Amamentação na França – minha experiência parte 2
Contei para vocês no texto anterior como foi o início da amamentação da minha filha, do apoio que tive para isso na maternidade no pós-parto e do panorama geral da França no assunto. Agora, complemento com algumas outras questões que passamos durante os 19 meses de amamentação.
Até os 9 meses da minha filha, eu jamais me senti questionada quanto ao aleitamento por parte dos profissionais de saúde. Não havia nem parabenização nem pressão para dar leite artificial. Foi a partir dessa idade que a nova pediatra começou a pressionar para incluir alimentos lácteos na alimentação dela, pois “o leite materno poderia já não ser o suficiente”. Tudo porque ela parou de ganhar peso. O detalhe é que ela continuava crescendo, tinha começado a se movimentar e não era nem de longe um bebê magrinho. Me mantive firme e continuei na linha que seguíamos. Conversava com minha irmã (nutricionista) e minha prima (consultora de amamentação).
Amamentação em local público
Eu sempre tive receio de amamentar em locais públicos, ainda mais sabendo que as mulheres amamentam pouco no país. No início, calculava o tempo para fazermos compras ou passearmos nos intervalos das mamadas. Chegava no local, amamentava no carro antes de descer e tentava amamentar novamente apenas quando entrávamos no carro de novo. Ouvi muita música clássica que tocava nos estacionamentos de Nantes enquanto ela mamava.
Claro que na maioria das vezes minha filha não esperava tanto tempo. De hora em hora, praticamente, ela solicitava o “tetê”. Então, eu tinha que amamentá-la onde estivesse: restaurante, loja, trem, ônibus. Como ela se mexia muito, soltava o peito para olhar ao redor, eu não me sentia à vontade de não cobrir (resquícios da nossa educação, claro). Não posso dizer que me sentia tranquila nessas situações, mas jamais recebi qualquer crítica ou cara feia. Na verdade, as pessoas nem me olhavam enquanto amamentava.
Consultando profissionais alternativos
A parte mais complicada para mim durante todo o caminho da amamentação foi, com certeza, a questão do sono. Desde a primeira noite, minha filha nunca dormiu. Depois do primeiro mês, ela acordava com intervalos de 2h30 para mamar, mas não voltava a dormir logo em seguida. Com quatro meses ela passou a acordar de 8 a 10 vezes por noite.
Ela acordava se contorcendo e a barriguinha fazia barulhos bem altos. Às vezes, ela demora duas horas para adormecer novamente, por isso adotamos a cama compartilhada. Quanto menos eu cansasse, menos estresse e desespero eu tinha. Além disso, lendo e pesquisando, descobri que muitas mães faziam o mesmo e sentiam uma melhora na rotina.
Por conselhos de colegas de trabalho do meu marido, procuramos um osteopata, profissional muito indicado na França para bebês para aliviar tensões no corpo que possam vir da gravidez e do parto, e que eu não conhecia. Acabamos sendo direcionados para o mais conceituado da cidade, devido à dificuldade de progresso da minha filha.
Após a primeira consulta, ele nos indicou uma consultora de amamentação, pois constatou que ela tinha um freio de língua e acreditava também que ela tivesse refluxo. A consultora confirmou a informação e explicou que isso poderia fazer com ela engolisse mais ar, o que causava gases e as dores.
Leia também: A influência do bem-estar materno na vida dos filhos
Fui aconselhada a cortar o leite de vaca e derivados para excluir uma possível APLV (alergia à proteína do leite de vaca). Ela também deu dicas de posições para amamentar, reforçou a questão de amamentar deitada e deixá-la dormir na nossa cama (o que os pediatras eram totalmente contra). Ensinou uma técnica para fazê-la ter um objeto de apego/transição para que aceitasse ficar com outras pessoas e para ajudá-la a dormir sem precisar do peito.
