Terapia ABA na Califórnia: um relato
Quando meu esposo chegou em casa com a notícia de que seríamos transferidos a trabalho para a Califórnia fiquei radiante! Você deve estar imaginando que é por causa da praia, palmeiras e sol, né? Conto que não foi isso que pensei!
Todas famílias que têm uma criança com necessidades educativas especiais estão sempre em busca de um atendimento de excelência para os seus filhotes. E eu já tinha conhecimento de que a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) era aplicada de forma intensiva no tratamento de crianças com diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) nos Estados Unidos.
Por que ABA?
Análise do Comportamento Aplicada (ABA), como o próprio nome já diz, é a aplicação da ciência da Análise do Comportamento, com evidências e comprovação científica. Para cada criança com TEA, faz-se necessário traçar um programa de intervenção individualizado de acordo com as suas possíveis necessidades em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades sociais, atividades de vida autônoma, linguagem, currículo acadêmico, coordenação motora, etc.
Conheça mais um pouquinho sobre ABA aqui.
Lembro que quando contei essa notícia para minhas colegas de profissão e para algumas mães com quem fiz amizade em salas de espera, muitas pediram para eu relatar como seria a terapia dele aqui. Bom, promessa é dívida!
Minha intenção é descrever a nossa experiência. Não pretendo julgar nenhuma abordagem terapêutica. É apenas compartilhar o que estamos vivenciando.
Nosso percurso
A primeira dificuldade foi ter recomendações de profissionais. Achei que por meio da escola conseguiria indicações de profissionais, mas não obtive informações precisas. Com o tempo, fui aprendendo que as escolas públicas não podem recomendar nenhum serviço externo para os pais.
O caminho percorrido da matrícula na escola até a terapia, passando pela avaliação por instituições para verificar a elegibilidade do meu filho aos serviços públicos, durou em torno de um ano. Foi tudo muito demorado, um verdadeiro exercício de paciência materna. Além do mais, o meu guerreiro estava com oito anos e meio, portanto, já tinha passado da fase de intervenção precoce para a qual a maioria dos serviços são voltados.
Devido à demora, e por recomendação médica, fomos à busca da Análise do Comportamento Aplicada (ABA) em clínicas particulares. Los Angeles é enorme. E como conseguir dados concretos?
Depois de pesquisar na internet, encontrei agências (aqui não se chama clínica) que fazem atendimento em Análise do Comportamento Aplicada. Por meio de conversas com outros pais na escola e da presença em feiras de serviços para pessoas com deficiência, finalmente decidimos por uma agência que o atenderia próximo de nossa residência. Algumas agências fazem atendimento domiciliar, mas achamos que não era adequado para o nosso filhote nesse momento.
A primeira sessão
O primeiro encontro foi com um profissional com certificação em Análise do Comportamento – BCBA (Board Certificated Behavior Analyst) que nos entrevistou. No mesmo espaço, durante a entrevista, outra BCBA observava o meu pequeno. Essa primeira reunião durou em torno de três horas.
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No final desse primeiro encontro, indicamos a nossa disponibilidade de horário. Estavam dispostos a atender o pequeno de segunda-feira a domingo e em alguns feriados do calendário americano. A quantidade de horas que acertamos na agência foi maior da que estávamos acostumados no Brasil, causando um impacto familiar: na logística e nas finanças.
O espaço físico
O espaço onde ocorre a terapia é simples. Cada criança tem a sua caixa com as iniciais do nome e sobrenome numa estante. Ali, estão os materiais, organizados em sacos plásticos e caixinhas, para uso na sessão conforme o programa individual desenhado pelo supervisor BCBA.
O consultório tem o estritamente necessário para que a programação ocorra, evitando distrações desnecessárias. Quem aplica a programação é o técnico em comportamento, Registered Behavior Technician (RBT). São pessoas acima de 18 anos, com o Ensino Médio concluído, com 40 horas de treinamento em Análise do Comportamento e supervisão. A cada dia da semana um técnico diferente atende a criança. Leia sobre RBT aqui.
