O melhor versus o pior da Espanha: parte 2.
Continuando no “balanço” que faço nesse primeiro ano por aqui, cujo texto você pode conferir aqui , selecionei algumas coisas que me incomodam ou que me surpreenderam.
Acredito que o “não gostar” ou o “não aceitar”, dependa muito do estado de espírito que chegamos no nosso país de destino. Depende do motivo da mudança, da fase da vida, da personalidade de cada pessoa.
Quem chega com uma visão “romântica”, de que tudo fora do Brasil é perfeito, vai quebrar a cara lindamente.
Saber que lugar perfeito não existe é um ponto de partida necessário. Estar aberta a mudanças e aceitar o diferente e o imprevisível ajudam bastante. Os textos Um choque cultura às avessas: da Suíça para os Estados Unidos e A lagarta vira pupa, que vira borboleta ilustram bem esse difícil processo de mudança de país.
Porém, por mais amor que eu tenha pelo meu novo lar, ver tanto cocô de cachorro pelo chão realmente me irrita. E eu tenho cachorro, mas nunca deixei nenhuma sujeira para trás, seja em solo brasileiro ou europeu. Educação não depende de onde a gente viva. Vejamos:
O pior da Espanha
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Lixo
Quando se pensa em Europa se pensa em parques limpíssimos com seus lindos gramados verdes. Sim, eles existem. Porém, aqui na Espanha também há sujeira nas ruas, praças e parques e, especialmente, perto das lixeiras. Embalagem de comida, garrafas, latas, bituca de cigarro e cocô de cachorro são os mais frequentes.
Essa questão da sujeira me chocou mais no bairro que moro em Madri do que no pueblo que eu morava em Barcelona. Talvez seja mais um defeito das grandes cidades.
À despeito da falta de educação e consciência de algumas pessoas, a questão da reciclagem é bem mais difundida e praticada aqui do que no Brasil.
Especialmente em Barcelona é muito simples jogar o lixo reciclável. Há lixeiras nas ruas para jogar o lixo separadamente: vidro, embalagens (plástico, brics e metal), papel, orgânico e lixo comum. Há também pontos específicos para descarte de pilhas, baterias, celulares, cds etc.
Não é necessário andar muito para encontrá-las. Já aqui em Madri, nos bairros que conheço, só há pelas ruas contêineres para recolher vidro e papel. Os demais são jogados em lixeiras dentro dos condomínios. No meu prédio só há local para descarte de embalagens, óleo e lixo comum.
Eu faço questão que meu filho tenha a consciência da reciclagem desde pequeno. Ele sempre me vê separando e levando o lixo nas lixeiras corretas. Acredito que será algo natural para ele quando crescer.
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Cigarro
As pessoas fumam muito por aqui. Não dentro de locais fechados, mas nas ruas, praças, playgrounds, condomínios, terrazas (parte externa dos restaurantes). O que mais me incomoda são os pais, avós ou até mesmo professores que fumam perto das crianças. É senso comum que o cigarro é um vício que apenas traz malefícios para a saúde. Acredito que por essa razão se deveria evitar fumar em locais frequentados por crianças.
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Falta de acessibilidade
De uma forma geral há uma preocupação com acessibilidade, seja para idosos, cadeirantes ou carrinhos de bebês. Todas as estações de metrô mais novas possuem elevadores e há rampas nos prédios e museus, por exemplo. Contudo, vejo que ainda falta um pouco mais de cuidado nessa área.
Vou citar dois exemplos de estações de metrô que me incomodam pela falta de acessibilidade, pois são em locais muito significativos: estação Ciutadella/Vila Olímpica (L4) em Barcelona (dá acesso à Vila Olímpica onde os atletas e os paratletas se hospedaram em 1992) e estação Atocha (L1) (dá acesso a museus importantíssimos, como o do Prado e o Reina Sofia), que terá seu nome alterado para Estación del Arte. É justo dizer que das 33 estações da linha 1 do metrô de Madri, 17 são acessíveis e 16 não são. Por isso destaco que ainda há muito a ser feito.
