Acompanhamento escolar para crianças com dificuldade na França.
Desde o início dos anos 2000 os alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem ou algum tipo de “dis“, como a dislexia, a disgrafia ou a disortografia, ou ainda os portadores de deficiência, podem contar com os auxiliares de vida escolar. No começo eram estudantes que ocupavam essa função – quase sem receber nenhuma formação, por no máximo seis anos e com um salário irrisório. A criação desse cargo de assistente inspirou-se no modelo italiano, com a diferença que na Itália contrata-se profissionais, que seguem uma formação de três anos, e que desenvolvem competências para poder realmente acompanhar os alunos em dificuldade.
Uma lei criada em 2005, em prol da coesão social, definiu que todo cidadão desempregado há mais de um ano podia se candidatar a uma vaga como AVS (como são chamados os auxiliares de vida escolar). Os contratos não são como todos os outros contratos de trabalho, mas são dispositivos de ajuda social, como preferem chamar os altos escalões da educação nacional. Maior precariedade, menor salário, nenhuma estabilidade. Desempregados com mais de 50 anos podem ocupar o cargo por até cinco anos, os outros por no máximo dois.
A situação do ponto de vista do AVS
Eu tive a oportunidade de ocupar esse cargo durante um ano e meio. Estava desempregada há mais de doze meses, o serviço do Estado que acompanha as pessoas que estão em busca de trabalho me propôs um contrato em uma escola da cidade onde moro. Comecei acompanhando gêmeos que estavam na escola maternal e que apresentavam dificuldades de aprendizagem. E aí confrontei-me com uma das muitas falhas do sistema: o desconhecimento pela parte dos professores do papel desses novos profissionais na sala de aula. Alguns professores não aceitam a presença dos AVS mas são obrigados a mantê-los. A falta de comunicação e o despreparo de uns e outros compromete, e muito, o sucesso do projeto de auxílio aos alunos. Alguns professores não querem que o AVS intervenha, não dizem o que esperam dele, e o auxiliar não conhece bem seu papel porque não recebe praticamente nenhuma informação quando é contratado.
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O AVS pode se sentir muito útil e se envolver em todas as atividades escolares se o professor considerá-lo como um aliado e se o aluno aceitar sua própria dificuldade e, por consequência, a ajuda do auxiliar. Mas o tipo de deficiência apresentada também influi no desenrolar dessa colaboração professor-AVS-aluno. Porque são vários os tipos de dificuldade que podem justificar a demanda de um AVS: os famosos “dis“, deficiência física, e também problemas comportamentais, devido a disfunções familiares ou tantas outras causas. Nesse último caso, o AVS tem muita dficuldade em ser aceito pelo aluno, a encontrar uma maneira de ajudá-lo e mesmo a considerar-se necessário no processo de aprendizagem. Porque o aluno pode ter dificuldade de se concentrar ou de trabalhar em grupo mas ter toda a capacidade intelectual de comprensão e nesse caso a ajuda do AVS pode parecer inútil.
Eu vivi essa experiência com uma menina em classe primária que não tinha vontade de trabalhar, que se distraía com muita facilidade, que tinha dificuldade de escrever, mas que compreendia as lições. Ela não considerava minha ajuda importante, queria ser como os outros alunos que se viravam sozinhos. Pra mim era muito frustrante e mesmo aborrecido o tempo que passava com ela, porque ou eu tentava ajudá-la, em vão, porque ela não aceitava minha interferência, ou durante as práticas esportivas ou trabalhos em grupo, minha intervenção era totalmente dispensável e eu permanecia ociosa.
A situação do ponto de vista dos alunos
Os alunos portadores de deficiência física, ou que apresentam problemas emocionais, e que o reconhecem, podem se sentir em segurança na presença de um AVS e desenvolver uma relação de confiança que pode ser muito positiva para ambos os lados. Em uma das escolas onde trabalhei conheci um caso desses: um menino com dificuldades de expressão, dificuldade motora e uma grande imaturidade emocional. A AVS que o acompanhava era uma figura de referência muito importante para ele. A cada vez que ele se encontrava em dificuldade, sabia que podia contar com ela e não hesitava em solicitá-la. Constatou-se uma evolução no seu comportamento social e no seu rendimento escolar, graças ao acompanhamento dessa AVS. Antes incapaz de se manifestar em sala de aula, de falar na frente dos colegas, incentivado pela auxiliar, ele ousou mesmo candidatar-se a conselheiro municipal mirim !
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Como solicitar o acompanhamento de um AVS
Os pais do aluno devem se reunir primeiramente com o professor e o diretor da escola para conversar sobre as dificuldades do filho e sobre a necessidade de obter um acompanhamento. Em seguida um outro encontro reúne pais, equipe escolar, e profissionais que eventualmente já acompanhem o aluno, como médico, psicólogo, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, entre outros. Em seguida a equipe educativa preenche um formulário padrão nacional chamado GEVA-Sco a ser enviado à MDPH, órgão responsável pelo acompanhamento de pessoas portadoras de deficiência. O estudo e análise desse documento serão decisivos na atribuição ou não de um AVS ao aluno solicitante.
Qual o futuro dessa « profissão » ?
Governo após governo, a mídia anuncia a profissionalização dessa função de AVS, a estabilidade e a perenização do dispositivo. Mas por enquanto a regra continua sendo a precariedade e a desinformação.
Links interessantes sobre o tema :
- Augmentation du nombre d’auxiliaires de vie scolaire : ce que ça va changer
- Enfant Différent: Recherche
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