Coronavírus e a ansiedade: a minha história
Somos guiados por rotina e previsibilidade, nos diz a ciência. Nosso cérebro tem a incrível capacidade de preencher lacunas e criar possíveis sequências para nossos atos baseando-se em acontecimentos e experiências passados. É uma das coisas que faz com que nosso cérebro não dispare um turbilhão de hormônios e gere ansiedade. Mas o que fazer quando isso é tirado de nós por coisas que não podemos controlar?
Esse mês pretendo contar um pouco da minha experiência neste texto-desabafo sobre as angústias e incertezas em épocas de Covid-19 (ou Coronavírus, Sars-Cov-2 ou até mesmo simplesmente “bichinho”, que é como explico para o meu filho).
Depressão e Transtorno de Ansiedade
Todos temos buscado diferentes formas de lidar com tudo o que é inerente ao confinamento. Então o que faz a minha experiência merecer ser contada? Sou tão diferentona assim? Não, claro que não! Mas tenho um histórico que acho que vale a pena dividir com vocês, pois ao alcançar mais pessoas pode dar início a uma conversa necessária, nos fazer refletir ou apenas me fazer processar melhor meus sentimentos enquanto escrevo.
Já compartilhei em outro texto que convivo com a depressão há um longo tempo, mas, para começar, volto nesse assunto para falar um pouco mais sobre essa condição e seu desenrolar ao longo da minha vida. Desde de adolescente convivo com esse inimigo interno da depressão, que veio sempre acompanhado de sua melhor amiga, a ansiedade.
Sou uma pessoa extremamente ansiosa – precisava me sentir no controle de tudo para me acalmar. Fui, então, diagnosticada com TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada). Vale ressaltar que a ansiedade é benéfica quando sob controle. Ela nos movimenta e nos deixa alertas. Mas, em excesso, nos paralisa e nos aprisiona em nossas mentes. Aos 20 anos, com muitas coisas acontecendo, mudanças e novidades na época da faculdade, desenvolvi também síndrome do pânico. A situação chegou a um ponto em que eu não conseguia sair do meu quarto. Só de pensar em tocar a maçaneta eu já tinha crises e hiperventilava.
Síndrome do Pânico
A síndrome do pânico se apresenta de formas diferentes, dependendo do indivíduo. Alguns apresentam extremo medo da morte, de aglomerações, de perder o emprego, por exemplo. No meu caso era o medo de sair de casa. Para mim, o mundo se tornou hostil, muitas coisas que não conseguia gerenciar, achava que tudo estava descontrolado, todos me julgando… Conseguem já ver um paralelo com a atualidade?
Desde o início da pandemia, meus processos internos começaram a se movimentar lembrando dessa situação do passado: o medo de sair, a angústia por algo que foge ao meu controle… A ansiedade começou a tomar conta: insônia, esquecimentos, sensação de exaustão… às vezes “travo” para tarefas simples e diárias. Nunca tive uma rotina intensa na rua, de ficar fora de casa o dia todo. Mas o confinamento (e a consequente restrição para se sair de casa) mexeu comigo. Por outro lado pensava: por acaso sou a mesma pessoa de 15 anos atrás? Claro que não! Cadê todo aquele aprendizado?
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Ao longo do meu tratamento, das mudanças e evoluções naturais desses 15 anos entre o início da síndrome do pânico e o Covid-19, aprendi muitas coisas sobre mim, bem como algumas ferramentas que me ajudam a ficar bem. Utilizá-las é o que tem me mantido sã nesses tempos de incerteza.
Ferramentas para manter a mente sã
– Falar, falar e falar: não tenha medo de pedir ajuda, de se abrir e dar vazão a todos esses pensamentos, angústias e sentimentos;
– Racionalização: nossas emoções por vezes tomam o controle e precisamos voltar ao campo lógico e racional do nosso cérebro, pois assim podemos colocar tudo em perspectiva e dar as devidas proporções ao que estamos sentindo;
– Dar vazão às emoções: chorar faz bem, lava a alma, nos liberta… quer chorar? Chore! Se seu negócio for gritar, grite (em uma almofada de preferência), mas faça o que for preciso para extravasar as emoções que tentam te dominar;
– Ser realista: olhar a nossa realidade, nossas qualidades e defeitos, nossas dificuldades… Tudo isso ajuda, pois assim será mais fácil nos acolher e saber que criar expectativas por dias perfeitos é irreal… teremos dias bons, dias ruins, dias mais ou menos e isso é normal;
– Faça exercícios físicos: em épocas de confinamento é bem complicado, eu sei, mas se você conseguir, a liberação de hormônios durante e após o exercício é ótimo para a regulação do cérebro (comecei durante o confinamento, com o apoio do meu marido, e já senti muita diferença) além de ser um tempo que você pode fazer mais algo que gosta: podcasts, música…;
– Faça atividades de relaxamento: respiração, visualização, “espaço seguro”, yoga, meditação… seja lá qual for a sua escolha, faça;
– Leia: sobre qualquer assunto que te faça bem e também sobre algo relacionado às suas dificuldades: descobrir que você não está só é uma importante ferramenta.
O segredo é lembrar que nosso cérebro é dividido em partes, e a verdadeira felicidade e bem estar se encontra no equilíbrio delas: o lado esquerdo no qual predomina o pensamento lógico trabalhando juntamente com o direito predominantemente criativo, e as partes de cima mais evoluídas e de pensamentos complexos em consonância com as partes de baixo mais primitivas e instintivas.
Superar e aprender
Somos seres adaptáveis, sempre é possível superar as situações a aprender com elas. Por muito tempo me senti envergonhada por ter passado por isso, mas aprendi que ao me apossar desses momentos mais escuros da minha história, posso me empoderar e perceber todo meu potencial. É também aprendizado que utilizo na criação do meu filho: tento passar para ele noções de inteligência emocional, ferramentas que podem auxiliá-lo e evitar que caia nas mesmas “armadilhas emocionais” em que eu caí quando mais nova.
Libertar-se da necessidade de controle e de conceitos pré-estabelecidos foram fundamentais para mim. Acredito que uma das grandes lições que podemos ter com essa pandemia é: olharmos para dentro de nós, desacelerar e curtir mais uns aos outros, valorizando aprendizados e vivências em conjunto e aprendermos a viver, olhando para dentro de nós e aos que nos cercam, dando valor ao que realmente importa.
Agradeço a vocês pela companhia nesse texto, no qual me despi de toda a vergonha e receio sobre diagnósticos e doenças mentais para quem sabe ajudar e acolher alguém do outro lado. Vamos acabar com esse tabu!
5 Comentários
Monica, excelente texto. Ainda bem que hoje as pessoas (nao todas) estao mais abertas para pensar e discutir sobre esse tipo de dificuldade que muitos de nós enfrentamos.
Zandra, exatamente o que penso: que bom que estão abertos para o diálogo, pois é extremamente importante para todos, os que sofrem e os que estão ao lado dessas pessoas.
Excelente texto Monica! Tenho certeza de que esse texto será sempre um refugio ou ponto de partida para muitas pessoas.
Obrigada Claudia! O meu intuito é realmente esse, de ser uma ferramente a mais para quem precisar, pois quando vemos que não estamos sozinhos muda tudo!
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