exigência em relação ao comportamento dele. A educadora, como chamam a professora no Infantário, procurou falar comigo sobre o comportamento do Pedro. Ele estava já adaptado com o colégio em que estudava e foi um grande impacto, uma grande mudança em sua vida por completo. Nós entendíamos muito bem o comportamento dele, afinal, estava recém-chegado e vivenciando um período de “luto”. Deixou lá no Brasil a família, amiguinhos da escola, a professora que ele já estava adaptado, o cachorrinho que ele até hoje fala com saudade, ou seja, inúmeras perdas que aconteceram por nossa escolha.
Era compreensível que uma criança de 5 anos tivesse comportamentos que fossem diferentes do que as educadoras desejavam. Ele estava enfrentando um grande desafio em sua vida. Chegou em um país diferente, uma língua “diferente”, com uma educação mais formal e autoritária na escola e no seio familiar. Como minhas formações são em Coach Familiar e Educação Parental, nós estávamos sempre re-significando, orientando, acolhendo e o ajudando a superar esses desafios. Eu sempre estava em contato com a escola e com a educadora para fazermos um trabalho em equipe. Tendo consciência de que estou em uma outra cultura, preciso em casa intensificar nosso trabalho de educar o Pedro de maneira gentil e, se necessário, firme, com respeito mútuo, empatia e muito amor.
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Contudo, as mudanças não pararam de acontecer. Quando ele já estava mais adaptado com a escola e com as educadoras, tivemos que mudá-lo outra vez de escola, pois agora ele tinha completado 6 anos e iria iniciar sua alfabetização. Eu já tinha sido avisada que nesta fase as regras eram mais rígidas e as professoras tinham mais autoridade e eram muito mais exigentes. Mais uma vez reiniciamos uma fase intensa de adaptação. Realmente aconteceu tudo como tinham me dito. Na verdade, nesta fase por si só já acontece uma grande mudança para qualquer criança. A iniciação da alfabetização é muito importante e muito diferente das atividades praticadas no infantil.
Sabe aquela frase a primeira impressão é a que fica? Realmente não foi somente a impressão, mas foi a realidade se apresentando para nós na reunião dos pais. Havia um clima de autoritarismo ainda maior, e sabe aquela outra frase que diz: fatos são fatos , o que você vai fazer com eles é o que faz a diferença? Não demorou muito e já fui chamada pela professora para conversar sobre o Pedro. Ele se recusava a fazer algumas atividades na escola. Eu já fui contando mais uma vez sobre toda a readaptação que ele estava passando e pedindo um pouco de compreensão. A intenção da professora é fazer seu trabalho e passar o cronograma de matérias a ser estudadas no tempo dela e da maneira que ela entende, ou melhor, do seu jeito e ponto.
Repetidas vezes tive que ir à escola conversar com a professora para conseguirmos ajudar o Pedro nesse novo que se apresentava para ele. Acreditamos que quando conhecemos nossos filhos conseguimos ajudar os professores, nos colocamos sempre à disposição de sermos parceiros da escola. Eu fiz uma carta com muitas características do Pedro e como ele reagia melhor para ajudar a professora a conhecê-lo e a ter um melhor relacionamento com ele. Ganhamos muito com isso. Contudo, logo veio a quarentena e percebi que ele começou a ter aulas online duas vezes por semana e um plano de estudos enviado diariamente para que cumpríssemos. Sabe o que aconteceu? Tudo correndo muito bem em casa, afinal, nada melhor do que nossos filhos terem nossa atenção e dedicação, o que realmente fica impossível para os professores conseguirem com tantas crianças.
O que aprendemos até agora
Ensinar ao Pedro sobre a habilidade de resolver seus próprios desafios, de tomar iniciativas com respeito, cooperação e acima de tudo de se sentir capaz é capacitá-lo para vida. Fazer uma parceria com a escola é importante para entendermos a melhor maneira de ajudar nossos filhos. O melhor que temos a fazer é dialogar, orientar, fazê-lo entender e atender as regras da escola para que ele tenha um melhor relacionamento e desenvolvimento escolar e pessoal, afinal, estamos ajudando a construir um adulto, pretendemos que ele seja bem resolvido.
1 Comentário
Adorei o seu texto. Obrigada pela reflexão. Tenho dificuldades em aceitar alguns valores da sociedade americana. Sempre faço comparações, e explico para a minha filhota de 10 anos. Um abraço,
Rachel