Respeitadas as devidas proporçōes, há algo de muito semelhante entre a maternidade e a imigração: ambas são as coisas mais absurdamente difíceis e inexplicavelmente maravilhosas que você vai fazer na vida.
Migrar te trará ondas de repulsa e de saudade – e já aviso: elas vão durar uma vida inteira.
Você vai absorver cores, cheiros, luzes, vozes, vidas. Que não são suas. Que não eram suas. Mas que agora são parte infinita de você.
Você vai sentir uma tristezinha constante ao perceber que seus filhos não carregam suas referências. E vai ficar feliz pelo mesmo motivo.
Você vai entristecer ao ver seus pais envelhecendo sem os netos e seus filhos alheios aos almoços de domingo.
Você vai entender que a generalização é um troço simplista. Mas vez ou outra vai se pegar acomodando pessoas e lugares em caixinhas rotuladas – é o seu cérebro imigrante tentando codificar o novo.
Vai perceber o timbre árabe, conhecer a culinária tibetana, incorporar estrangeirismos.
Vai ver lugares distantes, pessoas longínquas, palavras remotas.
Templos, campos, prédios, torres.
Você vai vagar por corredores de supermercados vazios, cheios de cheiros que não lhe habitam a memória olfativa.
Vai despertencer à pátria que lhe pariu, pois ali já não se reconhece. Partiu.
Vai começar a noite com uma taça de vinho e terminar cantarolando memórias de mesas e balcōes.
Vai aprender que não existe lugar perfeito: onde nubla abunda, onde ensolara escassa.
E também que gente é gente: gente chora, ri, se apaixona e solta pum em qualquer canto da terra.
Vai perceber que lá se vão anos e nada de você descobrir a que hemisfério pertence.
Se lá ou cá.
Pra ir ou ficar.
Lugar nenhum.
Todo lugar. “
Roberta Ferec escreveu esse texto inédito há três meses para o Mães Mundo Afora, quando lançamos a nossa plataforma. Bem antes de um de seus textos viralizarem na internet ao ser compartilhado pela apresentadora Angélica na ocasião do acidente com o seu filho Joaquim.
Eu sigo Roberta há algum tempo, quando seu perfil no Instagram ainda se chamava Mamas Sanas e não tinha tantos milhares de seguidores. Uma amiga aqui de Rotterdam me indicou e me apaixonei de cara. Admiro o jeito franco, sem afetação e ao mesmo tempo com poesia e embasamento, com que ela trata de temas como maternidade, a relação das crianças com telas e tecnologia, autoconhecimento, como viver “na gringa” como ela chama essa nossa experiência de imigração, família fora do padrão comercial de margarina e umas receitinhas ótimas de comidinha gostosa, além de outras cositas más…
Roberta tem três filhos – Noah, que nasceu no Rio; Luna, que veio ao mundo em Singapura; e Gael, parido na Holanda. É casada com um francês abrasileirado pelo tempo. Em casa, falam português com os filhos, que falam inglês entre eles e espanhol na escola. Além dos países onde nasceram suas crias, ela já morou sozinha na Inglaterra e com a família nos Estados Unidos, Portugal e agora fixou residência (será?) na casa dos seus sonhos no interior da Espanha. Com tanta experiência mundo afora, ela oferece um ambiente respeitosos de troca em seu perfil. Se quiser saber mais sobre ela e, principalmente, ler e ouvir o que ela tem a dizer e compartilhar sobre maternidade e imigração e todo o resto, siga a moça (que está prestes a lançar um livro sobre telas e infância) no Instagram: @robertaferec . Você vai rir e vai chorar, eu garanto.
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