Seguramente não tem faltado emoção desde que nos mudamos para Hong Kong há quase dois anos. Em 2018, passamos pelo maior tufão da história por aqui, o Mangkhut, conforme já relatei neste texto. Em 2019, enfrentamos a forte onda de protestos populares por mais democracia na região. E eis que 2020 nos brinda com o coronavirus – agora chamado de Covid-19 (doença respiratória causada pela nova cepa de coronavírus descoberto no final de 2019 na China).
Confesso que não demos muita atenção quando os primeiros casos do coronavirus começaram a surgir na China continental. Entretanto, à medida que a epidemia aumentava, a imprensa também passava a dar maior atenção ao fato. Cabe destacar que aqui em Hong Kong não temos acesso à maioria dos jornais e telejornais locais, pois eles são produzidos em cantonês, sem legendas em inglês. Isso faz com que muitas vezes deixemos de acompanhar em tempo real algumas notícias da região. Nossas fontes “confiáveis” de informação são veículos como o South China Morning Post e o China Global Television Network, mas nenhum deles é específico para Hong Kong. Ainda não havia os sites de monitoramento em tempo real do avanço do coronavirus como há agora (veja aqui ).
Quando saímos de viagem para o Vietnã durante o Ano Novo Lunar (em 24de janeiro), já usávamos máscaras por precaução. Entretanto, HK ainda não apresentava muitos casos. Máscaras, álcool gel e produtos de limpeza também não estavam em falta. O pânico ainda não estava instalado.
O avanço da epidemia
Porém, nos dias que se seguiram, acompanhamos à distância o aumento no número de infectados e mortos pelo coronavirus, assim como o cancelamento de muitos voos com destino à China e HK. Começamos a procurar máscaras e álcool gel em Hanói e descobrimos que já estavam em falta. Pelas redes sociais, eu conversava com amigas que estavam em HK e relatavam a falta de certos produtos no mercado também.
No dia 31 de janeiro, ainda no Vietnã, soubemos que as aulas na escola das crianças – que deveriam voltar no dia 3 de fevereiro, após o feriado, – haviam sido adiadas para pelo menos 02 de março. Um mês pela frente com as crianças em casa!
A volta para casa e a nova rotina
Conseguimos voltar sem maiores problemas do Vietnã para HK e demos início a um período de certa clausura. Tanto eu como as meninas amamos ficar em casa e a princípio adoramos a ideia de um mês “sabático”. Entretanto, com o passar dos dias, alguns inconvenientes se mostraram presentes.
No que tange à minha vida especificamente, tive que dar adeus temporário às minhas aulas de inglês e de yoga, assim como à meditação e leituras no silêncio absoluto. Primeiramente porque a orientação para evitar o contágio e propagação do coronovirus é não pegar transporte público, evitar lugares fechados, com muita gente etc. Em segundo lugar porque como não tenho ajudantes não me sinto confortável em deixá-las em casa sozinhas por longos períodos.
Além disso, nas poucas vezes em que saio para fazer compras, o uso da máscara é aconselhável. Se não tanto para evitar o vírus, serve para evitar olhares de reprovação dos vizinhos. Eu, sabidamente claustrofóbica, detesto andar com a máscara. Me sufoca, eu suo, parece que o oxigênio não entra, os óculos embaçam. Claro, é um exagero, mas é como eu sinto. Uma tortura.
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Outras mudanças práticas também foram observadas: para entrar no condomínio, a nossa temperatura é checada e registrada. Encomendas que antes eram levadas por prestadores de serviço até a porta do apartamento agora devem ser pegas na garagem. Nenhum entregador é autorizado a entrar no condomínio. Além disso, as áreas de lazer (brinquedoteca, academia, salas de estudo, piscinas) foram fechadas por tempo indeterminado.
Nos fins de semana, adeus cinema, museus, restaurantes e shoppings. Inventamos uma competição de jogos de tabuleiro e um “Oscar” caseiro, em que cada um de nós escolhe um filme por fim de semana e um deles se consagra “vencedor”, dando ao seu “dono” um prêmio.
Nos mercados ainda faltam alguns produtos, como todos os desinfetantes, água sanitária, lenços umedecidos, arroz e, de uns dias para cá, papel higiênico. Basta com que um vídeo se espalhe avisando que tal produto está faltando que realmente ele começa a faltar, já que todo mundo sai correndo para comprar e estocar. Felizmente eu já tinha certa quantidade desses itens, então não estamos tendo maiores problemas no momento. A angústia é não saber quanto tempo esse processo durará e se mais produtos começarão a faltar.
