No meu primeiro texto, que escrevi mês passado, trouxe um pouco sobre o assunto da adaptação do expatriado, comparando com a adaptação que passamos ao entrar na adolescência. Desta vez vou falar um pouco sobre o próprio adolescente expatriado e o risco de depressão.
A expatriação pode ser muito glamourosa aos olhos de quem ficou no Brasil, mas o glamour não dura muito depois que descemos do avião. Para o adolescente pode ser ainda mais confuso e difícil, pois ele já está vivenciando uma fase complicada na sua vida. A expatriação exige persistência, paciência e uma boa dose de ”sangue frio” em alguns momentos. Tudo que não combina com o adolescente.
A adolescência é uma fase onde o indivíduo questiona todos os seus valores, sente-se à margem da sociedade. Em um momento quer desbravar o mundo e em seguida se esconder embaixo da cama. Paciência não é o forte do adolescente, pois tudo é urgente quando se trata de “ter” coisas. Entretanto, “fazer” já são outros quinhentos. Muitos deles são persistentes, mas nem sempre a organização e elaboração são pontos que o ajudam.
Algumas características da adolescência são sabidas e conhecidas por nós, pais. Mas o que tem nos chamado a atenção nessa nova geração é que a tecnologia, as relações superficiais, a ansiedade e a falta de perspectiva de futuro desses jovens têm provocado mudanças no comportamento. Isso exige formas diferentes de lidar com nossos adolescentes.
Neste período de transição o adolescente tem necessidade de integração social, busca autoafirmação e independência, além de ser o momento de consolidação da identidade sexual e de emoções conflitantes.
Os adolescentes e os transtornos mentais
A nossa sociedade vem mudando. A internet, os avanços em todas as áreas, a tecnologia têm trazido um grande aumento de alguns problemas na adolescência, que anteriormente não faziam parte desta faixa. Entre eles: automutilação, ansiedade, autismos, transtorno de déficit de atenção, transtorno de borderline, depressão/suicídio e síndrome do pânico.
Em meus atendimentos tenho visto muitos casos de adolescentes expatriados apresentando depressão e comportamentos suicidas. Por isso hoje quero chamar atenção da nossa população brasileira espalhada pelo mundo para conversarmos um pouquinho sobre os sintomas e o que fazer em caso de depressão na adolescência.
Depressão na adolescência
A Organização Mundial de Saúde estima que já somos mais de 300 milhões de pessoas sofrendo de ansiedade e depressão pelo mundo. Espera-se que em 2020 a depressão atinja a segunda colocação no ranking das principais doenças, afetando cerca de 121 milhões de pessoas no mundo, sem distinção de raça ou sexo. Na pior das hipóteses, a depressão pode levar ao suicídio. O fenômeno em questão pode acometer pessoas em qualquer fase da vida, no entanto, há indicativos de aumento significativo desse transtorno durante a adolescência e no início da vida adulta, sendo mais comum no sexo feminino.
A depressão em adolescentes tem um significativo impacto no desempenho escolar, podendo prejudicar a concentração e o desempenho cognitivo. Está associada a tentativas de suicídio e ao uso de álcool e outras drogas. A doença pode ser desencadeada por diversas situações, como por exemplo, uso de substâncias psicoativas, histórico familiar, necessidade de sucesso e perfeição, distúrbios hormonais e alterações no corpo, como crescimento de pelos ou seios.
Leia também: Vamos falar sobre o suicídio na adolescência
Instabilidade emocional, irritabilidade, crises de raiva, explosões e outras alterações comportamentais são as principais características da depressão em adolescentes. Nos últimos anos, pesquisas assinalaram a presença cada vez mais significativa de jovens com idade média de 16 anos com sintomatologia depressiva, considerada atualmente a doença mais frequente na adolescência.
Entre os principais sintomas estão:
- Tristeza;
- Cansaço constante;
- Problemas de memória e concentração;
- Alterações de humor;
- Choro frequente;
- Falta de interesse ou prazer nas atividades diárias;
- Diminuição do apetite;
- Perda ou ganho de peso;
- Insônia.
