Brasileirinhos mundo afora e nacionalidade
Desde que mudamos do Brasil, dentre ida e vindas, tivemos nossos três filhos. Sempre foi muito comum nos perguntarem sobre a nacionalidade deles. Nossos três filhos são brasileiros. Eu e o meu marido, por diversos motivos, optamos em tê-los no Brasil. Era uma tremenda logística para preparar a chegada das crianças longe de casa. Em contrapartida, queríamos estar junto à família e amigos, além de poder contar com a ajuda médica brasileira.
Mesmo com toda a dificuldade, eu já tinha minha obstetra e amiga querida. Esse anjo em nossas vidas acompanhava minhas gestações de alto risco à distância. Ela nos ajudava a programar a ida para o Brasil com segurança e no limite máximo possível. Assim, nossa decisão não foi muito pensando na nacionalidade das crianças, mas sim na segurança do parto e confiança na parte médica. Graças a Deus correu tudo bem.
Mas esse não é o assunto desse texto. Dessa vez queria falar sobre a nacionalidade de brasileiros mundo afora.
Perguntas para quem mora fora do Brasil e tem filhos
Dentre as perguntas que nos são feitas, o seguinte questionamento é recorrente: “Por que vocês perderam a chance de dar outra nacionalidade para as crianças?”.
Além de adorar escrever, a minha formação é em Direito e, apesar de não estar atuando na área no momento, adoro lecionar Direito Internacional e Constitucional. Eu sempre gostei desse tema, dentro das matérias que leciono e na vida. Aqui não será uma aula, nem um artigo científico, mas não há como tratar do tema sem defini-lo.
Nacionalidade e os laços criados
“Quem nasce nos Estados Unidos, filho de brasileiros, é americano ou brasileiro? Quem nasce na Itália, filho de brasileiros, é italiano ou brasileiro?” Para definir nacionalidade vou usar as palavras de um autor e professor que tem um livro incrível sobre Direito Constitucional, Pedro Lenza*. Ele explica:
Nacionalidade pode ser definida como o vínculo jurídico-político que liga um indivíduo a determinado Estado, fazendo com que esse indivíduo passe a integrar o povo desse Estado e, por consequência, desfrute de direitos e submeta-se a obrigações.”
Através do conceito vemos o quanto a nacionalidade é importante para o futuro de uma pessoa. Os pais são os responsáveis por definir inúmeros fatores no futuro de seus filhos e um deles é a nacionalidade. A criança esperada integrará o povo desse Estado passando a ter direitos e obrigações perante ele. Criará laços, fará parte de uma nova cultura, de um novo povo.
Por exemplo, se um país possui a regra de serviço militar obrigatório aos 18 anos para homens, sendo a pessoa nacional desse Estado, ele deverá cumprir esse requisito quando atingir a idade. Da mesma forma, possuindo a nacionalidade de um país a pessoa tem direito aos documentos oficiais, como o passaporte. Essa proteção jurídica faz muita diferença. Assim, caso esteja viajando e aconteça algum acidente natural durante a viagem, como um Tsunami ou furacão, terá ajuda de sua Embaixada ou Consulado mais próximo.
Condições de residência dos pais
Diante da importância do tema, a decisão sobre a futura nacionalidade da criança não é tão simples e deve ser muito bem resolvida pela família.
Também há outro ponto importante a se pensar para se formular a decisão. Em que situação (temporária, definitiva) se encontra a família no país em que nascerá o bebê? Se a situação for permanente, como imigrantes por exemplo, já existe uma decisão da família em criar novos laços de nacionalidade. Assim, a criança poderá seguir o desejo dos pais integrando um novo país.
No entanto, se a condição dos pais de permanência em Estado estrangeiro for temporária, como uma família expatriada a trabalho, como é o nosso caso, talvez, caso seja possível, o mais prudente seja manter as relações com o país de origem. Essa foi a nossa opção. Entretanto, essa não é a única forma para se manter os laços com o país de origem, no nosso caso o Brasil. Há outras possibilidades como a residência permanente ou uma futura naturalização.
Primeiro precisamos entender como é atribuída a nacionalidade pelos países. Para isso, mais uma vez, precisamos entender alguns conceitos do Direito.
Como cada Estado define os seus nacionais
A nacionalidade pode ser originária ou adquirida.
Nacionalidade originária é aquela imposta ao nascimento. Há países que se utilizam do critério do jus sanguinis, ou seja, os laços de nacionalidade serão firmados pelo sangue e não pelo território de nascimento. A nacionalidade dos genitores é o que conta. Onde quer que a criança tenha nascido, ela receberá a nacionalidade por parentesco, ou seja, a nacionalidade dos pais. A maioria dos países europeus adota esse critério, priorizando os laços sanguíneos.
Dessa maneira, se um casal de brasileiros tiver um filho na Itália, que adota o critério do jus sanguinis, o filho será brasileiro e não italiano.