Aulas virtuais para compensar a falta de escola
Desde o início as meninas souberam que o período sem ir à escola não significaria de forma alguma“férias”. Vários comunicados foram enviados pelas escolas informando sobre o home learning (aprendizagem em casa) que aconteceria praticamente “tal qual” o horário escolar. É preciso contar estes dias como letivos para não comprometer o feriado da Páscoa (que aqui é de duas semanas para as escolas) e as férias de verão em julho.
E assim tem sido. Às 8h elas devem estar com computador e tablet ligados e a cada “aula” há atividades da respectiva matéria. O conteúdo vem por meio de videoaulas e/ou exercícios. Além disso, os alunos da turma e professores “se reúnem” virtualmente pelo menos uma vez ao dia, seja para resolver exercícios juntos, seja para comentar as suas leituras, seja para conversar sobre como está sendo passar por esse período diferente.
A carga de atividades tem sido até maior do que nos tempos de ir à escola. Só terminam os deveres por volta das 17h-18h, com um período de descanso e uma pausa para o almoço. Entre as atividades, há a elaboração de exercícios, vídeos, áudios, dramatizações, ilustrações etc. O mais gostoso de ver são as duas irmãs se ajudando e muitas vezes aprendendo muito uma com a atividade da outra, mesmo com quatro anos de diferença escolar. Sentem-se “gente grande” fazendo “calls” (chamadas à distância com várias pessoas) como faz o pai. Muitos amigos optaram por sair de HK e nessas “reuniões” há gente em vários lugares desse mundão.
Atenção ao impacto emocional da epidemia
O que tem me chamado a atenção é a preocupação das escolas sobre o impacto emocional dessas mudanças. Assim, recebemos alguns textos sobre como auxiliar as crianças a lidar com o medo da infecção e como enfrentar esse momento sem tanto estresse. Além disso, eles conversam sobre os prós e contras do ensino a distância e o que eles têm aprendido com a situação.
A importância da tecnologia
Felizmente, passar por um momento como este hoje em dia é certamente mais fácil do que décadas atrás. A tecnologia ajuda tanto! Aqui em HK as escolas já são bem tecnológicas no dia a dia, como vocês podem ver na lista a seguir. Agora então, mais ainda! Alguns dos programas/sites que as escolas têm utilizado para facilitar a aprendizagem delas à distância são:
SeeSaw: rede social fechada (têm acesso os pais, os alunos e os professores) na qual os alunos postam vídeos, áudio e fotos de seus trabalhos. Ganham likes, comentários e feedbacks tanto dos pais quanto dos professores e colegas.
Khan Academy: imenso portal com videoaulas de várias matérias, em vários idiomas.
Google classroom: plataforma educacional da Google, que auxilia professores e alunos a organizar e gerenciar tarefas.
Flipgrid: plataforma online de vídeos educacionais da Microsoft, na qual é possível também postar temas, dúvidas e responder tópicos sobre diversos conteúdos acadêmicos.
Meet e Zoom: sites para videoconferências.
Flocabulary: biblioteca virtual de músicas (hip hop), vídeos e atividades educacionais.
Big Universe , Kids A-Z e Epic!: bibliotecas virtuais com milhares de títulos, divididos por níveis de leitura.
IXL, Mr Carter Maths e Mathswatch: atividades interativas de matemática.
Diagnostic questions: plataforma que tem como objetivo diagnosticar o conhecimento prévio dos alunos sobre vários temas.
The Chairman’s Bao: aprendizagem de mandarim por meio de notícias, por níveis de conhecimento.
Level Chinese: aprendizagem de mandarim.
Se elas estão com saudade da escola e dos amigos? Sim! Até mesmo porque acreditam que o volume de lição é menor quando vão para a escola (risos). Mas quando as aulas voltarem (o que está previsto no momento apenas para 16 de março!), seguramente sentirão saudades do almoço quentinho da mamãe, dos lanchinhos preparados com tanto amor e do beijo a cada tarefa concluída!
9 Comentários
Excelente texto. Muito esclarecedor.
Obrigada Viviane! Bjs.
Como sempre texto bem elaborado e elucidativo! Adoro seus relatos! Estamos torcendo para que tudo volte ao normal o mais breve possível e que não aumente muito o número de vítimas! Beijos pra vocês!
Obrigada Vê! Sim, a nossa torcida é para que a cada dia menos pessoas adoeçam e morram. Que todos os esforços que a China está fazendo deem o resultado esperado! Bjs.
Marilia, teux textos realmente são muito bons, muito fluidos, até quando se trata de assuntos menos “glamourosos”.
Interessante ver como tu te adaptaste bem a essa nova rotina forçada. Boa sorte, que esse período passe logo e que se o vírus cesse de se alastrar.
Obrigada, Zandra! Também adoro os seus! É preciso fazer limonada dos limões, não é mesmo? Fico feliz que Hong Kong está tomando as medidas necessárias, ainda que drásticas, para conter essa epidemia! Bjs.
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