Como vocês podem ver o assunto é sério e merece toda a nossa atenção. Hoje o foco do texto são os adolescentes, mas grande parte da nossa população adulta brasileira sofre desse mal. A depressão não é uma doença somente emocional, ela é física, pois causa reações fisiológicas e mexe com os hormônios.
Aquela história de que depressão se cura com boa vontade é mentira. Na maioria das vezes há necessidade de se tomar medicação e fazer o tratamento adequado, com acompanhamentos psicológico e psiquiátrico.
O adolescente expatriado
O adolescente necessita de uma tribo, de se sentir pertencente, de ser amado e das relações sociais. E com a expatriação ele perde todos os seus vínculos e a sua rede de apoio, que muitas vezes é o seu ponto de equilíbrio.
Se pensarmos que já é difícil a adaptação para um adulto que escolheu a expatriação, imagine para um adolescente que está sofrendo um verdadeiro terremoto das suas emoções internas e ainda tem que lidar com as exigências do mundo externo com um novo local, novas regras, nova cultura, nova língua, tudo novo.
Quando tiramos um adolescente da sua tribo, das suas amizades, das regras e cultura que já lhe são conhecidas, o caos se instaura. Ele fica perdido, sem referências, e leva um grande tempo para fazer amizades e se sentir pertencente a outro grupo. Para alguns adolescentes que são mais fechados ou tímidos, isso pode ser uma tarefa árdua e longa.
Não posso falar de outras nacionalidades, mas na minha experiência com os adolescentes hispanos e americanos, a amizade não é algo muito fácil de se conquistar. Eles se fecham em copas, são desconfiados, não se abrem para novas amizades e não são tão abertos a outras culturas.
Além disso, enfrentamos um choque cultural, haja visto que a nossa é toda aberta, solícita, gosta de demonstrações de carinho e se une às pessoas com muita facilidade. O adolescente já tem uma dificuldade enorme de se inserir numa nova tribo e se sentir parte dela, e ainda precisa ter uma dose sobrenatural (para ele) de insistência, persistência e resiliência.
Espero que você possa ter se colocado um pouco no lugar do seu filho adolescente nesse momento. Escutar suas dores é fundamental para saber diferenciar as que fazem parte da idade de algo que vai além. Entenda que muito do que ele te relata já faz parte da fase, mas se você começar a ver mudanças de comportamento com muitos dos sintomas que descrevi acima, é sinal de alerta.
Procure ajuda quando necessário
O médico mais indicado para fazer o diagnóstico em qualquer país que você esteja é o psiquiatra. Lembre-se que a depressão é uma doença orgânica também. Sei que tem muito preconceito e ninguém quer um filho tomando antidepressivos, mas em alguns casos é necessário.
A medicação tem que ser adequada e por um tempo determinado. Ela é quem vai regular o organismo para que se possa descobrir as causas e serem trabalhadas.
Fazer terapia e procurar um psicólogo é outra medida que deve ser tomada. A terapia ajudará o adolescente a desabafar e entender os seus sentimentos, organizar as ideias, bem como buscar soluções que o façam encarar o seu novo desafio.
O ideal é observar o seu filho para que se possa prevenir o aparecimento da depressão. A psicoterapia pode te ajudar nesse sentido. Se precisar de ajuda ou tiver alguma dúvida sobre esse assunto, estou à disposição para esclarecimentos.
Abraços e até a próxima!
4 Comentários
Adorei texto! E é isso mesmo, quando mudamos para o México, não imaginei que minha filha mais velha sentiria tanto, por que até então estava super animada com a mudança. Mas quando chegamos a euforia caiu por terra e foi várias crises de ansiedade e gastrite. Só melhorou quando depois de 6 meses foi pra escola e começou com novas amizades. É duro, pq quando mudamos ela continuou com a cabeça no Brasil, nas amigas e foi bem época de carnaval. Precisa de muita conversa e paciencia. Fase de adaptação não é fácil.
Que bom que gostou!! Não é fácil mesmo. Como você disse é muita paciência a e conversa.As mudanças e a falta dos amigos mexem muito com eles. Que bom que hoje podem comemorar a mudança.
[…] meu texto de fevereiro trouxe mais um pouquinho do assunto sobre medos e dificuldades na adaptação de um adolescente […]
[…] também O adolescente expatriado e o risco de depressão e Depressão, imigração e […]