Como superei a frustração de não conseguir amamentar
Neste agosto dourado, mês de conscientização sobre a importância do aleitamento materno, divido com vocês a minha experiência e conto como superei a frustração de não conseguir amamentar.
Antes, quero deixar claro que considero a amamentação algo importantíssimo. Minha intenção aqui não é, de forma alguma, desencorajar outras mães e muito menos passar uma mensagem de que fórmula e leite materno são a mesma coisa. Acho que a fórmula é saudável sim e graças a Deus existe, mas a vejo como uma segunda opção, pois acho que o que a natureza produz é sempre o melhor. Mas, acredito que partilhar a minha experiência é também abraçar e acolher aquelas mães que, como eu, não conseguiram ou puderam amamentar.
O contexto psicológico do meu puerpério
Hoje em dia acho que cometi alguns erros, mas não me condeno por eles. Não sou frustrada por não ter amamentado. Entendo todo o contexto psicológico que me fez desistir de tentar e me aceito como um ser humano normal. Aquela pretenção de ser uma super-mulher, a mãe perfeita, já deixou de existir há muito tempo. E digo: isso é libertador!
Já contei em um texto anterior (que você pode ler aqui,), que ter o meu filho não foi nada fácil. Tive duas perdas antes de conseguir levar a gestação adiante e, por isso, tive um primeiro trimestre infernal. Todos os dias eu acordava com medo de estar, mais uma vez, carregando um filho morto dentro de mim. Eu rezava mesmo sem ser religiosa e lia muito – neste caso, ler foi a pior coisa que fiz comigo mesma.
A literatura sobre gestação é infinita, mas claro que, ao mesmo tempo que encontramos muita informação maravilhosa e que ajuda muito, também encontramos literatura sobre tudo de ruim que pode acontecer. Por conta do medo e dessa personalidade que tenho de que “preciso sempre estar preparada para tudo”, acabei lendo muita coisa que não me fez bem. Eu não me sentia segura, achava que tudo poderia acontecer a qualquer momento. Quando meu filho saiu de mim, por não ter chorado, até eu conseguir me sentar e ver com meus próprios olhos que ele se movia, eu tive aqueles 10 segundos de pânico por conta de textos que havia lido sobre bebês natimortos. Ou seja, fiquei realmente paranóica.
Eu sofro de depressão e me preparei demais para tentar evitar a depressão pós-parto. Tive todo um acompanhamento do meu estado mental com a minha doula e, por conselho dela mesma, depois da 15a semana da gestação e quatro ultras bem sucedidas, ela mesma me recomendou que parasse de ler e de me informar. Ela disse que, às vezes, confiar na natureza e que tudo vai dar certo, como era antigamente, é melhor do que se preparar demais antecipadamente. No meu caso, este conselho foi muito importante . Eu o segui e me acalmei. Até porque tínhamos encontros mensais e eu tinha aquela mulher maravilhosa (jamais a esquecerei) para tirar dúvidas.
Eu sou meio 8 ou 80, então tomei uma decisão meio radical, mas que foi importante para o meu psicológico: não li mais NADA. Nada mesmo. Coloquei na cabeça que deixaria a natureza agir e que aprenderia tudo por instinto. Não quis fazer curso pré-natal, não participei de nenhum grupo de grávidas e quando tinha dúvidas, perguntava à Tarja (minha doula) ou a minhas amigas mães. E assim foi.
A falta de leite e a perda de peso do bebê
Assim que tomei meu banho, pouco tempo depois de o bebê nascer, a parteira falou: “Ele está com fome, vamos dar de mamar?”. Como eu não estava sentindo absolutamente nenhuma diferença em meu peito, eu me lembro de dizer a ela que achava que meu leite ainda não havia descido. Mas ela disse que era assim mesmo e me ensinou a posicionar o bebê para a amamentação.
A frustração de não conseguir amamentar já começou ali. O pele do bico do meu peito é extra-sensível e meus mamilos são tão pequenos e finos que “entravam” quando o bebê começava a sugar. Ou seja, ele não conseguia pegar meu peito e chorava muito de fome. Me deram um bico de silicone para ajudar e até ajudou na pegada, mas leite que é bom, quase não vinha. O menino, tadinho, dava tudo de si, mas continuava com fome e desesperado.
