Janeiro na França começa com festa! Na verdade, as festividades que começaram no fim do ano continuam. No início do mês, não se pode escapar das étrennes e da galette des rois .
Les étrennes (presente de Ano Novo), são um costume da época dos romanos que ainda perdura, mas passou por algumas modificações. Antigamente, presenteava-se os amigos com tâmaras, mel ou figos expressando votos de felicidade e boa sorte. Um pouco mais adiante, começaram a utilizar também moedas e medalhas de ouro como prova de amizade e desejo de prosperidade.
No fim do século XIX, com o surgimento do Papai Noel na propaganda das grandes lojas, o hábito de trocar presentes em janeiro se modificou para o que conhecemos hoje, com a data oficial instituída no dia 25 de dezembro.
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Em família, perdurou a data natalina ligada ao cristianismo. Mas o costume de oferecer um presente no começo do ano persistiu em alguns setores da sociedade. Desta forma, não é raro que carteiros, bombeiros, empregados domésticos, garis e outros profissionais sejam agraciados com dinheiro ou presentes. É muito comum no começo do ano recebermos a visita de algum funcionário dos correios ou do Corpo de Bombeiros com um exemplar do novo calendário editado pela instituição que representam. Cada família retribui com o valor que quiser, não existe obrigação.
No ano que vim pra França, trabalhei na casa de uma família. Eu cuidava de duas crianças e fazia também o serviço doméstico algumas horas por semana. No dia 04 de janeiro, a dona da casa me convidou para jantar e me presenteou com um echarpe e algumas dezenas de euros e me explicou o costume das étrennes .
Após as festas de final do ano, mais comilanças
Depois das ceias no Natal e Ano Novo, ainda é preciso guardar um lugarzinho para a galette des rois. Originalmente sem ligação com religião, e datando da antiguidade, a galette era preparada durante as festas do solstício de inverno. Nessas ocasiões, os romanos escolhiam um escravo como “rei por um dia”. Hoje, essa iguaria continua sendo compartilhada em comemoração da “Epiphanie” (Dia de Reis), que até os anos 60 era celebrada em 6 de janeiro como feriado. Foi quando o Vaticano decidiu alterar a data para o primeiro domingo de janeiro, apesar de alguns países terem mantido a data inicial.
Em todo o caso, na França, o dia de compartilhar a galette é o primeiro domingo de janeiro. Os mais gulosos, porém, começam antes e continuam durante todo o mês!
O que é a galette?

As fèves das galettes des rois (arquivo pessoal)
Uma torta com massa folhada e recheio de creme de amêndoas. No sul da França é mais comum você encontrar um bolo com frutas cristalizadas. A grande peculiaridade dessa iguaria é a fève (tradução literal: feijão verde ou favas), pequeno objeto escondido no bolo e que só é descoberto no momento da degustação. No início, esse objeto representava a fecundidade e a abundância e, por isso, era simbolizado pelo feijão, uma leguminosa dotada de embrião. Com o tempo, o objeto foi mudando, passando a ser confeccionado em porcelana. Inicialmente com representações de itens de presépio e, posteriormente, com diferentes personagens.
Antigamente, cortava-se a torta em tantas partes quantas fossem as pessoas à mesa e mais uma parte extra, chamada a “fatia do pobre”, que era oferecida à primeira pessoa que se apresentasse à sua porta. Havia todo um ritual para o corte da galette : o filho caçula da família se colocava embaixo da mesa e indicava para quem ia o primeiro pedaço, o segundo, e assim consecutivamente. A pessoa que comia a fatia onde se escondia a fève era denominada Rei e podia fazer os outros pagarem uma prenda.
Hoje, continua-se designando uma criança no grupo dos comensais para escolher a ordem dos servidos à mesa. Mas o detentor da fève, e portanto rei, coloca a coroa na cabeça (que vem junto com a torta), escolhe a sua rainha e deve ser o próximo a convidar para uma degustação da galette. Se for uma mulher que comer a parte da fève, ela é designada rainha e escolherá seu rei e deverá ser a próxima a oferecer a torta ao grupo.
Na maior parte dos casos, os pais dão uma espiadinha prévia para ver em que fatia está a fève e deixam que as crianças sejam os reis. Não poderia ser diferente, já que os pequenos adoram saborear a galette, ser reis por um dia e ainda ganhar uma fève como prêmio!
As fèves atuais ampliaram os símbolos: os personagens bíblicos ainda existem, mas podemos encontrar outros, como personagens infantis, carrinhos de bombeiros, jogadores de futebol, mini-guloseimas… Ideias não faltam aos fabricantes. Há quem colecione as fèves. Alguns adultos as utilizam como decoração em cima da lareira ou algum outro móvel e as crianças gostam de exibí-los em seus quartos.
Atualmente, a galette des rois continua sendo muito consumida e os fabricantes criaram diversas variações para essa iguaria. Nos supermercados e padarias, são encontradas além da famosa frangipane (com creme de amêndoa), versões em chocolate, maçã, framboesa, entre outras. Se você quiser tentar preparar uma em casa, confira a receita da galette frangipane aqui.
Não deixe de compartilhar com sua família essa delícia! Uma dica: nos supermercados é possível encontrar galettes de qualidade com custo menor. As produzidas nas boulangeries (padarias) são bem mais caras e nem sempre feitas no dia.
6 Comentários
Hola Zandra, grata pelo texto, na España tem a tarta de Reys e dentro tambem vem um bonequinho, porem nao há tanta variedade nos recheios. Achei bem interessante as semelhanças. Feliz e doce 2019 para vc e tua familia.
Maira, obrigada pelo comentário. Não sabia, infelizmente ainda não conheço a Espanha, gostaria muito aliás!
Um ótimo ano pra ti também!
Olá, querida amiga. Cá em Portugal, temos o Bolo Rei. Uma massa muito parecida a do panetone, com frutas cristalizadas e frutos secos, avelãs, nozes, pinhões, passas, amendoas e tb Bolo Rainha, massa é a mesma mas apenas com frutos secos,Há cerca de 20 anos usavam colocar um bonequinho e tb uma fava. Tradição dizia que quem pegasse o pedaço com a fava, tinha de pagar o Bolo Rei. Mas já não se usa mais, tb já há uma versão do Bolo Rei de chocolate. Comemos no Natal, Ano Novo e no Dia de Reis. Feliz Ano Novo para ti e toda família. Sucesso sempre.
Olá Vera, huuuum, esse bolo Rei parece delicioso! Aqui raramente vi panetone à venda nos supermercados, não conheço ninguém que consuma! Um ótimo 2019 para ti também.
Adorei o texto, minha filha, como todos os que escreves.
Obrigada, escrevo com prazer!