Foi importante ter passado com ela para conversar sobre essas questões e ter mais um apoio quanto à amamentação. Nós tentamos de todas as formas ajudar minha filha e nos ajudar também. Então ter contato com profissionais especializados e que não nos diziam para dar logo o leite artificial foi fundamental. Com os pediatras, eu evitava falar muito por medo.
Apoio do marido
O apoio do meu marido nesse período foi fundamental. Após o primeiro mês, estabelecemos uma rotina que funcionou bem. Como a necessidade de trocar fralda a cada mamada acabou, eu que acordava para amamentar e ele continuava dormindo. Pela manhã, ele se levantava e ficava com ela para que eu pudesse dormir mais tempo.
Depois daquela consulta em que ele questionou o “leite fraco” (que contei na parte 1), conversei com ele. Disse que eu havia me preparado e lido muito para amamentar, e se ele tivesse alguma dúvida sobre o assunto, deveria me perguntar primeiro.
A pior parte da amamentação era justamente lidar com os palpites de que o leite era fraco, ou pouco ou que ela estava com fome sempre, ou que eu não iria dormir muito se amamentasse ou se a pediatra não havia dito para incluir uma mamadeira e por aí ia. Então o apoio do meu marido era fundamental. Ele precisa acreditar tanto quanto eu que todo aquele esforço era o melhor que podíamos fazer por nossa filha. Ele entendeu o recado e nunca mais questionou as minhas decisões quanto à amamentação.
Além disso, vivemos situações que precisamos discutir. Como passar uma boa parte do almoço em família sozinha numa salinha ao lado amamentando. As pessoas queriam me deixar à vontade, claro, mas eu acabava me sentindo isolada. A partir daí, ele passou a me levar água, petiscos ou a sobremesa quando eu estava com minha bebê. Isso muda tudo, pois sentia que estávamos no mesmo barco.
Amamentar não é algo automático. E dar suporte à mulher que amamenta, sendo homem e numa sociedade em que a maioria dos bebês são alimentados por mamadeira, é menos automático ainda. Por isso, o diálogo é essencial para alinhar esse apoio tão importante das pessoas ao redor.
Profissionais e apoio
Depois de termos percorrido todo esse trajeto, termos passado por diversos profissionais, eu considero que tivemos um relativo apoio à amamentação, mas essa não é uma regra fixa. Conheço mães que tiveram experiências bem negativas com o apoio pós-parto, pediatras e puericultrices em relação à amamentação.
Às vezes, apenas a forma de falar faz toda a diferença. Quando você chega desesperada com um bebê em pleno pico de crescimento que quer mamar o tempo todo e o profissional diz apenas “isso é normal, tem que dar o quanto ele quiser”, sem uma explicação detalhada, desencoraja. Ou quando o pediatra diz que é preciso passar o bebê para o leite artificial porque a mãe irá voltar a trabalhar, sem falar das formas de retirar e armazenar leite, desencoraja. Ou quando a enfermeira do pós-parto não sabe ver se a pega está certa, desencoraja. E todas essas situações foram vivenciadas por pessoas que conheço e tiveram bebês na França.
Por isso, ter sempre o contato de uma consultora de amamentação ou de um grupo de apoio à amamentação é importante. Deles, virá suporte, informação correta e orientação para os problemas direcionados que enfrentamos. A La Leche League é um deles.
Eu considero que a enfermeira que me visitava no primeiro mês pós-parto foi fundamental para me acalmar e me deixar segura do que estava fazendo. Mas se o profissional designado para isso não tem essa expertise, o melhor é se garantir com um particular que poderá exercer essa função.
O caminho não é fácil. A escolha é apenas da mulher, mas o apoio é essencial para que a amamentação aconteça.
2 Comentários
[…] e Parte II). Já falei também sobre amamentação e nossa procura por respostas para as cólicas (leia aqui). Hoje, quero falar sobre algo que me salvou do desespero nesses momentos: a minha rede de apoio […]
[…] Na segunda parte do texto, contarei como foi o apoio do marido e reação da família francesa, além da nossa saga por causa de tantas cólicas e noites jamais dormidas. Até lá. […]