Escolhi escrever sobre famílias com adolescentes. Posso me colocar na posição de terapeuta de família e na posição de mãe. Atualmente tenho me colocado nas duas para encontrar um equilíbrio das cobranças e não gerar estresses desnecessários.
Existe no senso comum uma imagem de que os adolescentes são “aborrecentes”, chatos, briguentos, difíceis, mal humorados. Nós também passamos por isso e para muitos, a adolescência é lembrada como “um período de descobertas, do primeiro amor, das primeiras viagens com os amigos de escola”.
As fases do ciclo de vida da família
O livro As mudanças do ciclo de vida familiar – publicado no final dos anos 1980 nos Estados Unidos – é, ainda hoje, uma referência para todos os terapeutas de família. As autoras descrevem as diversas fases de uma família: jovem casal, família com filhos pequenos, família com adolescentes, ninho vazio (quando os filhos saem de casa) e a família mais velha – com suas características, aprendizados e desafios.
A essas fases devemos incluir outros “eventos“ que acontecem com muita frequência, tais como: divórcios, recasamentos, as migrações, entre outros. Há também os chamados eventos “imprevisíveis”, porque não estão previstos no ciclo esperado pela família, tais como: uma doença grave , o desemprego ou uma pandemia!
A passagem de uma fase do ciclo de vida para a seguinte , assim como todos esses eventos extras, são estressores que influenciam no desenvolvimento das famílias, pois, todos os membros são obrigados a rever os seus papéis e a lidar com uma série de sentimentos e comportamentos novos e diferentes.
Família com filhos adolescentes
Na adolescência, por exemplo, os pais precisam deixar os filhos mais livres para desenvolver a autonomia, para explorar outros espaços, descobrir outras regras de comportamento. As fronteiras da família precisam estar mais flexíveis para permitir essa maior autonomia dos filhos e os pais precisam mudar a forma de tratar os filhos que já não são crianças.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a adolescência vai dos 10 aos 19 anos. Ela começa com a puberdade e uma série de mudanças biológicas visíveis no corpo da criança, que está se tornando um adulto. Dependendo da cultura, do país onde as pessoas vivem, a adolescência pode ter variações e ser prolongada. É um momento de desenvolvimento biopsicossocial, ou seja, acontecem mudanças muito importantes na vida do indivíduo e de sua família.
É na adolescência que os filhos buscam se diferenciar dos pais e passam mais tempo com seus amigos. E como será que eles estão vivenciando a quarentena em que agora passam o dia inteiro em casa?
Adolescentes conectados
Felizmente eles são conectados. Conseguem se comunicar com os amigos, estão ajudando os professores nas videoaulas, conseguem até fazer seus exercícios (atividade física) online. Claro que é muito diferente. O contato físico faz falta, o ar puro faz falta e, sinto que eles estão sobrecarregados de tarefas escolares e sem a sua válvula de escape ( o esporte e o estar com os amigos).
Aqui na Itália as escolas se organizaram para fazer as aulas pelo computador. Cada escola tem a sua metodologia, os professores precisaram se adaptar e, a falta de experiência no assunto faz com eles deem um monte de trabalho, talvez mais do que se estivessem na escola.
Se no início, alguns adolescentes ficaram felizes com o fechamento das escolas, hoje eles não veem a hora de voltar à rotina. As realidades das famílias são muito diferentes. Nem todos tem um espaço reservado em casa, alguns adolescentes precisam dividir o quarto com os irmãos menores, por exemplo. Outros moram em um espaço pequeno que o “estar todo mundo junto por tanto tempo” é uma novidade. Li uma matéria bem interessante, em italiano, sobre isso. Sem falar que nem todas as famílias têm dispositivos eletrônicos suficientes para que os filhos acompanhem as atividades da escola.