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Para citar um ponto turístico que peca pela deficiência na acessibilidade, vou ficar com o Parque do Retiro. Local lindíssimo, frequentado por moradores e turistas, possui vários acessos apenas por escadas.
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Doces
A culinária espanhola é famosa e riquíssima. Os pães, especialmente na Catalunha, são excepcionais. Porém, quando o assunto são doces, na minha opinião, é difícil encontrar algo que seja bonito e gostoso. Ah! Que saudade dos nossos bolos!
Curioso que estando ao lado dessa vizinhança tão espetacular em matéria de doces, poderiam ter se inspirado nos deliciosos pastéis de nata portugueses ou nas bombas de chocolate francesas.
Enquanto isso, continuamos com bolo, brigadeiro e doce de leite caseiros e bem brasileiros na terra de Cervantes.
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Atendimento “preferencial”
Praticamente não existe atendimento preferencial para grávidas ou pais com bebês de colo. É muito comum pegar fila e ter que esperar (se virando para distrair a criança), seja em locais para lazer, como museus ou parques, ou em bancos e repartições públicas.
É claro que, se podemos, devemos evitar os horários de maior movimento. Porém, sem ter com quem deixar o bebê e ter que encarar uma fila de 1 hora na companhia elétrica não é fácil. Acredito que seria melhor para todo mundo passar a coitada da mãe logo e evitar que todos assistam ao choro e ao estresse.
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TV
Alguns canais de TV aberta possuem uma grade variada e com programas de bastante qualidade. Contudo, não conheço nenhum canal de TV aberta que possua a variedade e a qualidade dos programas da Globo, por exemplo (não estou defendendo o conteúdo veiculado pela Globo, apenas a qualidade inegável de suas produções).
É quase inexistente a programação voltada para o público infantil. Nesse ponto acredito que seja uma tendência, com Netflix e Youtube à disposição da criançada.
A transmissão dos jogos de futebol é bem mais simples do que no Brasil. Não tem nada no intervalo, como câmeras exclusivas, mesas tecnológicas, entrevistas etc.
Até a parada para os comerciais me causou estranheza. Não esperam um corte, um momento adequado. De repente você está vendo o programa e de repente está no comercial, sem perceber.
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De todos os pontos, um realmente me causou surpresa: a parcialidade. Durante o Referendo de 1-10-2017, eu estava em Barcelona. Vendo os fatos pelo canal local e pelo canal nacional, a sensação é que falavam de eventos distintos. Tanto é, que conversando com pessoas que assistiram em Madri, apenas pelo canal nacional, pouco sabem do que de fato aconteceu na Catalunha. Na época houve muita discussão, com jornalistas se queixando da falta de liberdade para trabalhar.
O que me deixa feliz é que as coisas boas são muitas e compensam as ruins. Das ruins, como a questão do lixo e do cigarro, dependem de decisões pessoais e a postura do meu filho será influenciada pela educação que recebe em casa.
Algumas coisas eu não destaquei como boas ou ruins, como o caso da saúde, pois são muito próximas da minha realidade no Brasil. Ou, são temas que ainda tenho pouca experiência, como no caso das escolas.
Enfim, encerro da forma como comecei: não existe lugar perfeito. Cabe a nós tornar especial o nosso entorno.
2 Comentários
Olá Thais,
Que ótimo! Estava lendo seu texto e lembrando de quando morava na Espanha…minhas queixas são muito parecidas: os doces terríveis; podem ser lindos, mas totalmente insípido. A fumaça do cigarro por toda parte me incomodava muito. No canal de TV aberta, a quantidade de publicidade com duração de 7 minutos e os breaks sem sentido nos filmes. E a a falta de atendimento preferencial, praxe na Europa, é uma grande falha; por muitas vezes fiquei em pé no metro com um barrigão o que claro, também entra a falta de bom senso.
Obrigada pelo texto e pelas lembranças.
Beijos
Olá, Marcela! Obrigada por seu comentário. Fico feliz que tenha trazido boas lembranças! E que bom que temos a mesma percepção! 🙂 Um abraço,
Thaís