A agência possui, além dos consultórios, uma sala com vários brinquedos sensoriais (trampolim, piscina com bolinha, colchão, luzinhas). Muitas vezes, agrupam as crianças nesse local para atividades em conjunto.
Há, ainda, uma pequena copa com o básico para atender os terapeutas e as crianças que necessitam fazer alguma refeição. Nesse local, algumas atividades da vida autônoma também são trabalhadas.
O funcionamento
Cada profissional (supervisor e técnicos) tem o seu tablet corporativo, no qual são alimentadas informações sobre o programa da criança, número de acertos e erros, preferências de reforçadores, relatórios descritivos de cada sessão e outros.
Todos profissionais (supervisor e técnicos) atendem nos consultórios com as portas abertas. As salas também possuem câmeras. Caso necessitem de algo, acionam a equipe por meio de mensagens via os tablets corporativos.
O supervisor sempre entra nas salas para orientar os técnicos e verificar o desenvolvimento da criança nas atividades e em relação à programação pré-estabelecida.
A agência só permanece aberta se dois terapeutas estiverem trabalhando no mesmo horário. Caso a sessão de uma criança termine mais cedo por algum motivo pessoal, o terapeuta espera o outro terminar a sessão ou o responsável buscar mais cedo a outra criança.
Após a sessão, cada técnico narra para os responsáveis como a criança agiu na sessão, como estava o seu humor, apetite ou se percebeu algo diferente.
Os responsáveis têm acesso a todos os dados do seu filho pela página oficial da agência, inclusive possuem um aplicativo com os gráficos de aprendizagem da criança. Relatórios são entregues mensalmente para os responsáveis.
A chave do sucesso: os pais também fazem parte do processo
Uma vez por mês, por duas horas, os responsáveis são convidados a participarem de uma sessão com o supervisor. É nessa reunião que aprendem os principais conceitos de ABA, analisam juntos os gráficos de aprendizagem, comportamentos inadequados, e reorganizam a programação.
É nesse momento que passamos ao supervisor as informações a respeito da escola e sobre consultas médicas. Contamos as nossas preocupações e os nossos desejos em relação aos nossos filhos. Listamos prioridades de tratamento e o que não achamos necessário ser trabalhado naquele mês.
Também uma vez por mês, por duas horas, entramos no consultório com o técnico e o supervisor. Eles revisam in loco a programação. Nesse momento, você pode observar como estão sendo aplicadas as atividades da programação para serem replicadas em casa. E isso é muito importante!
Leia mais sobre Autismo na Estônia: uma abordagem diferente
Por exemplo, estavam ensinando o meu filho a brincar de mexer o cafezinho para, posteriormente, dá-lo para a boneca. Em casa, por sua vez, comecei a incentivá-lo a misturar o achocolatado no leite, pois ele estava já com o doutorado no cafezinho! O que aprendo nos treinamentos posso replicar em casa, possibilitando generalizações e a manutenção da aprendizagem.
O melhor de tudo é que eu e o meu guerreiro estamos mais sintonizados. Estamos nos compreendendo melhor. Ele passa mais dias feliz do que mal-humorado. É o que todo ser humano quer e necessita, certo?
Independentemente da terapia escolhida para seu filho, sempre é necessário parar e reavaliar se a criança está se desenvolvendo. Além disso, se os pais forem treinados, podem participar do processo terapêutico, aumentando as chances de desenvolvimento. Sucesso é fruto de responsabilidades compartilhadas entre todos os envolvidos: criança, família e profissionais!
2 Comentários
[…] de passagem) para encontrar profissionais especializados nas mudanças (depois leia o texto sobre Terapia Aba na Califórnia). Sempre que possível, entro previamente em contato com outras mães por meio de redes sociais. É […]
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