Os adolescentes precisam do grupo de amigos
Entendi que ficar no quarto, atualmente, corresponde ao tempo que estavam na escola, nos treinos esportivos, ou passeando com os amigos. Mas também é o tempo que já ficavam no quarto para tratar dos seus assuntos pessoais, ouvir música ou conversar com os amigos nas redes sociais.
Como terapeuta de família, entendo que os adolescentes precisam desse tempo com os amigos. Não posso exigir que os meus filhos fiquem mais tempo conosco, só porque estão em casa. Entretanto, como pais, podemos aproveitar esse tempo em casa para conversar sobre uma série de coisas. Mas atenção: encontrar o equilíbrio não é uma tarefa fácil!
A importância do diálogo
O diálogo entre pais e filhos é sempre muito importante. Sobretudo na adolescência, quando os filhos estão vivendo um período de descobertas dos próprios limites, de questionamentos dos valores e normas familiares e, seus principais agentes de influência não somos nós, os pais, mas, os seus amigos.
Sei que alguns pais, às vezes, fazem tantas perguntas que parece um “interrogatório”. Como terapeuta de família, costumo dizer que as conversas precisam acontecer naturalmente. Se um pai diz ao seu filho: “Quero conversar com você às cinco da tarde de amanhã”, não seria totalmente compreensível que esse filho esteja dormindo, ou tomando banho, ou invente qualquer coisa para não estar disponível naquele horário? Dá medo só de pensar!
Aqui em casa, os assuntos surgem quando falamos das aulas ou das séries de televisão. Às vezes mostro um artigo de jornal ou encaminho um vídeo que recebi por “WhatsApp” para puxar um assunto. Nem sempre dá certo e por isso resolvi aproveitar as oportunidades, quando elas surgem.
Aproveitando as oportunidades
Tento estar sempre disponível quando meus filhos querem me contar alguma coisa. É uma maneira de ficarmos mais próximos, de estabelecermos um canal de comunicação, de saber mais sobre eles. Lembra que falei que as conversas devem acontecer naturalmente?
Se eles querem me contar alguma coisa, eu quero estar disponível para eles e quero que eles percebam que me interesso pelas suas coisas. Podem ser um treinamento físico online, o novo video do youtuber preferido, ou , o que aconteceu na videoaula. Se eles percebem que estou disponível, estou interessada, eles podem vir sempre que quiserem e isso passa a ser um hábito.
Uma pequena mudança pode fazer a diferença
Faz parte da adolescência se sentir incompreendido tanto pelos pais quanto pelos professores e os jovens falam disso com os amigos.
Quando os meus adolescentes reclamam dos seus professores em casa, ouço as lamúrias, mas tendo a ficar do lado dos professores. Sei que esse é um tema delicado, mas vai ficar para uma outra oportunidade. Contudo, neste momento, percebi que preciso mudar de lado. Eles (os filhos) precisam culpar os professores pelo excesso de trabalho ou notas baixas.
Sabe quando você termina uma prova dificílima, que você acha que o professor foi um carrasco e precisa falar disso com os amigos que fizeram a mesma prova? Pois é, aprendi que, como os amigos não estão aqui, preciso ouvir e acolher esse desabafo. Às vezes faço alguns comentários do tipo “Que injustiça!” ou “Que sádico!”, demonstrando claramente que estou com eles.
Bom, nós nos tornamos pais sem um curso preparatório ou manual de instruções. Aprendemos no dia a dia com os nossos filhos, errando e acertando. Não existe uma receita e cada família vai encontrar o seu jeito. A quarentena vai passar e espero que pais e adolescentes tenham estreitado o relacionamento.
2 Comentários
Amei , vou aplicar nos netos, pois os filhos já são adultos e na adolescência deles eu era muito intensa tanto pra cobrar , como pra fazer uma boa farra com eles .
Oi Vitoria! Seus filhos são maravilhosos. Certamente tiveram uma ótima mãe! Dizem que com os netos é tudo mais divertido. aproveite!