Culinária italiana: o que aprendi com ela.
Quando começamos a anunciar que iríamos nos mudar para a Itália, a frase que eu mais ouvia era: “como você é sortuda! Aquele país tem uma culinária maravilhosa! ” Pois é, mas quem imigra sabe que nem tudo são flores. Estar fora de seu país, aprendendo outra língua, outra cultura, outro jeito de viver é uma delícia, mas não é nem nunca será fácil. Gastamos muita energia nessa adaptação. Porém, em relação à alimentação, os comentários que ouvi estavam realmente corretos. Adaptar-se à culinária italiana foi dos pontos mais fáceis de nossa jornada pelo país da bota. E acredito que não fomos somente nós que nos adaptamos bem à culinária italiana, mas o mundo!
Nos Estados Unidos há bairros italianos em Nova York, Cleveland, Providence, com muitas cantinas, ristorantes e osterias. No Canadá também existem bairros italianos em Toronto e Montreal. Uma pesquisa realizada pelo TripAdvisor evidenciou que a culinária italiana é a mais amada pela maior parte de pessoas de diferentes culturas. E o Eataly, que nasceu como um conjunto de pequenos produtores italianos, se difundiu pelo mundo todo, com lojas no Brasil, Turquia, Japão, Estados Unidos, Rússia, Dinamarca, Suécia e Mônaco. Mas entrar em contato com a culinária italiana foi mais do que entrar em contato com uma alimentação gostosa pelo seu sabor. Foi entrar em contato com um “jeito de viver” a comida.
A relação que os italianos têm com os alimentos é fantástica. E o objetivo deste texto é desvendar um pouco dessa relação, como já fizeram a Vilma Sales, que escreveu sobre Crianças e uma alimentação saudável na Dinamarca, a Helena Silva que falou sobre Hábitos alimentares na França e a Juliana Oliveira sobre A batalha por opções saudáveis na lancheira da escola.
Sobre a saúde dos italianos
Óbvio que a saúde de toda uma população não pode ser inferida somente pela sua alimentação e culinária. Mas também é sabido que alimentação e culinária influenciam em muito as condições de saúde. Olhando as tábuas de estatísticas da Organização Mundial de Saúde (health statistics and health information systems), com dados de 2015, percebe-se que a Itália apresenta ótimos indicadores de saúde.
Por exemplo, a expectativa de vida dos italianos é de 80,5 anos para homens e 84,8 anos para as mulheres (enquanto que as do Brasil são de 71,4 e 78,7, respectivamente). A probabilidade de morrer por doenças cardiovasculares, câncer e diabetes entre 30 e 70 anos é de 9,4% na Itália versus 16,9% no Brasil. E a expectativa de anos saudáveis ao nascer é de 72,8 anos da Itália contra 65,5 anos no Brasil. Isso faz com que a Itália esteja em sétimo lugar no ranking mundial de expectativa de vida, enquanto que o Brasil está em quinquagésimo oitavo. Por fim, a prevalência de sobrepeso em crianças com menos de 5 anos é de 0% na Itália e de 7,3% no Brasil.
Saiba aqui como é dirigir na Itália
Se eu ainda não consegui te convencer que a relação dos italianos com a alimentação pode gerar saldos muito positivos na saúde, protegendo-os de doenças crônicas e degenerativas, deixo dois estudos muito robustos e bem realizados, publicados em revistas científicas de grande importância e impacto sobre os benefícios da dieta mediterrânea. Um foi publicado no “The american jornal of clinical nutrition” e outro no JAMA (“Journal of American Medical Association”).
Como são as refeições dos italianos?
Em geral os italianos tomam um café da manhã (colazione) mais frugal, com brioche (versão italiana do croissant), sem recheio ou com recheio de chocolate ou geléia (marmelada, em italiano), acompanhado por um café, cappuccino, café latte ou ciocolata calda, etc. Os adultos têm o hábito de comer na rua, no bar de preferência, onde leem o jornal e batem papo com o barmen. As crianças em geral tomam o café da manhã em casa, mas em uma refeição bem ligeira.
Os adultos não costumam comer nada entre o café da manhã e o almoço (pranzo). Já as crianças tomam um lanche na escola, com alimentos feitos em casa, pelas mães ou avós (pizza sem recheio, pão integral com queijo, frutas).
O almoço e jantar dos italianos mais tradicionais é constituído por um primo piatto (macarrão ou risoto), secondo piatto (prato a base de carne) e contorno (salada ou vegetais cozidos). Como na França, as saladas e os vegetais são servidos ao final da refeição. Mas já não é tão comum que os italianos comam todos estes pratos, em geral eles só comem um primo ou um secondo, seguidos pelo contorno. E o café expresso é sagrado ao final da refeição. Doces de sobremesa existem, mas raramente os vejo comendo.
Refrigerantes nunca, é um crime. As crianças tomam água e os adultos vinho ou água com gás.
Quanto aos doces, existem (quem nunca pensa em tiramisu e panna cotta ao lembrar de doce italiano?), mas percebemos que eles não são tão doces quanto os nossos brasileiros ou derivados da culinária portuguesa e as porções são bem pequenas.
Mas, é só isso?
Não! Muito mais do “o que eles comem”, o que me encanta na Itália é o “como eles comem”! A relação cultural dos italianos com a alimentação é fabulosa. A começar pelos ingredientes, que são sempre frescos, sem agrotóxicos, comprados em poucas quantidades (para não ter que armazenar e perder a frescura do alimento), do pequeno comerciante que ele conhece a vida toda (e de quem provavelmente sua mãe já comprava). As frutas e verduras das estações são respeitadas. Não se consegue comprar, por exemplo, morango quando não é época de morango. Além das especialidades regionais, existem as especialidades temporais: comidas de Carnaval, de Páscoa, de Natal, pratos de inverno, de outono, de verão e de primavera. Os ingredientes das receitas são sempre poucos e simples, de preparo fácil para simples mortais não italianos que mal cozinham como eu.
Leia também: O desafio de ser mãe na Itália
E o preparo, então! Nada é feito com pressa, como tudo na Itália. Cozinhar é um processo que deve ser curtido, com uma boa música de fundo, com as janelas abertas, com o fogo bem baixo (fogo alto para raros pratos). Panela de pressão nem pensar (coisa de preguiçoso). O preparo da refeição é um ritual que deve ser degustado, vivido, amado. E como tem amor nessa comida! Tenho certeza que essa é a maior diferença. As nonnas cozinham com tanto carinho a comida dos seus nipotes (netos), não se importam de passar horas na cozinha se veem a criança devorar um bom prato de pasta al pomodoro (macarrão com molho de tomate), simples, mas feito com muito coração por elas.
Aliás, acho mesmo que o segredo dos italianos serem tão saudáveis é o tanto de amor que suas mammas e nonnas, papás e nonnos colocaram em suas comidas quando eram pequenos. Não há doença que resista a tanto amor!
6 Comentários
Que maravilha esse texto !!!
Sou apaixonada pela Itália 🇮🇹
Obrigada Ruth!
Olá Luciana! Ótimo texto!
Estamos nos mudando para a Itália em novembro e é muito bom ouvir estes relatos! Obrigada!
Oi Luciana, desejo a vocês um ótimo processo de imigração!
[…] mais sobre Culinária italiana: o que aprendi com ela? e Alimentação infantil em Israel: o que tem de bom e o que tem de […]
[…] Leia também: Culinária italiana: o que aprendi com ela […]