Usei o método canguru, em que o bebê fica pele a pele comigo. Colocamos o travesseiro e ele ficava o tempo inteiro deitado com a boca no meu peito.
Na primeira noite de vida dele meu cansaço foi zero. Eu era pura adrenalina. Ficava ali, deitada de lado com ele no meu peito, olhando se passava leite pelo bico de silicone. Eu via que não era o suficiente, o menino berrava de fome, aquilo me atormentava e ninguém me ouvia.
“É assim mesmo, no início é só o colostro, já já o leite vem.”

Foto: Arquivo pessoal
No dia seguinte, tivemos a primeira consulta com o pediatra e ele foi pesado. Tadinho, havia perdido tanto, mas tanto peso, que eu não pude receber alta. Ele nasceu com 3kg e 288 gramas, 50 cm em 39 semanas de gestação, tudo perfeito. Com 24h de vida pesava somente 2kg e 400 gramas e estava com icterícia neonatal. Eu nem sabia o que era isso e quando o médico explicou que a condição pode ser relacionada à fome e que pode causar epilepsia, virei uma leoa! Levantei da cadeira e soltei o verbo. Falei que havia avisado centenas de vezes que não estava saindo leite do meu peito, que eles estavam matando meu filho de fome.
Icterícia, banco de leite e seringa
O pediatra me acalmou e imediatamente recebi as instruções para começar a bombear meu peito e como dar leite na seringa para que o bebê não recusasse o peito depois.
Segundo as enfermeiras, quando o bebê toma mamadeira, a sucção é tão mais fácil que ele pode passar a recusar o peito mais tarde. Havia um banco de leite na maternidade e pude alimentá-lo com leite materno de mães doadoras.

Foto: Arquivo pessoal
Fiquei no hospital três noites até ele chegar a 3Kg e estar bem da icterícia. Eu bombeava leite a cada duas horas e cada bombeada trazia de volta a frustração de não conseguir amamentar. Nem 10ml de leite no frasco. Tive que complementar com a fórmula.
Eu fiquei bem traumatizada ao ver meu filho chorando de fome em seu primeiro dia de vida e por ele haver perdido todo aquele peso e ter ficado subnutrido. Aquilo me abalou demais e, por conta disso, a técnica da seringa durou pouco. Ele ficava impaciente e chorava muito, pois queria mamar. Eu o colocava no peito, ele sugava e desistia, pois estava com fome. Passou uma semana e eu decidi comprar uma mamadeira. Meu bebê passou a dormir como um anjo, não chorava mais, começou a ficar gordinho e feliz. E eu também.
Bombinha e, enfim, mamadeira e fórmula
Até ele fazer 2 meses eu ainda bombeava o leite. Tinha vezes em que bombeava tanto que me machucava de verdade, mas eu queria encher uma mamadeira que fosse. Isso meio que virou uma meta doida na minha cabeça. Eu me forcei tanto que tive tendinite. E foi quando desisti.
Meu próprio marido conversou comigo e disse que eu estava sendo dura comigo mesma, que o bebê adorava a fórmula e a mamadeira, que eu precisava relaxar e me acalmar, pois eu não era a única mãe no mundo que não conseguiria amamentar e que isso não tem nada demais.
E assim eu segui o seu conselho e parei. Meu leite secou bem rápido.
Conexão mãe e filho
Eu queria ter aquela conexão única que toda mãe que amamenta descreve: ter o bebê me fazendo carinho enquanto mama, sentir que estou alimentando ele. Não amamentar num primeiro momento significou para mim que eu não teria nada daquilo, que meu filho seria menos conectado comigo ou menos saudável por não ter mamado no peito. Mas consegui, com o apoio do meu marido e de minha doula, superar esse sentimento de frustração de não conseguir amamentar. Quem dava a mamadeira, quem preparava a fórmula, quem fazia tudo era eu. Ele não mamou em meu peito, mas mamou pelas minhas mãos, em meus braços, com meus carinhos, corpo a corpo comigo. Nossa conexão única e linda existiu de qualquer forma.