Outros países, por sua vez, adotam o critério do jus solis, a territorialidade. Para esses países o que importa é o local de nascimento. Os Estados Unidos adotam esse critério.
Mas existe ainda uma terceira via, que é o caso do Brasil que adotou os dois critérios. Assim, caso algum brasileiro tenha filho no exterior receberá a nacionalidade brasileira e para todos os que nascerem em território brasileiro também, independente se os pais são ou não brasileiros.
A nacionalidade adquirida, por sua vez, é a demonstração do desejo da pessoa em assumir aquela nacionalidade e ocorre pela naturalização.
Dúvidas sobre nacionalidade
Com tantas informações podem surgir outras questões como: uma pessoa pode ter várias nacionalidades? Ou, existe uma pessoa sem nacionalidade? E a resposta para as duas perguntas é: sim!
Para a nacionalidade originária, conforme prevê a nossa Constituição, não há limite – a pessoa pode ser brasileira e possuir quantas outras nacionalidades quiser/puder. Veja também o texto sobre nacionalidade na França, da Helena Silva.
Vivendo alguns anos fora do Brasil, temos visto muitos exemplos de famílias com múltiplas nacionalidades. Dessa forma, se pensarmos numa família de pai alemão, mãe brasileira e tendo o filho nascido nos Estados Unidos, qual seria a nacionalidade da criança? A criança terá as três nacionalidades, os três passaportes e direitos e deveres perante Alemanha, Brasil e Estados Unidos.
Mas também há conflitos em que uma criança possa não ter nenhuma nacionalidade. São chamado apátridas, ou heimatlos. Nesse caso, há uma proteção internacional de Direitos Humanos, fazendo com que essa criança possa receber uma nacionalidade. Existe uma proteção a todos porque a nacionalidade é direito fundamental de todo ser humano. Assim, isso pode acontecer em países que adotam o parentesco para a nacionalidade e os pais estrangeiros tiveram a criança lá. O país de origem dos pais, independente do critério que adote, dará a nacionalidade à criança.
E para os brasileiros no exterior?
Na prática, para nós brasileiros as autoridades consulares do país em que a família estiver morando serão o órgão responsável por expedir a certidão de nascimento de um brasileirinho nascido no exterior. Veja a página do Itamaraty na Alemanha para informações aos brasileiros que moram no país.
Quanto à naturalização, essa é uma opção feita por adultos em momentos oportunos e diferentes. Pode ser por questão de imigração, longo tempo de residência em outro país, etc. Mas atenção ao tomar essa decisão. Informe-se na embaixada ou consulado brasileiro do país onde você estiver residindo porque, em alguns casos, para se naturalizar em um país é mandatório abrir mão de sua nacionalidade brasileira.
Esse é o caso da Holanda, por exemplo. Ou seja, para se naturalizar holandês por tempo de moradia no país (e não por casamento ou laços sanguíneos) a nacionalidade brasileira é perdida e, com ela, o seu passaporte brasileiro. Já em outros países, como Inglaterra e Itália, por exemplo, é possível manter a nacionalidade brasileira ao se naturalizar inglês ou italiano, ou seja, a pessoa teria dupla (ou múltipla) nacionalidade, desde que comprovada a necessidade de naturalização, conforme prevê o art. 12, §4º, b, da Constituição Federal.
Bem, para a nossa família, mesmo se as crianças tivessem nascido na Holanda, que era nossa residência naquele momento, eles seriam brasileiros. A Holanda adota o critério do jus sanguinis e nós não temos parentesco holandês. Dessa forma, seguimos com a nossa nacionalidade brasileira.
*Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo, 2016, Ed. Saraiva.
7 Comentários
Todos os seus 3 filhos são brasileiros? Mas onde cada um deles nasceu? Aqui Angel tem tudo já brasileiro. Fui pro Brasil registrei minha certidão de casamento no cartório brasileiro (casei na Califórnia) e com meu novo nome de casada fiz meu novo RG e dix certidão de nascimento brasileira da Angel e RG também! Só não tive tempo de fazer CPF! Depois me conta onde cada um deles nasceu que fiquei curiosa! Bjosss
OI Lígia! Sim meus três filhos são brasileiros, nasceram em SP. Foi nossa opção porque eu tive que seguir um tratamento para gravidez de alto risco nos três casos e preferi seguir com a minha médica de SP. Mas tendo a possibilidade sempre é válido ter mais de uma nacionalidade!!!
Raquel, que saudades de você e das crianças!
Excelente texto. Keep writing. 🙂
OI Simone, estou firme aqui!! Seguimos em contato tem bastante novidade vindo por aí. Muito obrigada pelo carinho. Abraços de nós 5 saudade
Achei muito interessante teu texto, quis compartilhar mas nao funcionou…
Zandra, eu te adicionei no FB e enviei o link pelo Messenger. Tomara que dê certo! Muito obrigada. Um grande abraço.
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