Se você é mãe e realmente não pode, não consegue ou não conseguiu amamentar, não se sinta frustrada! Não precisa. Nada deixará você menos conectada com seu filho. Nada te fará menos mãe. A única pessoa no mundo que pode te desconectar dele é você mesma. Seu filho nos seus braços é o que importa.
7 Comentários
Maila, adorei o texto. Eu também passei por isso com a minha primeira filha. Foi muito frustrante e duplamente doloroso (na alma e nos peitos). Graças a Deus ela cresceu saudável e parte da culpa deixei para trás. Com a segunda filha, talvez menos ansiosa, consegui amamentar 5 meses e fiquei muito feliz. Nunca AMEI amamentar porque sempre doeu e eu me sentia muito presa. Hoje vejo que agi como pude naqueles momentos. Seguimos felizes e unidas e ficaram só as lembranças.
Marilia, acho reconfortante sempre que uma mulher tem coragem de assumir que não ama fazer algo que a sociedade estabeleceu como obrigatoriedade de se gostar. Muito obrigada por seu comentário. Sobre a questão de estar presa, eu concordo plenamente e isso foi um dos pontos positivos nos quais foquei para não me frustrar quando desisti. Um beijo
Maila te entendo perfeitamente. Querer infelizmente nem sempre é poder.
Mas somos humanas e fazemos o que podemos… se engravidasse hoje tentaria tudo outra vez.
Querida Zandra. Eu também!! Muito obrigada pelo comentário.
Eu tive o “combo do desestímulo” logo de início: cesárea, mamilos invertidos, leite que não ‘descia’, bebê em UTI, mamadeira, eu também em UTI… mas pelo o seu texto consegui identificar uma coisa (que não vou dizer com 100% de certeza que foi seu caso, mas há grande chance de que tenha sido): confusão de bicos.
Isso que a enfermeira disse sobre o bebê não pegar o peito da mãe depois de usar mamadeira acontece com bico de silicone (que foi dado a você logo desde o início) e chupeta também. O que estimula a produção de leite é a sucção do bebê, quanto mais o bebê mama, mais leite é produzido (e peito não é estoque de leite, é fábrica. Boa parte do leite que o bebê mama é produzido pelo corpo na hora). Com o bico de silicone no meio do caminho o bebê não mama direito (pois a pega está incorreta) e nem o peito recebe o estímulo. O bebê não aprende a mamar bem, perde peso e o corpo da mãe não produz o leite. E nem toda mãe também consegue ordenhar (eu nunca consegui tirar mais que 7 ml).
A diferença que no meu caso, depois de longos 20 dias em UTI neonatal, com ajuda de consultoras de amamentação e instruções corretas, felizmente no meu caso a confusão de bicos do meu filho não era tão grave a ponto de não conseguir reverter a situação. Consegui amamenta-lo exclusivamente até os seis meses e hoje (mais de dois anos após o nascimento) sigo amamentando.
Sei que de forma alguma o seu texto tem intenção de desestimular a amamentação e sim para trazer tranquilidade a mães que passaram pelo o que você passou, mas talvez seria interessante adicionar informação sobre a confusão de bicos também para aquelas mães que nesse momento estão no puerpério e, num momento de aflição, não se sintam desestimuladas a continuar tentando a amamentar (mas tentando sem estímulos para a confusão de bicos). Certamente se eu tivesse lido seu texto antes de ter ajuda das consultoras de amamentação eu teria desistido.
Se for de alguma ajuda, o grupo Matrice pode ajudar com informações melhor do que eu.
Olá Juliana!
Muito obrigada por seu relato. Entendo sua preocupação em achar que, de repente alguma outra mãe possa desistir ao ler meu texto, mas eu realmente não vejo dessa forma, pois eu escrevi que sei que cometi erros e que agi da maneira como foi melhor para mim, principalmente por conta do meu quadro crônico de depressão. Editar o meu texto vai tirar dele a espontaneidade dos sentimentos que dividi, mas o seu comentário é uma fonte excelente de informação e tenho certeza de que será lido por todas as mamães que chegarem a este texto. Praticamente todas as pessoas que leem os textos leem os comentários também. Agradeço imensamente por seu comentário. Um grande abraço.
[…] agosto 8, 2019 […]